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Um professor e pesquisador da USP (Universidade de São Paulo) virou notícia ao doar para o Fundo Patrimonial da universidade um prédio avaliado em R$ 25 milhões. Localizado no centro da cidade de Poços de Caldas, em Minas Gerais, o edifício faz parte da herança do antropólogo Stelio Marras, que leciona na USP. Esta foi a maior contribuição recebida pelo fundo, criado em 2021. O valor deve ser somado aos atuais R$ 34 milhões de patrimônio da instituição.
Marras, que é antropólogo e já foi aluno da universidade, hoje atua no Instituto de Estudos Brasileiros (IEB). Ele espera que a doação, já registrada em seu testamento, ajude na concessão de bolsas de permanência estudantil, para garantir que grupos minoritários não abandonem as salas de aula da universidade.
Doações assim são destinadas ao fortalecimento da universidade, garantindo sustentabilidade financeira e a qualidade do ensino. A doação de bens em testamentos para instituições sem fins lucrativos, como fez o professor, é chamado de “Legado Solidário”. No entanto, ainda é pouco utilizada no Brasil.
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Nos Estados Unidos, onde as doações para universidades são mais comuns, outra professora também surpreendeu o mundo ao doar US$ 1 bilhão para quitar todas as mensalidades de alunos de medicina da Escola de Medicina Albert Einstein, no Bronx. Ruth Gottesman é viúva de David Gottesman, um dos primeiros investidores na Berkshire Hathaway, o conglomerado de Warren Buffet. Ele faleceu em setembro de 2022, aos 96 anos, e ela herdou uma fortuna, que agora deseja que possibilite o acesso de jovens de todas as classes sociais à universidade. Aos 93 anos, ela fez uma das maiores doações já feitas a uma universidade nos Estados Unidos, destinando o dinheiro para uma das faculdades localizadas no distrito mais pobre da cidade de Nova York.
“Ele me deixou uma carteira de ações da Berkshire com instruções para fazer o que achava certo”, disse. O investidor tinha uma fortuna avaliada pela Forbes em US$ 3 bilhões e doou US$ 330 milhões para obras de caridade.
“Se eu morrer amanhã, o prédio vai ser imediatamente transferido para esse fundo da USP, que vai bancar com os dividendos dessa doação, bolsas de permanência estudantil”, declarou Marras em entrevista à EPTV, afiliada da Globo.
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Regras de sucessão
No Brasil, porém, há regras especiais de sucessão que impedem que alguém deixe valores indiscriminadamente, seja para instituições, associações ou para animais, como é comum nos Estados Unidos. De acordo com o advogado Mauro Takahashi Mori, sócio da área de planejamento sucessório do Machado Associados, uma pessoa que tenha herdeiros necessários — como ascendentes, descendentes e cônjuges — só podem doar metade dos bens, porque o restante é para dividir com os herdeiros. “Garantindo a metade dos herdeiros, a outra parte disponível pode ser doada como a pessoa preferir, seja para uma pessoa ou instituição de caridade”, explica.
Caso não haja herdeiros necessários, a pessoa pode dispor dos seus bens como quiser, inclusive em vida, desde que fique garantida uma parte para a própria sobrevivência, complementa o advogado. “Mas vale lembrar que, no Brasil, não é possível doar dinheiro para gato, cachorro ou qualquer animal. O que pode ser feito é doação para alguma pessoa que seja obrigada a cuidar do pet”.
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Graças à flexibilidade das leis norte-americanas, isentas de quaisquer travas, as doações de milionários para causas sociais se multiplicam. Aos 93 anos, o próprio Warren Buffett anunciou que destinará 99% de sua fortuna para quatro instituições de caridade, incluindo a fundação criada por Bill e Melinda Gates. Um dos homens mais ricos do mundo, seu patrimônio líquido é estimado em US$ 121 bilhões.
O próprio Bill Gates, outro bilionário com uma fortuna avaliada em US$ 124,5 bilhões, já disse que deixará 99% do dinheiro para a fundação que criou em parceria com sua ex-mulher. Os três filhos do casal herdarão apenas 1% do montante, cerca de US$ 10 milhões para cada um.
Segundo a advogada especialista em planejamento patrimonial do Innocenti Advogados, Vanessa Sene, existe no Código Civil uma disposição para criação de uma fundação, que seria o destino do dinheiro especialmente quando se fala em grandes fortunas. “Pode-se estruturar um projeto e constituir uma fundação ou, se não for suficiente, direcionar para alguma fundação com atividade semelhante que dará destino ao dinheiro. Mas sempre se garantindo o direito dos herdeiros necessários”, explica.
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Segundo a especialista, a prática é pouco fomentada no Brasil, mas permitida pelo Código Civil, desde 2002. “Imagino que vá aumentar, porque é uma questão de educação. Movimentos como de Bill Gates vem fomentando isso no mundo inteiro e já começamos a ver agora alguns casos no Brasil”.
Recentemente Elie Horn, fundador da Cyrela, trouxe de volta a discussão acerca da disposição da herança no Brasil. Ele foi o primeiro brasileiro a se associar ao movimento americano The Giving Pledge, que possui como objetivo estimular os indivíduos e as famílias com grandes fortunas a doar a maior parte de seu patrimônio para a caridade.
De acordo com a advogada Luiza Mendonça, sócia do escritório Marina Dinamarco, a intenção de Horn de doar 60% de sua riqueza é admirável. “Mas é importante se atentar que a destinação do patrimônio em vida, no Brasil, deve respeitar os limites impostos pelas disposições expressas no Código Civil sobre a herança”.
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O que diz a lei?
Os artigos 1.845 a 1.860 do Código Civil determinam que qualquer pessoa possui ampla liberdade para dispor de seus bens, desde que dentro do limite legal estabelecido pela lei respeitando a parte do patrimônio (50%) que deverá ser destinada obrigatoriamente para os herdeiros necessários (filhos e netos denominados como descendentes, pais e avós, os ascendentes, e o cônjuge ou companheiro).
Os outros 50% do patrimônio, denominados de “parte disponível”, podem ser livremente destinados pelo falecido para qualquer pessoa — familiar ou não — ou entidade, no momento da realização da escritura de testamento.
“Assim, ainda que a vontade de Horn [fundador da Cyrela] seja inspiradora e ofereça diversos benefícios sociais, a destinação de quantia superior a 50% do seu patrimônio à caridade trará complicações sucessórias e tributárias no momento do seu falecimento, que poderá ter o seu patrimônio contestado pelos herdeiros na parte que exceder a parte disponível”, diz a advogada Luiza Mendonça.
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