Registro desfacelado: como cartórios do RS trazem de volta ‘docs’ levados pela água?

Digitalização em nuvem permite que emissão da segunda via de certidões seja ofertada à população

Anna França

(Arte: Leonardo Albertino/InfoMoney)
(Arte: Leonardo Albertino/InfoMoney)

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A digitalização dos cartórios, medida acelerada pelo CNJ (Conselho Nacional de Justiça), a partir de 2018, evitou prejuízos maiores às pessoas e às empresas do Rio Grande do Sul, estado que enfrenta as consequências provocadas pelas fortes chuvas e enchentes há mais de 20 dias. E um dos impactos do aguaceiro sem precedentes está na situação dos documentos perdidos que foram levados pela água.

Com o Provimento Nº 74, o CNJ estabeleceu que todos os cartórios adotassem padrões de tecnologia da informação para garantir a segurança, a integridade e, principalmente, a disponibilidade de dados.

A medida ganhou nova impulsão na pandemia, que acelerou a digitalização já em curso dos estabelecimentos em todo o país. Hoje, muitos já dispõem de arquivos online, armazenados em nuvem e backups físicos. Foram essas estruturas de armazenamento, inclusive, que permitiram a vários cartórios do Rio Grande do Sul o retorno, ainda que parcial ou remoto, dos serviços.

E mesmo em unidades mais atingidas pela tragédia climática, como a que aconteceu a um cartório no distrito de Galópolis, em Caxias do Sul (RS), que veio abaixo depois das chuvas. O espaço já foi conectado em outro prédio, e parte do acervo que ainda existia em papel está sendo recuperado.

Tamanho do problema

Levantamento preliminar realizado pela Associação dos Notários e Registradores do Estado do Rio Grande do Sul (Anoreg/RS) aponta que 27 Cartórios de Notas e de Registros foram atingidos pelas enchentes ocorridas no estado, assim como 130 colaboradores que atuam em 43 unidades de serviço.

Por causa desta situação, o atendimento presencial foi suspenso nesses cartórios em situação mais crítica até 31 de maio. Também foram interrompidos prazos para atos e procedimentos.

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“Poucos cartórios estão funcionando: são cerca de oito ou nove num universo de 33. Nosso primeiro problema são as estradas, que prejudicam o deslocamento. Além disso, há muitos desabrigados no estado e devemos levar até uns 30 dias para estar com tudo funcionando”, diz o presidente da Anoreg (Associação dos Notários e Registradores do Rio Grande do Sul), Cláudio Nunes Grecco.

Segundo Grecco, para atender a população que busca recuperar seus documentos pessoais, foi montado um serviço nos próprios abrigos que disponibiliza, de forma gratuita, a 2ª via de certidão de nascimento, casamento e óbito. “Isso só é possível porque tudo está digitalizado”, afirma.

Mas o registro de imóveis deve demorar mais. Grecco frisa que o financiamento imobiliário garante, por exemplo, um seguro embutido, o habitacional, que poderá ser acionado na reparação dos danos na residência. Quem perdeu a casa também tem a garantia da documentação de posse do terreno. “Porém, o problema está na irregularidade, porque muitas vezes a pessoa constrói a casa e não atualiza a documentação, especialmente na área rural. Por isso, pode haver questões perante as seguradoras, mas a posse é garantida”, diz.

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Para João Pedro Lamana Paiva, oficial do registro de imóveis em Porto Alegre e presidente do conselho deliberativo do Operador Nacional do Sistema de Registro Eletrônico de Imóveis, o Provimento 74 foi fundamental para não aprofundar o caos. Além da digitalização, segundo ele, muitos cartórios foram orientados para que se instalassem em prédios mais altos, para ter maiores garantias. “Mas isso não funcionou completamente porque muitos, como o nosso, ficam em prédios do centro de Porto Alegre. Porém, com a entrada alagada, o acesso aos andares mais altos ficou impossibilitada”, explica. Com backup em nuvem, o arquivo pôde voltar a ser acessado a remotamente de um coworking.

Ação emergencial

Cartórios do Rio Grande do Sul também participam da ação emergencial “Recomeçar é Preciso!”, com equipes trabalhando no atendimento aos atingidos pelas enchentes para o fornecimento da segunda via de certidões de nascimento, casamento e óbito gratuitamente. Tais documentos são indispensáveis para a obtenção de seguros, crédito, entre outros direitos básicos, como educação e saúde. O serviço já vem sendo prestado emergencialmente desde 6 de maio diretamente nos abrigos temporários das cidades.

A iniciativa é resultado de uma parceria entre a Presidência do TJRS, da Corregedoria-Geral da Justiça (CGJ-RS), do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), dos Registradores Civis do RS, do Comitê Gestor do Plano Social da Secretaria Estadual da Justiça, Cidadania e Direitos Humano, do Ministério Público do Estado e da Defensoria Pública do Estado. Ainda conta com o apoio da Polícia Federal, da OIM (Agência de Migração da ONU), do Tribunal Regional Eleitoral (TRE-RS) e do Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania.

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Postos de atendimento

7 espaços disponibilizam serviços cartorários em Porto Alegre, no momento. O horário de funcionamento varia: das 9h às 17h30 (nos cartórios já reabertos) e das 12h às 17h (nos demais espaços). Veja a lista abaixo:

Serviços Digitais

Os cidadãos também podem ter acesso a seus documentos por meio dos serviços digitais já oferecidos pelos cartórios. Para a solicitação de segundas vias de certidões de nascimento, casamento e óbito é possível fazer a solicitação em: www.registrocivil.org.br ou https://crccidadao.com.br/

Já os documentos relativos a imóveis podem ser solicitados aqui. Também é possível a solicitação de certidões de protesto pelo site www.pesquisaprotesto.com.br, de escrituras públicas pelo site www.e-notariado.org.br e de registros de títulos e documentos pelo site https://www.rtdbrasil.org.br , conforme orientação da Anoreg.

Anna França

Jornalista especializada em economia e finanças. Foi editora de Negócios e Legislação no DCI, subeditora de indústria na Gazeta Mercantil e repórter de finanças e agronegócios na revista Dinheiro