Finanças e blockchain: as soluções dos indígenas Paiter-Suruí para financiar projetos

Busca por soluções tecnológicas nasceu das dificuldades: como não tem posse da terra, o Povo Paiter-Suruí não consegue crédito

Renata de Carvalho

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Produtor de cafés premiados, o povo Paiter-Suruí, de Cacoal (RO), resolveu apostar na fusão de tecnologia com finanças para conseguir viabilizar seus projetos de agricultura regenerativa e reflorestamento. Na liderança do projeto está Uraan Anderson Surui, Vice-Cacique Geral do Povo Paiter-Suruí, que enquanto corre atrás para superar barreiras burocráticas em instituições tradicionais como Banco do Brasil, Banco da Amazônia e cooperativas de crédito, aposta em pools de liquidez para garantir que os projetos tenham recursos no longo prazo.

A busca por soluções tecnológicas nasceu das dificuldades. Como não tem posse da terra, mesmo com plantações de café, banana e cacau à vista, prêmios internacionais pela qualidade dos grãos e movimentação de recursos mensais próximas da casa do milhão, o Povo Paiter-Suruí tem dificuldade de acesso a crédito.

“Quando houve contato, na época da invasão, os colonos que abandonaram a região (por não se adaptarem às condições climáticas) deixaram muitos pés de café para trás. Durante um tempo, não sabíamos o que fazer, mas depois percebemos que teria valor e começamos a desenvolver cafeicultura. São essas áreas que mantemos hoje, de uma forma bastante sustentável”, conta Uraan, dando uma aula de história da Amazônia.

O Povo Paiter-Surui que vive em Rondônia não tem documento de posse da terra que ocupam. Também não está em uma reserva indígena e não tem muita expectativa nas organizações não governamentais que atuam há décadas na Amazônia.

“Há 40, 50 anos, eles (as ONGs) estão muito à frente de algumas discussões, falando em nome dos indígenas. A construção desse diálogo precisa de um fórum mais presente na base e esse recurso tem que ser usado para desenvolver os projetos. O momento é agora. Tem muita gente nova chegando”, diz, apostando na nova geração de indígenas para conquistar mais protagonismo.

Segundo ele, algumas organizações recebem recursos razoáveis, milhões às vezes,  e apenas 10% a 15% chega na ponta. “Boa parte fica em consultorias, viagens. Então, não há o apoio necessário às iniciativas que precisam de recursos”, diz.

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Governo Federal, Holanda e pool de liquidez

Em 2020, eles constituíram uma cooperativa e estão em contato com o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) para buscar maneiras de fortalecer as cooperativas indígenas. “Precisamos de um programa para atender nossas especificidades”, diz.

A maior aposta de Uraan está mesmo nas novas tecnologias. Uma doação da fundação holandesa reNature será usada para criar uma techhouse, onde os indígenas serão capacitados em programação de computadores, finanças e blockchain. A tecnologia de blockchain tem muito potencial para certificação dos produtos indígenas, acredita.

Para dar perenidade ao projeto, ele está usando um pool de liquidez. O principal dos recursos fica aplicado e o dinheiro usado no dia a dia vem de tarifas e taxas de juros decorrentes da aplicação em empréstimos pelo pool, como faz um banco. É um modelo que ele gostaria de usar também para os projetos de reflorestamento.

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“Acredito muito na formação de finanças e tecnologia. O que os bancos fazem, que sobrevivem de taxas, podemos fazer da mesma forma”, diz.