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Em seu regresso à Casa Branca, Donald Trump poderá ter mais poder do que quando chegou à presidência dos Estados Unidos pela primeira vez, em 2016.
Além da expressiva vitória nas urnas (pela primeira vez em 20 anos, os republicanos superaram os democratas no voto popular), Trump já garantiu a maioria do Senado, enquanto na Câmara dos Representantes o quadro segue indefinido, mas com boas perspectivas para ele. Na Suprema Corte, há também maioria conservadora.
O presidente eleito para seu segundo mandato conta hoje, ainda, com um maior controle sobre o Partido Republicano do que tinha quando saiu da posição de outsider para ser o 45º a comandar a maior economia do mundo.
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Com mais apoio e menos “freios institucionais”, Trump terá mais condições de entregar compromissos assumidos com os eleitores.
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Para Christopher Garman, Diretor Executivo para as Américas na consultoria de risco político global Eurasia Group, é preciso “levar a sério” as promessas feitas pelo republicano durante a campanha eleitoral, sobretudo nas searas econômica e migratória. O especialista conversou com a reportagem do InfoMoney na noite de quarta-feira (6), quando o mundo ainda avaliava o saldo das eleições americanas.
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“No nível doméstico, podemos olhar para as repercussões da política econômica do governo Trump. Na nossa visão, precisamos levar a sério as promessas de campanha em medidas de protecionismo comercial, restrições imigratórias e cortes de impostos. Com a maioria no Congresso, ele tem potencial de entregar o terceiro, e os primeiros dois nem precisam do Legislativo”, disse.
Para Garman, há uma clara tendência ao protecionismo nos Estados Unidos sob a nova gestão republicana, que deverá afetar a inflação no país e a política monetária do Federal Reserve, com efeitos sobre câmbio, juros e atividade econômica mundo afora.
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No caso brasileiro, mais do que diferenças ideológicas e constrangimentos diplomáticos, ele também acredita que o principal efeito da vitória de Trump seja econômico. “Se estamos num mundo de dólar mais forte, isso dificulta a capacidade do Banco Central reduzir juros. Um real mais fraco pode trazer mais inflação para a economia brasileira. E também pode impactar o PIB de uma forma mais relevante, olhando para o fim do ano que vem e o início de 2026”, observou.
“Portanto, o timing de tudo isso é muito ruim para a disputa presidencial. Eu diria que a maior repercussão para o governo Lula está nos efeitos secundários da política econômica de Trump do que uma mobilização da direita e da base bolsonarista que sai dessa eleição empolgada com as chances de 2026”, avaliou o especialista.
Veja a seguir os destaques da entrevista:
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InfoMoney: Como o senhor interpreta a vitória de Donald Trump nas eleições americanas? Quais fatores teriam sido decisivos para o resultado observado?
Christopher Garman: Eu acredito que foram fatores muito mais econômicos do que sociológicos que levaram a esse resultado. Na Eurasia, olhando as pesquisas, nós reconhecemos que esta podia ser uma eleição apertada, mas mantivemos uma aposta em Trump por duas razões, que acho que foram decisivas.
A primeira é que geralmente o candidato mais forte na principal preocupação leva a eleição. E quando olhamos as preocupações dos eleitores, o tema do custo de vida era o mais relevante ─ particularmente nos estados pêndulo, que são tão importantes para a eleição nacional. E neste quesito, Trump leva vantagem.
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Estamos vendo não só nos Estados Unidos, mas em vários países da Europa, Índia, África do Sul, que governantes estão sofrendo com o surto inflacionário pós-Covid-19. Nos EUA, a inflação estava em 8%, e o consumidor sofre com o aumento de preços nos restaurantes, seguro de carro, aluguel, e quem está governando é que paga o preço.
A principal preocupação com o custo de vida foi o calcanhar de Aquiles do governo e explica por que a aprovação de [Joe] Biden nunca esteve tão alta, ficava abaixo de 40%, e houve um sentimento de que o país estava no caminho errado. E quando olhamos modelos de previsão eleitoral, considerando taxa de aprovação, índice de rejeição e a principal preocupação, era uma eleição de mudança.
No fundo, esses fatores foram mais explicativos e preditivos do que as intenções de voto, que acabaram errando um pouco o tamanho da vitória de Trump.
IM: Levando em conta o poder que foi concedido pelos eleitores a Donald Trump pelo tamanho da vitória nas urnas, a maioria construída no Senado e o maior controle sobre o Partido Republicano do que em 2016, o que esperar para seu governo a partir de 2025?
CG: Há duas arenas de repercussão. No nível doméstico, podemos olhar para as repercussões da política econômica do governo Trump. Na nossa visão, precisamos levar a sério as promessas de campanha em medidas de protecionismo comercial, restrições imigratórias e cortes de impostos. Com a maioria no Congresso, ele tem potencial de entregar o terceiro, e os primeiros dois nem precisam do Legislativo.
Acreditamos que haverá um grau de protecionismo maior. Talvez ele não vá implementar tarifas de importação sobre todos os produtos chineses em até 60%, mas ele deve dar um passo importante. Não vai deportar 11 milhões de imigrantes, é impossível, nem tem pessoal e capacidade para fazer isso, mas uma deportação que possa chegar a mais de 1 milhão [de pessoas] em 3 anos é factível.
A repercussão dessas políticas tende a gerar mais inflação na economia americana, com risco de reduzir o crescimento da China, em particular, que vai ser um alvo das medidas protecionistas, e também dos Estados Unidos. É um mundo em que o dólar fortalece, moedas de países emergentes, como o Brasil, enfraquecem. Isso deve reduzir a capacidade do Federal Reserve de cortar juros ao longo do ano que vem.
Do lado macroeconômico, existe muita preocupação entre economistas sobre a combinação dessas promessas e planos de governo.
Do lado doméstico, também haverá uma agenda de controle maior sobre as burocracias, uma possível “caça às bruxas” em algumas indicações. O governo Trump acreditaque está sendo restrito por um Estado que não representa o voto popular. Haverá um debate sobre ingerência possível em burocracias federais.
IM: E do ponto de vista geopolítico?
CG: No campo geopolítico, pode haver mudanças na postura em relação à guerra na Ucrânia. Trump está querendo uma negociação entre [Vladimir] Putin e a Ucrânia, e com menos financiamento para a guerra. Parceiros na Europa estão muito preocupados, mas a guerra não deve mudar tanto. Idem no Oriente Médio, mesmo que Bibi Netanyahu esteja contente com a vitória de Trump.
O que realmente pode impactar é um relacionamento mais tenso entre Estados Unidos e China dos lados comercial e geopolítico. Eu diria que o risco não está em guerra com Trump, mas mais com uma relação mais belicosa entre EUA e China.
IM: Como fica o Brasil neste contexto?
CG: Eu ouço muito debate se isso pode dificultar as relações bilaterais, diplomáticas, dados os posicionamentos ideológicos distintos de Lula e Trump. É claro que os Estados Unidos saírem do Acordo de Paris seria má notícia para o Brasil, que sediará a COP no ano que vem.
Mas acredito que a repercussão maior seja econômica, não diplomática. Se estamos num mundo de dólar mais forte, isso dificulta a capacidade do Banco Central reduzir juros. Um real mais fraco pode trazer mais inflação para a economia brasileira. E também pode impactar o PIB de uma forma mais relevante, olhando para o fim do ano que vem e o início de 2026.
Portanto, o timing de tudo isso é muito ruim para a disputa presidencial [brasileira]. Eu diria que a maior repercussão para o governo Lula está nos efeitos secundários da política econômica de Trump do que uma mobilização da direita e da base bolsonarista que sai dessa eleição empolgada com as chances de 2026.
IM: E qual deve ser a resposta do governo brasileiro diante disso? Há quem diga que Lula pode deixar de lado a agenda fiscal diante da preocupação com o avanço da direita pelo mundo e aqui, após as eleições municipais. Outros enxergam que o novo cenário pode trazer estímulos para a agenda fiscal, já que o dólar cobraria um preço mais alto pelo desequilíbrio das contas públicas. De que lado está a Eurasia?
CG: No curto prazo, pode ajudar a agenda fiscal defendida pelo ministro [Fernando] Haddad, porque reforça o argumento de que algo precisa ser feito para poder ancorar expectativas e criar condições para reduzir juros. O externo ficou pior, então é preciso fazer a lição de casa doméstica. Esse efeito é o maior.
Agora, se, ao longo de 2025, tudo isso se traduzir em crescimento menor e uma aprovação presidencial caindo, os riscos para a condução da política econômica podem aumentar se Lula começa a ficar preocupado com 2026. Hoje, acho que ele não está. Ele está com a aprovação de 50%, bem nas pesquisas a dois anos da eleição presidencial. Então, o perigo está mais para o final do ano que vem do que nos próximos meses.
IM: Os democratas sofreram sua primeira derrota no voto popular das eleições presidenciais em 20 anos. Como o senhor enxerga o futuro do partido? Há discussões se ele teria deixado de ser uma legenda de massas. Você concorda?
CG: Podemos debater se de fato o partido migrou um pouco para um campo progressista que não estava alinhado com o eleitor mediano, se em temas sociais o perfil do voto estava mais inclinado para o lado de um eleitorado de mais alta renda. Mas acho que não podemos perder de vista do fato que o eleitorado de menor renda é que sofreu mais com a inflação.
Eu ainda acredito que essa perda do voto popular tem mais a ver com fatores econômicos do que a estratégia do Partido Democrata em posição ideológica. Se o governo de Donald Trump errar a mão em fatores econômicos, os democratas vão voltar ao poder daqui a 4 anos.