Marco das Garantias muda regras da hipoteca e da alienação fiduciária; confira alterações

Extensão de financiamento, nova dívida com uso de imóvel financiado e perdão de débitos de imóveis arrematados em leilão constam na nova norma

Maria Luiza Dourado

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Sancionado recentemente, o Marco das Garantias altera algumas normas relacionadas aos empréstimos para facilitar a retomada da garantia pelo credor em caso de inadimplência do devedor e, assim, reduzir o custo do crédito. Entre as principais mudanças está a alteração na execução extrajudicial em hipoteca e a autorização de uma segunda alienação fiduciária usando o mesmo imóvel. 

O InfoMoney buscou informações com Carlos Ávila, advogado especialista em direito privado e sócio do Carneiro Advogados, e João Paulo Cucatto, especialista em contencioso civil do Teixeira Fortes Advogados Associados, para entender a mudanças que o Marco Legal trará para a alienação fiduciária e a hipoteca. Confira:

O que muda na alienação fiduciária?

A alienação fiduciária é um mecanismo que oferece uma garantia de empréstimo ao credor. No momento da assinatura do contrato de empréstimo, comumente um financiamento imobiliário (mas não é exclusiva desta modalidade), o cliente garante o pagamento da dívida por meio da alienação fiduciária, que nada mais é do que a transferência de propriedade ao concedente do crédito.

Nela o tomador de crédito só se torna dono no imóvel em questão quanto quitar a última parcela da dívida. Da mesma forma, em caso de inadimplência, o imóvel dado como garantia tem sua propriedade consolidada no nome do credor (banco), em um processo que se dá via cartório de imóveis, de maneira extrajudicial – sem acionar a Justiça.

O Marco das Garantias mantém esse mesmo funcionamento inalterado, mas passa a permitir as duas situações a seguir:

Novas dívidas do mesmo credor

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O devedor poderá contrair novas dívidas com o mesmo credor da alienação fiduciária do seu empréstimo original ou alongar o seu financiamento, respeitando o limite da sobra de garantia da operação inicial. Isso significa que, se o valor garantido por um imóvel no primeiro empréstimo for de até R$ 100 mil e a dívida original for de R$ 20 mil, o devedor poderá tomar um novo empréstimo junto ao mesmo credor em valor de até R$ 80 mil.

Segunda alienação

Tal qual ocorre com hipotecas, agora será permitido ao consumidor contrair uma segunda dívida usando como garantia um imóvel que está sendo adquirido com a alienação fiduciária como mecanismo de garantia, inclusive em uma instituição financeira diferente.

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Nessa situação, em caso de inadimplência, o primeiro credor – o banco que concedeu o crédito primeiro – terá prioridade na execução da dívida, ou seja, na retomada do imóvel. Quando esse imóvel for vendido novamente – possivelmente em um leilão – os demais credores terão direito a uma parte do dinheiro da venda.

O que muda na hipoteca?

A hipoteca é uma linha de crédito que também tem como garantia um imóvel. Contudo, nesta modalidade, a propriedade do imóvel permanece no nome do tomador de crédito – e não é  transferida para o banco (credor), como ocorre em contratos de alienação fiduciária. Com isso, em caso de inadimplência, se tornava mais difícil para o banco retomar a garantia.

“A garantia hipotecária, que foi amplamente utilizada no Brasil, ficou ultrapassada devido à morosidade na retomada da garantia em caso de inadimplemento, já que esse processo tinha que ser feito judicialmente, ou seja, poderia levar anos até a recuperação do bem. Hoje, já existe a execução extrajudicial em contratos de hipoteca, mas não é o mais comum. Agora, com o Marco, a questão está endereçada e pode transmitir uma impressão de maior segurança aos credores”, afirma o advogado João Paulo Cucatto.

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A execução extrajudicial no caso de inadimplência em contratos de hipoteca, isto é, a retomada do bem dado como garantia existe, mas não é amplamente utilizada e, na verdade, se restringe a poucos contratos. Agora, o Marco das Garantias estrutura o procedimento em hipoteca e limita prazos para a conclusão de cada etapa – assim como ocorre na alienação fiduciária.

A partir da configuração de inadimplência pelo contrato – que tradicionalmente é caracterizada pelo atraso de 4 a 7 parcelas consecutivas, a depender do acordo – agora haverá um período estipulado de 105 dias para as primeiras etapas que envolvem a execução – 15 dias para que o devedor regularize sua situação pagando o valor devido (mora); caso não o faça, inicia-se o período de 15 dias para a solicitação do leilão do imóvel, depois 60 dias para que se realize o 1º leilão e, em caso de ausência de oferta, mais 15 dias para a realização do segundo.

Marco altera perdão legal de dívidas de imóveis leiloados

Alienação fiduciária

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Quando um imóvel retomado dentro dessa modalidade ia a leilão, caso não recebesse oferta na primeira disputa, que deve ser igual ou maior que seu valor de avaliação, o imóvel era encaminhado para o segundo leilão. Nesta etapa, poderia ser arrematado por um valor menor do que sua dívida, e o excedente era perdoado.

O Marco das Garantias estipula agora que isso só valerá para imóveis que foram adquiridos para fim residencial. “Esse perdão só valerá para financiamento da casa própria”, explica o advogado Carlos Ávila.

Hipoteca

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No caso de contratos de hipoteca, o perdão legal, que não existia em nenhum dos casos (imóvel para fim residencial ou comercial). Agora, passará a valer quando o arrematante tiver adquirido o imóvel como casa própria.

Empréstimo contraído por CNPJ

Ainda que o Marco das Garantias tenha equiparado alguns pontos entre hipoteca e alienação fiduciária, uma mudança fundamental permanece em casos de imóveis dados como garantia de empréstimo por empresas que vierem a entrar em recuperação judicial.

A recuperação judicial (ou RJ, no jargão do mercado) evita que a empresa quebre quando está em uma crise financeira. Além de socorrer os sócios, esse instrumento visa proteger também funcionários, fornecedores, prestadores de serviços, clientes e todos os que, de alguma forma, possuem algum vínculo com a organização. Na prática, a RJ procura viabilizar um acordo entre a empresa devedora e todos os seus credores, para que ela possa se tornar novamente viável e volte a operar com solidez.

Quando uma empresa entra em RJ, caso ela tenha contraído um empréstimo com alienação fiduciária, o banco não precisa fazer parte do processo ou da negociação com credores. Na verdade, a instituição financeira apenas executará a garantia e a receberá, dentro dos ritos legais e extrajudiciais.

Já no caso de uma empresa que entra em RJ e tinha uma hipoteca ativa, o banco entra nas negociações e está obrigado a aguardar todas as etapas do procedimento – vale lembrar que, em uma recuperação judicial, as dívidas trabalhistas têm preferência para recebimento de valores, e só depois vêm os credores com garantia real.

Maria Luiza Dourado

Repórter de Finanças do InfoMoney. É formada pela Cásper Líbero e possui especialização em Economia pela Fipe - Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas.