Representante dos servidores do BC espera 60% de adesão no 1º dia da greve: ‘Setor do Pix é o mais radical’

Categoria é uma das mais mobilizadas de Brasília e, antes mesmo do início da paralisação, já afetava diversos serviços e divulgações

Lucas Sampaio

Fachada do Banco Central do Brasil (divulgação)
Fachada do Banco Central do Brasil (divulgação)

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Os servidores do Banco Central começaram, nesta sexta-feira (1º), uma greve por reajuste salarial como uma das categorias mais mobilizadas de Brasília. Antes mesmo do início da paralisação, os funcionários da autoridade monetária brasileira já têm afetado diversos serviços, como a remuneração a bancos em operações do Pix, e atrasado importantes divulgações, como o Relatório Focus e do fluxo cambial.

O presidente do Sinal (sindicato dos servidores do BC), Fábio Faiad, estima uma adesão entre 60% e 70% da categoria já neste primeiro dia, credita a forte mobilização à decisão do governo Jair Bolsonaro (PL) de prometer reajuste apenas às forças de segurança (mesmo que não tenha cumprido a palavra) e diz que os funcionários que cuidam do Pix estão entre os mais radicalizados a favor da greve.

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A paralisação por tempo indeterminado foi aprovada na segunda-feira (28), com o apoio de 90% dos 1,3 mil funcionários que participaram da assembleia, e Faiad acredita que mais de 2,2 mil dos 3,4 mil servidores do BC vão aderir ao movimento grevista desde o início.

Na última paralisação, em 2015 (ainda no governo Dilma Rousseff), a categoria conseguiu um reajuste de mais de 26% escalonado entre 2016 e 2019. Agora, querem um reajuste do mesmo patamar para repor a inflação desde 2019 e a reestruturação de carreiras.

Diante da mobilização dos servidores do BC, outras categorias do funcionalismo público federal estão aumentando as suas mobilizações, como servidores da Receita Federal, do Tesouro Nacional, da CGU (Controladoria-Geral da União) e do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social).

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Veja os principais trechos da entrevista com o presidente do sindicato:

Por que a greve agora?
Nós estamos tentando negociar com o governo desde novembro. Cinco meses depois, não conseguimos nenhuma proposta, então a categoria perdeu a paciência.

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A promessa do presidente Jair Bolsonaro (PL) de conceder reajuste apenas para profissionais da segurança pública foi o estopim para o movimento?
O movimento foi um pouco sufocado pela pandemia e outros fatores nos últimos anos, mas a atitude do presidente sem dúvida colocou gasolina na fogueira.

O diálogo com o governo não foi suficiente para impedir o movimento?
Não foi porque até agora não tem uma proposta nem uma mesa de negociações. Não queríamos entrar em greve, mas o governo tem sido intransigente.

O governo tem falado nos bastidores que desistiu de dar um reajuste apenas para os servidores da segurança pública – e um dos motivos seria a greve do BC. Esse gesto seria suficiente para encerrar o movimento grevista? Ou chegou em um ponto de não retorno?
Essa sua colocação é perfeita. Chegou em um ponto de não retorno. Não tem mais como voltar atrás. Em vez de a gente parar o nosso movimento é capaz de ele [Bolsonaro] ter mais uma greve, da policia, caso ele realmente volte atrás [e não conceda o reajuste prometido].

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E um reajuste de 5% para todo o funcionalismo público federal, como o governo também aventou nos últimos dias? Seria suficiente, apesar de os servidores do BC reivindicarem 26%?
Não é – e vou explicar o porquê. Porque não cobre nem a inflação deste ano. Tem de tomar cuidado com essas declarações, que saem em vários jornais, porque tem muita cortina de fumaça – e muitas vezes elas são contraditórias. É sempre essa bagunça de contrainformação. Então preferimos ficar com a versão oficial.

Os servidores do BC parecem ser os mais engajados e os que mais estão conseguindo se mobilizar. A que o senhor atribui isso?
Várias razões. Uma é a indignação com a inflação passada e saber que só os policiais vão receber aumento [apesar da promessa de Bolsonaro, o reajuste ainda não foi concedido]. Imagina o que vai acontecer com o pessoal do departamento de informática do BC, que não vai ter reajuste, mas os da Polícia Federal, que exercem a mesma função, vão. O pessoal fica chateado de saber que uma pessoa com a mesma qualificação tem salários diferentes.

Outra é que o Bolsonaro fala sempre bem do PIX e do Banco Central, que aqui não tem aparelhamento nem ideologia, mas o reajuste vai só para a polícia. O presidente reconhece a qualidade dos servidores do BC, mas o reajuste só vai para a polícia. Esse discurso caiu como uma bomba para os servidores daqui.

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Um reajuste de 26% não seria muito acima dos reajustes que estão sendo concedidos na iniciativa privada?
Queremos 26% para repor a inflação de 2019, de 2020, de 2021 e da previsão do Focus para 2022. Estamos pedindo apenas a reposição da inflação. A iniciativa privada conseguiu reposição dos salários, ainda que parcial, nos últimos anos. Nós estamos há vários sem qualquer reajuste. Além disso, o Banco Central é o guardião da economia brasileira. O melhor investimento é valorizar quem cuida da economia brasileira.

Qual é a posição do sindicato sobre eventuais críticas aos salários dos servidores do BC, que seriam elevados? [A remuneração de um analista do BC é de R$ 26,2 mil por mês, ou R$ 341 mil por ano].

O servidor do Banco Central tem de ser bem remunerado. Queremos que sejam qualificados e bem remunerados. O nível de qualificação é muito alto também, se não pagar um bom salário eles vão embora para outros lugares.

No nosso departamento, de informática, tem muitas empresas internacionais assediando nosso servidores, por exemplo. Qual é o interesse do governo brasileiro de ver esse setor sucateado? Temos funcionários com mestrado e doutorado que assessoram o Copom [Comitê de Política Monetária, que decide a taxa básica de juros da economia brasileira].

Não dá para comparar esse profissional com alguém que exerce uma função mais simples. No mercado de trabalho você compara no mesmo eixo. Se sucatear o trabalho, não fica ninguém. Aí o Banco Central corre o risco de virar fornecedor de mão de obra para a iniciativa privada.

Mesmo na pandemia a gente criou o Pix. E hoje esses funcionários são os mais revoltados, porque foram muitas horas extras, muitas madrugadas, muito trabalho. É justo ficar sem os funcionários que criaram o Pix por defasagem nos salários?

Quais são as implicações da greve para a sociedade?

Atraso e interrupção parcial de atendimentos ao público, da distribuição de moedas e cédulas, da divulgação de indicadores com precariedade (ou não divulgados), a suspensão de autorias em instituições financeiras, a manutenção e monitoramento do Pix e do SPB (Sistema de Pagamentos Brasileiro) precarizados… São muitas.

O PIX corre mesmo o risco de ser totalmente paralisado devido à greve? Quais outros serviços importantes podem ser afetados?
Os servidores do BC tem responsabilidade e não vão interromper o serviço. Mas o monitoramento não vai ser feito da mesma forma. Então os funcionários ficarão, como o próprio Campos Neto falou, em sistema de contingência. E podem ocorrer problemas e que isso gere interrupções. Sabotar e paralisar o Pix nunca será feito. A responsabilidade vem em primeiro lugar.

Há problemas com a atual gestão, do presidente Roberto Campos Neto?
O grande problema é com o governo. O presidente Roberto pode ter nos atendido só agora, que o movimento cresceu, mas o grande vilão não é a diretoria do Banco Central. Muitos inclusive concordam com a reivindicação da categoria.

Os grandes gargalos se chamam Paulo Guedes e Jair Bolsonaro. Eles poderiam resolver a situação e há espaço orçamentário. País que tem mais de R$ 20 bilhões de orçamento secreto e R$ 5 bilhões de fundo partidário tem dinheiro para conceder reajuste aos servidores.

O sindicato criticou o fato de o presidente do BC, Roberto Campos Neto, ter tirado uma ‘miniférias’ e viajado a Miami na véspera do início da greve. Esta atitude pode inflamar o movimento grevista?

Um fato fala mais do que qualquer palavra. E esse fato fala mais do que tudo. Imagina eu tirar férias agora? Não tem chance nenhuma. Realmente pegou mal e a categoria ficou chateada.

Como vai ser o esquema no dia 1º de greve e nos seguintes? Quantos servidores vão trabalhar? Quantos ficarão de braços cruzados? Haverá manifestações no BC?
Isso está em negociação e esse acerto é feito sempre no 1º dia de greve. O que devemos definir até sexta [hoje] é quais serviços essenciais serão mantidos, pois atividades essenciais não podem parar.

Quais serviços essenciais não serão afetados pela greve?
Serviços ligados a compensações bancárias são os principais. Mesmo que 100% dos servidores entrem em greve esses serviços são mantidos, mesmo por servidores em greve, porque eles não podem parar. Manter o SPB no ar, o Pix no ar. Coisas essenciais vão continuar, porque não é de nosso interesse prejudicar os serviços essenciais. E esperamos que a greve seja a mais rápida possível.

E qual deve ser a adesão no 1º dia?
De cara, mais de 60%. De 60% a 70%, que já era o que estava tendo antes [os servidores já estão desde 17 de março fazendo paralisações diárias das 14h às 18h]. Já entregamos mais de 700 cargos de comissão, de um total de 1,1 mil ou 1,2 mil. Dos 3,4 mil funcionários da ativa, mais de 2,2 mil servidores certamente vão parar logo de cara. Tem setores muito radicalizados, o do Pix é um deles. Foi muito trabalho, muitas horas extras, para colocar o sistema de pé.

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Lucas Sampaio

Jornalista com 12 anos de experiência nos principais grupos de comunicação do Brasil (TV Globo, Folha, Estadão e Grupo Abril), em diversas funções (editor, repórter, produtor e redator) e editorias (economia, internacional, tecnologia, política e cidades). Graduado pela UFSC com intercâmbio na Universidade Nova de Lisboa.