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Os atrasos na liberação de recursos do consignado do Auxílio Brasil pela Caixa Econômica Federal se devem ao “excesso de demanda” pela linha de crédito, afirmou na sexta-feira (21) o vice-presidente de rede de varejo do banco, Julio Volpp: “Tivemos um excesso de demanda em termos de procura”.
Volpp disse que a busca por empréstimos aumentou cerca de 10 vezes a partir da liberação do consignado do Auxílio Brasil, no dia 11. “Nós estamos processando os pedidos e trabalhando para normalizar”.
A presidente da Caixa, Daniella Marques, disse na segunda-feira (17) que o banco liberou R$ 1,8 bilhão para cerca de 700 mil beneficiários em apenas 4 dias. Mas o dinheiro, que deveria se liberado em até 2 dias úteis após a contratação, deve levar até 15 dias, segundo o jornal O Estado de S. Paulo.
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Diante do alto valor liberado, o Ministério Público (MP) junto ao Tribunal de Contas da União (TCU) pediu a suspensão da linha de crédito pela Caixa para “impedir sua utilização com finalidade meramente eleitoral” e um possível “desvio de finalidade”.
Mas a área técnica do TCU contrariou o pedido do MP, de suspender a concessão de novos empréstimos até que o tribunal se manifeste definitivamente sobre o assunto, e sugeriu que a Caixa tenha 5 dias úteis para se posicionar, antes de uma decisão ser tomada, “em face da relevância social” do tema (veja mais abaixo).
Caixa, Auxílio Brasil e eleição
Desde o início do segundo turno, a Caixa tem anunciado diversas medidas e programas focados nas classes mais baixas e nas mulheres — públicos em que o presidente e candidato à reeleição, Jair Bolsonaro (PL), tem maior rejeição. A Caixa é um banco controlado 100% pelo governo federal.
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Ela é o único grande banco do país a oferecer o consignado do Auxílio Brasil. Outros 11 bancos e instituições financeiras também foram autorizados a operar a linha de crédito, entre eles o banco Safra e a Crefisa, mas apenas a Pincred e a meutudo/QI estão oferecendo o produto no momento.
Todos os grandes bancos que têm capital aberto — Banco do Brasil (BBAS3), Bradesco (BBDC4), Itaú Unibanco (ITUB4) e Santander Brasil (SANB11) — têm mostrado receio com o produto (considerado arriscado dado o perfil do público-alvo e a situação de fragilidade social de muitos beneficiários).
Entre os anúncios feitos pela Caixa nos últimos dias estão:
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- Dia 7: lançou sua campanha anual de renegociação de dívidas, com desconto de até 90% (e a expectativa de regularizar R$ 1 bilhão em contratos e limpar o nome de 4 milhões de pessoas). O lançamento da campanha foi antecipado por Bolsonaro em um evento de campanha;
- Dia 11: lançou seu consignado do Auxílio Brasil e liberou R$ 1,8 bilhão para cerca de 700 mil pessoas em apenas 4 dias;
- Dia 17: lançou um programa para apoiar a formalização de mulheres empreendedoras, que prevê liberar R$ 1 bilhão em crédito até 19 de novembro;
O banco também antecipou o pagamento do Auxílio Brasil e do vale-gás em outubro, para o calendário ser concluído até o dia 25 — cinco dias antes do segundo turno (originalmente, o repasse terminaria após as eleições). Antecipou também os pagamentos do auxílio caminhoneiro e do auxílio taxista neste mês e anunciou que a quinta e a sexta parcelas dos benefícios também serão antecipadas.
O consignado do Auxílio Brasil é uma das medidas do pacote de benefícios sociais do governo para tentar alavancar as intenções de voto de Bolsonaro junto às camadas de menor renda da população. A medida é vista como eleitoreira e criticada por especialistas da área social por ser um estímulo ao endividamento de pessoas que já vivem em condições de alta vulnerabilidade e insegurança alimentar.
O que diz a Caixa
A presidente da Caixa, Daniella Marques, disse na sexta-feira (21) que a demanda pelo consignado do Auxílio Brasil tem sido alta, entre outros pontos, porque a população está endividada em linhas de crédito com juros mais altos — e por isso contrai o novo empréstimo para pagar estas dívidas. Ou seja: troca uma dívida por outra, mais barata.
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Marques citou dados do Banco Central sobre taxas de juros no crédito: 13,8% ao mês de juros médios no rotativo do cartão de crédito em junho, 5,4% ao mês no crédito pessoal não consignado e 19,8% ao mês nos bancos e financeiras que operam com clientes “negativados” (com o nome sujo por dívidas).
O consignado do Auxílio Brasil tem juros de 3,45% ao mês na Caixa (50,23% ao ano), valor próximo do limite de 3,50% estabelecido pelo governo federal (51,11% ao ano). A parcela mínima para pagar o empréstimo é de R$ 15 por mês e a máxima, de R$ 160. A duração máxima é de até 24 meses.
Sobre o pedido do MP junto ao TCU, de suspender a concessão de novos empréstimos até uma posição final do tribunal, Marques disse que respeitará qualquer decisão, mas que o banco tem oferecido a linha de crédito de forma consciente. “Se a decisão for esta [pela suspensão da oferta], cabe a nós respeitar”.
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O que diz o MP junto ao TCU
O requerimento do MP junto ao TCU foi feito na terça-feira (18) pelo sub-procurador-geral Lucas Rocha Furtado. Ele afirma no pedido de medida cautelar que o “assombroso montante” de R$ 1,8 bilhão em crédito já liberado pelo banco público em poucos dias “impõe dúvidas sobre as finalidades perseguidas”.
“Há a possibilidade de a empresa pública haver incorrido em flagrante desvio de finalidade pública, utilizando-se indevidamente de seus recursos e de sua estrutura para interferir politicamente nas eleições presidenciais, situação a demandar notoriamente a atuação do TCU”, afirma o sub-procurador-geral.
Furtado afirma que as suspeitas, se confirmadas, configurariam “ocorrência de extrema gravidade” — inclusive com implicações criminais comuns e de crime de responsabilidade, alheias às competências do TCU, e também implicações administrativas”.
Ele cita na representação a proximidade do segundo turno das eleições e a posição de desvantagem de Bolsonaro nas pesquisas de intenção de voto em relação ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e diz que “tudo indica” que a medida visa atender a interesses políticos-eleitorais em detrimento da população.
“Com efeito, não é desarrazoado supor (…) que o verdadeiro propósito dessas ações, ou pelo menos da forma como elas estão sendo conduzidas, seja o de beneficiar eleitoralmente o atual presidente da República e candidato à reeleição”, afirma Furtado no pedido de medida cautelar.
Ele cita ainda agilidade “inesperada” nas concessões de crédito, que “provavelmente” ocorrem de “forma açodada”, além de destacar que a ação visa majoritariamente o público feminino, no qual Bolsonaro tem desvantagem em relação a Lula, segundo as pesquisas eleitorais.
O que diz o parecer técnico
A área técnica do TCU, no entanto, não endossou o pedido do MP e recomendou que, “para o caso em exame, em face da relevância social de que se reveste, entende-se que o juízo acautelatório deva ser formado após a oitiva prévia da Caixa”.
O parecer foi incluído na noite de quinta-feira (20) no processo que está em andamento no tribunal. Até a publicação desta reportagem, o ministro Aroldo Cedraz, relator do caso no TCU, ainda não se manifestou sobre o caso.
A sugestão da área técnica é que o tribunal dê 5 dias úteis à Caixa para se manifestar sobre o pedido do MP, “especialmente quanto aos pressupostos de concessão de medida cautelar, e, especificamente, sobre o possível desvio de finalidade na concessão de volume expressivo de recursos nos empréstimos consignados aos beneficiários do Auxílio Brasil”.
O documento técnico sugere ao relator que intime o banco a apresentar uma série de documentos e informações, como:
- Volume total de recursos que a Caixa já contratou e que ainda irá disponibilizar para concessão de empréstimos consignados para beneficiários do Auxílio Brasil e do Benefício de Prestação Continuada (BPC);
- Discriminação dos volumes contratados, valor médio dos empréstimos, taxa de juros, prazo do empréstimo e valor médio do benefício para o Auxílio Brasil e para o BPC, em separado;
- Esclarecimentos e justificativas para o início da concessão do empréstimo consignado para beneficiários do Auxílio Brasil e do BPC, bem como sobre o ritmo das contratações.
O consignado do Auxílio Brasil
O consignado do Auxílio Brasil tem juros de 3,45% ao mês na Caixa (50,23% ao ano), mas há bancos e instituições financeiras que oferecem o produto com juros a partir de 2,89% ao mês, segundo levantamento do InfoMoney com as empresas autorizadas pelo Ministério da Cidadania a oferecer a linha de crédito.
O teto de juros estipulado pelo governo federal para o consignado do Auxílio Brasil (3,50% ao mês) é superior ao imposto pelos bancos ao consignado do INSS (2,14%). Também está acima do que é cobrado em vários tipos de consignado, segundo dados do Banco Central:
- Trabalhadores do setor privado: até 2,61% ao mês
- Trabalhadores do setor público: até 1,70%
- Aposentados e pensionistas do INSS: até 1,97%
- Consignado pessoal total: até 1,85%
Na Caixa, o empréstimo pode ser contratado pelo aplicativo Caixa Tem e em mais de 26 mil pontos físicos (mais de 4 mil agências do banco, mais de 9 mil correspondentes Caixa Aqui e mais de 13 mil lotéricas). O responsável precisa estar recebendo o benefício há mais de 90 dias (3 meses) e não pode ter deixado de comparecer a uma convocação do Ministério da Cidadania.
Regras da linha de crédito
As pessoas que recebem o Auxílio Brasil pode comprometer até 40% do valor permanente do benefício para pagar o empréstimo, por um prazo máximo de 24 meses. O valor permanente é de R$ 400, pois os atuais R$ 600 estão garantidos pelo governo federal só até dezembro.
Assim, o beneficiário poderá descontar até R$ 160 mensais durante, no máximo, 2 anos. O pagamento do empréstimo é descontado todos os meses do valor do benefício, diretamente na folha de pagamento, durante o prazo contratado (o desconto é feito antes de o Auxílio Brasil ser depositado na conta).
Caso o beneficiário deixe de receber Auxílio Brasil, independentemente do motivo, ele será obrigado a continuar pagando as parcelas por conta própria, até o final do contrato, pois o empréstimo não será cancelado.
O que é proibido
Os bancos e as instituições financeiras que oferecem o produto não podem cobrar nenhuma taxa além dos juros. Não é permitida a cobrança da Taxa de Abertura de Crédito (TAC) nem taxas administrativas, por exemplo, e as empresas são obrigadas a informar o Custo Efetivo Total (CET) do empréstimo no momento da contratação.
As empresas não podem oferecer ativamente o consignado para beneficiários do Auxílio Brasil, pois a portaria que regulamentou a linha de crédito proíbe qualquer atividade de marketing ativo, oferta comercial, proposta e publicidade direcionada a beneficiário específico ou qualquer tipo de atividade para convencê-lo a assinar os contratos de empréstimo consignado.
Elas também não podem dar prazo de carência para o beneficiário começar a pagar as parcelas, que começarão a ser descontadas do Auxílio Brasil logo após a aprovação do crédito e da liberação do dinheiro.
(Com Estadão Conteúdo)
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