O que Charles Darwin pode ensinar sobre o mercado financeiro?

Há gestores mundo afora que adotam estratégias de investimentos com base na Teoria da Evolução, da qual Darwin é um dos principais representantes

Lucas Gabriel Marins

(Foto: Paulo Aguiar, designer do InfoMoney)
(Foto: Paulo Aguiar, designer do InfoMoney)

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Nesta quarta-feira (12), é comemorado o aniversário de 216 anos do nascimento do naturalista britânico Charles Darwin. Mas o que esse cientista, amplamente estudado em cursos de biologia e frequentemente visto como uma figura polêmica entre religiosos, tem a ver com um site especializado em mercado financeiro? Acredite, muito mais do que parece.

Há gestores mundo afora que adotam estratégias de investimentos com base na Teoria da Evolução, para a qual Charles Darwin contribuiu de forma significativa. Em síntese, esse campo de estudo mostra, com base em farta pesquisa, que as espécies mudam ao longo do tempo por meio da seleção natural – processo em que indivíduos com características vantajosas têm maior probabilidade de sobreviver, reproduzir-se e transmitir seus genes.

Pulak Prasad, fundador da empresa de investimentos indiana Nalanda Capital, é um desses gestores. Em seu livro “What I learned about investing from Darwin” (O que aprendi sobre investimento com Darwin), publicado em 2023 pela editora Columbia Business School, ele defende que os princípios da evolução podem ser empregados também no mercado financeiro.

“Quase todos os temas que estudei em biologia evolutiva têm paralelos com o investimento em geral e, em particular, com a abordagem de investimento da Nalanda. Quanto mais eu estudava a evolução darwiniana, um novo hobby, mais aprendia sobre investimentos, uma paixão antiga”, escreveu o gestor, responsável por administrar cerca de US$ 4 bilhões por meio de sua firma.

Veja a seguir algumas das dicas do livro!



De olho no passado, não no futuro


Darwin, em sua obra clássica A Origem das Espécies, escreveu que a seleção natural baseia-se em três pilares: variação genética aleatória entre os descendentes de um organismo, diferenças de adaptação que favorecem ou rejeitam essas variações e a herança dessas características ao longo das gerações. Esse processo, repetido ao longo de milhões de anos, explica a diversidade da vida, desde um protozoário até os mamíferos.

Assim como Darwin usou a história para entender a evolução, os investidores podem aplicar princípios semelhantes ao analisar empresas, segundo o autor. A chave está em interpretar o presente com base no contexto histórico, utilizando fatos conhecidos por todos, mas com uma visão crítica. Em vez de tentar prever o futuro, o foco deve ser estudar o passado de uma empresa: seus resultados financeiros, estratégias adotadas, posição competitiva e, finalmente, atribuir um valor justo a ela.

Leia também: Não seja irracional como Darwin

Convergência dos camaleões

Existe um fenômeno chamado evolução convergente, em que espécies distintas desenvolvem características semelhantes para enfrentar desafios ambientais comuns. Um exemplo clássico são os anolis caribenhos (os camaleões), que, em ilhas diferentes, apresentam soluções idênticas de forma independente – como comprimento da cauda, corpo e coloração – para problemas específicos. “Surpreendentemente, eles fizeram isso independentemente uns dos outros”, escreveu Prasad.

No mundo dos investimentos, a convergência também existe, segundo o autor. Ao investir em uma empresa, não se compra apenas o negócio, mas toda a indústria à qual ele pertence, disse. “Nenhuma empresa é uma ilha. Nunca podemos ignorar os tipos de negócios que a cercam”.

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Ele defende que, se uma indústria permite que suas empresas sejam consistentemente lucrativas, ela merece atenção. Caso contrário, como no exemplo das companhias aéreas, é preciso uma justificativa sólida para investir tempo e recursos. Afinal, a vida é curta demais para desperdiçar oportunidades em setores sem potencial convergente de sucesso, falou.



A estratégia de um veado


Para conseguir sobreviver e passar as características para a próxima geração, os animais analisam todo o ambiente para não perder a vida. Veja o exemplo dos veados. Antes de beber água nos riachos, eles verificam com bastante cuidado se há crocodilos à espreita para abocanhá-los. Embora alguns ainda acabem perdendo a vida na hora de saciar a sede, a espécie existe até hoje – um sinal de que a prática tem dado certo.

No contexto dos investimentos, o autor compara isso à importância de preservar o capital. Muitos investidores perdem dinheiro ao assumir riscos excessivos ou ao perseguir ganhos rápidos. A lição é a seguinte: se o veado evita situações perigosas para sobreviver, os investidores devem evitar apostas arriscadas que possam comprometer seu patrimônio.



De raposa selvagem para pet


No início da década de 60, um experimento com raposas-prateadas, feito pelos cientistas Dmitri Belyaev e Lyudmila Trut, demonstrou como a seleção de uma única característica – a docilidade, nesse caso – transformou animais selvagens em criaturas domesticadas em poucas gerações.

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Em resumo, eles reuniram animais e separaram os mais calmos para acasalarem ao longo de alguns anos. Em 1963, após vários acasalamentos, surgiu um filho abanando o rabo, um comportamento típico de um pet até então não visto nas raposas selvagens. Esse processo evolutivo rápido direcionado, que resultou em mudanças comportamentais e até fisiológicas, ilustra como a seleção de um traço-chave pode gerar múltiplos benefícios, segundo o autor.

No mercado financeiro, escreveu Prasad, essa ideia se reflete na escolha de empresas com um atributo fundamental. O exemplo dado foi o Retorno sobre o Capital Empregado (ROCE) – métrica pouco usada no Brasil que mostra até que ponto uma empresa gera lucro a partir do seu capital à medida que é utilizado – em vez do Retorno Sobre o Patrimônio (ROE). Um ROCE alto, por exemplo, permite avaliar a eficiência operacional de uma companhia sem distorções causadas por estratégias de financiamento ou otimizações fiscais, disse.

Leia mais: Indicadores fundamentalistas – guia para analisar empresas listadas