Reajuste: plano de saúde pode até dobrar de preço em 2021. Saiba o que você pode fazer

2021 terá não apenas o costumeiro reajuste anual de planos de saúde, mas a recomposição dos reajustes suspensos em 2020

Mariana Fonseca

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SÃO PAULO – As próximas cobranças para planos de saúde podem surpreender muitos consumidores. Isso porque 2021 não conta apenas com o costumeiro reajuste anual. O novo ano também traz as recomposições de reajustes suspensos por conta da pandemia do novo coronavírus.

Reajustes anuais e por mudança de faixa etária foram suspensos entre setembro e dezembro de 2020 – para alguns consumidores, até por mais meses. Assim, serão cobrados ao longo das doze parcelas de 2021.

Não são poucos os consumidores desse mercado – e afetados pela volta dos reajustes. Segundo a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), existem cerca de 47,3 milhões de beneficiários de planos de assistência médica.

Conheça planos de saúde e seus reajustes

Existem duas modalidades de planos de saúde. O plano individual/familiar pode ser contratado por qualquer pessoa física e tem seus reajustes e rescisões controlados pela ANS. O teto de reajuste anual é divulgado a partir de maio, valendo até abril do ano seguinte. Por exemplo, a agência definiu o aumento máximo de preços no plano individual/familiar em 8,14% para o período entre maio de 2020 e abril de 2021.

Já o plano coletivo só pode ser contratado por intermédio de uma associação, empresa empregadora ou um sindicato. Geralmente, é mais barato do que o plano individual/familiar de mesma operadora e cobertura. Mas os reajustes e rescisões não são controlados pela ANS, ficando sob responsabilidade da operadora e do que está escrito em contrato. O reajuste é definido quando o acordo faz aniversário – e não em maio de todo ano, como acontece no plano individual/familiar.

A mudança de preços no plano coletivo é baseada na sinistralidade, ou nas despesas e receitas das operadoras verificadas para cada contrato. “Os consumidores de planos coletivos podem sofrer altas bem maiores do que o teto definido pela ANS. Já vimos reajustes de 15%, 20% no último ano”, explica Marcos Patullo, advogado especializado em direito à saúde e sócio do escritório Vilhena Silva Advogados.

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Pandemia e suspensão de reajustes

Em agosto de 2020, a ANS suspendeu o reajuste por ano e por mudança de faixa etária por 120 dias, tanto em planos individuais/familiares quanto coletivos. Segundo a agência, o objetivo foi “conferir alívio financeiro ao consumidor sem desestabilizar regras e os contratos estabelecidos.”

Essa obrigação de suspender a aplicação de reajustes valeu entre setembro a dezembro de 2020. Nesse período, os beneficiários pagaram o valor que seria cobrado antes do reajuste anual.

No caso dos planos individuais/familiares, como a divulgação do teto de 8,14% para aumentos saiu apenas nos últimos meses de 2020, consumidores também não pagaram o reajuste que incidiria entre maio e agosto do mesmo ano (meses anteriores ao congelamento). No plano coletivo, o número total de parcelas com reajuste congelado depende do mês de aniversário do contrato. No mínimo, são as parcelas entre setembro e dezembro de 2020, com cobrança de reajuste proibida pela ANS.

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Já o reajuste por faixa etária foi suspenso nos últimos quatro meses de 2020 tanto para quem mudou de faixa etária entre setembro e dezembro quanto para os que já haviam mudado no período anterior, entre janeiro e agosto.

A decisão da ANS afetou 20,2 milhões de beneficiários em relação ao reajuste anual e 5,3 milhões de beneficiários em relação ao reajuste por mudança de faixa etária. Vale lembrar que os dois reajustes (e a suspensão de cobrança deles) podem ser aplicados a um mesmo beneficiário.

Recomposições por conta da pandemia

Os reajustes suspensos em 2020 não cairão no esquecimento. A ANS determinou que a somatória dos reajustes represados deve ser diluída em 12 parcelas ao longo dos meses de 2021.

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A surpresa na conta pode, portanto, aparecer já em janeiro. Cada caso é um caso, então é difícil precisar quanto a parcela aumentará de dezembro de 2020 para janeiro de 2021.

Um cenário extremo: o consumidor pode pagar não só a mensalidade do plano para janeiro de 2021 já reajustada, mas também a primeira parcela da recomposição do reajuste não cobrado entre maio e dezembro de 2020 e a primeira parcela da recomposição do reajuste pela mudança de faixa etária. “Em um caso como esse, a diferença pode muito bem dobrar a parcela”, diz Patullo.

Calcule o reajuste anual do seu plano, seja ele individual/familiar ou coletivo; some as recomposições de acordo com o número de parcelas pagas sem reajuste em 2020; e confira se você poderia ter sido alvo de reajuste por conta de mudança de faixa etária ao longo do último ano.

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Para contratos após 1º de janeiro de 2004, os reajustes são aplicados considerando as seguintes faixas etárias: 0 a 18 anos; 19 a 23 anos; 24 a 28 anos; 29 a 33 anos; 34 a 38 anos; 39 a 43 anos; 44 a 48 anos; 49 a 53 anos; 54 a 58 anos; e 59 anos ou mais.

A subida de valores depende do estipulado em cada contrato. “O reajuste por idade pode ser muito alto. Já vimos altas nas casas de 60%, 70% para quem chega aos 59 anos”, diz Patullo. A ANS coloca algumas regras que coíbem aumentos abusivos. Por exemplo, o valor do plano de saúde na última faixa (59 anos ou mais) não pode ser maior que seis vezes o valor da primeira faixa (0 a 18 anos). A variação de preços das faixas de 44 a 48 anos e de 59 anos ou mais, somadas, também não pode ser maior do que a variação acumulada entre as faixas que vão de 0 a 18 anos até a de 44 a 48 anos.

Quais são os direitos do consumidor?

As empresas que fornecem planos de saúde deverão deixar as mudanças na cobrança claras ao consumidor. A mensalidade de 2021, o valor referente à recomposição de 2020 e o número da parcela de reajuste (por exemplo, 1/12) devem constar destrinchados nos boletos.

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“O fundamento para suspender em setembro foi a crise, mas ela ainda não passou. Parcelas já reajustadas neste ano, somadas aos pagamentos retroativos de 2020, vão gerar inadimplência”, alerta Patullo. Por isso, o primeiro passo para o consumidor é conhecer qual o número de parcelas em atraso toleradas até o cancelamento do plano de saúde.

Nos planos individuais/familiares, a suspensão ou rescisão do contrato é prevista caso a inadimplência seja superior a 60 dias, consecutivos ou não, nos últimos 12 meses. A operadora deve alertar o consumidor sobre o débito e a possibilidade de cancelamento até o 50º dia de inadimplência. Já nos planos coletivos, a suspensão ou rescisão depende do que está previsto em contrato.

Outra possibilidade a se considerar é a portabilidade de um plano individual/familiar ou coletivo. Assim, o consumidor escolhe uma proposta com melhor custo-benefício sem cumprir um novo período de carência (tempo até a possibilidade de cobertura). É possível pesquisar opções e requisitos de portabilidade de acordo com seu plano atual pelo próprio site da ANS. É preciso estar com os pagamentos em dia para realizar a troca de planos.

“É extremamente recomendável que você tente renegociar o valor de sua mensalidade com a operadora de plano de saúde. Além disso, é possível mudar o contrato para uma modalidade mais simples, um movimento conhecido como downgrade, ou efetuar o que se chama de portabilidade de carências”, afirmou em comunicado o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec). “A partir desses procedimentos, o valor da mensalidade do plano de saúde pode diminuir e você não terá que cumprir novos períodos de carência.”

Se você ainda quiser continuar com o mesmo plano, mas foi alvo de um grande reajuste em 2021, exija esclarecimentos para a operadora do plano de saúde. Você pode pedir a devolução do valor correspondente diretamente à operadora. Se não tiver o problema resolvido, alguns caminhos são registrar uma notificação de intermediação preliminar na ANS ou uma reclamação nos órgãos de defesa Consumidor.gov e Procon.

O próximo caminho é a abertura de um processo judicial. Segundo Patullo, o beneficiário pode pedir prestação de contas da operadora (justificativa do aumento) e questionar a legalidade e a transparência do reajuste. “Pode ser que o juiz determine a realização de perícia, para verificar se o reajuste aplicado está correto ou não. O resultado dessa perícia vai depender dos documentos que as operadoras juntarem para demonstrar que o reajuste é necessário para reequilibrar o contrato. O processo também depende da capacidade de argumentação do consumidor.”

Quanto o consumidor pode perder ou ganhar com o processo depende do valor que está sendo discutido. Por exemplo, o consumidor pode questionar um reajuste de 30% ao longo de 12 meses e pedir a restituição do valor que pagou “a mais” nesse tempo. De acordo com Patullo, escritórios de advocacia avaliam todo o histórico de pagamentos do beneficiário e pedem a revisão de todo o período de adesão. Mas só é possível pedir de volta valores cobrados nos últimos três anos. Caso perca a ação, o consumidor terá de pagar as mensalidades com o reajuste proposto pela operadora, caso não o tenha feito. Pagamentos ao advogado que defende a causa variam em cada escritório de advocacia, mas podem ser tanto taxas fixas quanto cobranças apenas no êxito do processo.

“É fundamental que os consumidores se preparem, estejam atentos a eventuais cobranças abusivas e cobrem explicações das operadoras. Historicamente, os reajustes abusivos são justamente o principal motivo de reclamação por parte dos usuários de planos de saúde”, afirmou em comunicado Ana Carolina Navarrete, advogada e coordenadora do Programa de Saúde do Idec.

Uma pesquisa feita entre agosto e outubro de 2020 pelo Idec, com 518 pessoas, mostrou que, entre consumidores de planos de saúde que relataram alguma queixa naquele ano, 56% deles tiveram problemas especificamente com reajustes.

Organizações de defesa do consumidor entram com ações

Organizações que representam consumidores não apenas emitiram recomendações aos beneficiários de planos de saúde, mas abriram processos judiciais. Em outubro de 2020, o Idec entrou com uma ação na Justiça Federal do Distrito Federal pedindo que a ANS reformulasse a medida e ampliasse a suspensão dos reajustes nos planos de saúde.

O processo está na 21ª Vara Cível Federal do Distrito Federal, e o Idec apresentou o pedido de urgência à Justiça Federal no dia 18/12.  O instituto pede a inclusão de planos coletivos empresariais com mais de 30 vidas, que “representam 67% do mercado e não são regulados”. “Nesses casos, o órgão determinou que a aplicação do reajuste seja negociada diretamente entre as empresas e as operadoras – o que na prática inviabiliza a suspensão do aumento para estes usuários”, afirma o Idec em comunicado.

O instituto também demanda que o período de suspensão de reajustes conte a partir de março, quando o Brasil já estava em pandemia. Assim, usuários que viram alta das mensalidades antes da decisão da ANS poderiam ser ressarcidos.

O Procon-SP também vai entrar com uma ação para suspender ou diminuir o percentual de reajuste. O processo será “contra todos os planos de saúde”, disse o órgão em comunicado. Para subsidiar a ação, o Procon-SP defende que consumidores que receberam boleto mensal com reajuste abusivo registrem sua reclamação no site do órgão. O órgão também recomenda que consumidores não suspendam pagamentos.

As queixas durante o mês de janeiro serão analisadas e encaminhadas na ação, proposta junto à Procuradoria Geral do Estado de São Paulo. O tratamento dado pelo Procon-SP para as reclamações não será individualizado, e sim coletivo. Ou seja, caso o resultado da ação seja positivo, todos os consumidores serão beneficiados.

Mariana Fonseca

Subeditora do InfoMoney, escreve e edita matérias sobre empreendedorismo, gestão e inovação. Coapresentadora do podcast e dos vídeos da marca Do Zero Ao Topo.