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Desde que foi tornada pública, a Medida Provisória 1.171 não para de gerar dúvida. O texto da norma, que ainda precisa passar pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal, corrigiu parcialmente a tabela progressiva do Imposto de Renda e estabeleceu uma tributação às aplicações financeiras das pessoas físicas no exterior — de 0% a 22,5% para valores entre R$ 6 mil e mais de R$ 50 mil.
Quem tem buscado uma resposta sobre os efeitos da MP são os profissionais assalariados ou prestadores de serviços que trabalham para empresas com sede no exterior e recebem salários em dólar ou outra moeda. Os ganhos dessa parcela de trabalhadores sofrerão as taxações estipuladas pela MP 1.171?
Não custa salientar que o número de profissionais que vivem no Brasil, mas trabalham para companhias do exterior não para de crescer. A Husky, plataforma que facilita o recebimento de transferências internacionais, diz que esse perfil cresceu 491% entre 2020 e 2022.
Brasileiros da área de TI têm sido os mais requisitados por grandes coglomerados estrangeiros, mas profissionais de outras áreas, como designers e streamers, têm surfado nessa onda.
As principais dúvidas são:
- quais rendimentos serão impactados?
- salários entram nessa conta?
- Se o profissional trabalha de home office para uma empresa no exterior pode ser tributado por essa nova regra?
O InfoMoney consultou advogados trubutaristas e trabalhistas para entender como a MP vai afetar a vida financeira desses profissionais. Confira abaixo:
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O que diz a MP?
O texto propõe que pessoas fisicas computem de forma separada os rendimentos do capital aplicado fora do país, a partir de 1º de janeiro de 2023. A taxação será progressiva e vai variar de 0% a 22,5%. Veja:
- 0%, sobre a parcela anual dos rendimentos que não ultrapassar R$ 6 mil;
- 15%, para rendimentos anuais entre R$ 6 mil e 50 mil;
- e de 22,5% para parcela acima de R$ 50 mil.
Quais rendimentos serão tributados?
Segundo a MP, a tributação será aplicada sobre a “remuneração produzida pelas aplicações financeiras”. O texto traz alguns exemplos em que o imposto incidirá:
- variação cambial da moeda estrangeira frente à moeda nacional;
- juros;
- prêmios;
- comissões;
- ágio e deságio;
- participações nos lucros;
- dividendos; e
- ganhos em negociações no mercado secundário, incluindo ganhos na venda de ações das entidades não controladas em bolsa de valores no exterior.
Salários entram nessa regra?
Considerando profissionais que trabalham no Brasil para empresas do exterior, o salário em dólar ou outra moeda que cai na conta não será tributado pela MP.
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Apesar disso, vale lembrar que esse profissional já deve recolher imposto mensalmente sobre o salário por meio do carnê-leão pela regra tributária atual, conforme explica Luciana Souza, advogada tributária e head da área no escritório Andrade Foz.
“Como a fonte pagadora do salário está no exterior, não é possível fazer a retenção do imposto na fonte. Por isso, o profissional que é residente fiscal no Brasil precisa usar o carnê-leão para recolher mensalmente o Imposto de Renda devido sobre o salário recebido no exterior”, diz Danielle Bibbo, sócia-diretora de Impostos da KPMG.
“O processo é obrigatório, mas o pagamento mensal feito durante o ano funciona como uma antecipação do recolhimento do imposto que será compensado na declaração de IR anual“, complementa a especialista da KPMG.
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A tributação ocorre somente se o empregado auferir rendimento decorrente de investimentos no exterior, incluindo aplicações financeiras, lucros e dividendos de entidades controladas e bens e direitos objeto de trust.
Vale lembrar que se o empregado não for residente fiscal no Brasil, os efeitos da MP também não serão aplicados sobre o seu salário. “Como regra geral, a pessoa física que permanecer no Brasil por mais de 183 dias no período de 12 meses será considerada residente para fins fiscais”, diz Souza.
O modelo de contrato de trabalho interfere?
Flavia Oliveira, advogada trabalhista do Andrade Foz, explica que em nenhum caso a tributação incide sobre o salário por causa das novas regras da MP.
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“A MP não tributa o salário. Não faz diferença se o contrato é de home office ou se ele for prestador de serviço, com contrato PJ, ou se ele for um nômade digital, que juridicamente é aquele contrato que permite que o funcionário trabalhe de qualquer lugar do mundo. Nesse segundo caso, modelo mais recente, ele pode, inclusive, ter vínculo de trabalho com controle de jornada por meio dos sistemas da empresa”, diz.
Mesmo se o profissional passar uma temporada em outro país, sem deixar de ser residente fiscal por aqui, por exemplo, e continuar recebendo em dólar, ele não passa a ser tributado pelas novas regras da MP.
A conversão do salário recebido em dólar para real pode sofrer os efeitos da nova MP?
O profissional que recebe em dólar e é residente fiscal no Brasil lida com a conversão de moedas o tempo todo para pagar contas e fazer compras.
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A MP menciona, entre os rendimentos que serão tributados, “a variação cambial da moeda estrangeira frente à moeda nacional”. Essa conversão pode ser tributada pela MP? Segundo Bibbo, não.
“Essa conversão deve seguir as regras tributárias atuais, com recolhimento do carnê-leão, já que essa regra não mudou”, afirma.
A conversão dos valores recebidos em dólares para reais se dará com base na cotação do dólar de compra estabelecida pelo Banco Central do Brasil do último dia útil da primeira quinzena do mês anterior ao do recebimento, acrescenta Rubens Boicenco, advogado tributário do CSA Advogados.
Um exemplo: considere que o trabalhador recebeu no dia 5 de maio o valor de US$ 1.000 de uma empresa no exterior. Para a apuração do IR, ele deverá, primeiramente, calcular o valor em reais desse rendimento com base na cotação do dólar para compra do dia 14/04/2023 que, segundo o site do BC, é de R$ 4,9449 por dólar, resultando em um valor de R$ 4.944,90.
Em seguida, esse valor deverá ser lançado no programa do carnê-leão da Receita Federal, que poderá ser feito via Portal do e-Cac ou pelo aplicativo Meu Imposto de Renda. O programa irá, então, calcular o valor devido do IR para esse rendimento com base na tabela progressiva do IR em vigor e gerar o respectivo Darf para pagamento.
E se eu investir o dinheiro do meu salário no exterior?
Nesse caso, o cenário muda. Mesmo o salário não sofrendo tributação extra, se o empregado usar o dinheiro para investir em produtos financeiros via conta de corretora e auferir rendimentos de aplicações financeiras no exterior pode ser tributado.
“Caso o profissional tenha uma conta bancária com investimentos, os rendimentos decorrentes dessas aplicações financeiras nesta conta serão tributados, nos termos da MP nº. 1.171/2023”, explica Souza.
Nesse caso, complementa Bibbo, além do recolhimento do IR via carnê-leão, o dinheiro investido passa a ter os impactos fiscais previstos pela MP.
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