CLT x “CLT Premium”: como surgiram os benefícios que criaram a nova categoria?

Trend que ganhou as redes tem base em mudanças nas leis trabalhistas e na necessidade de cuidar do bem-estar; entenda

Anna França

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Se você tem alguma rede social, já ouviu falar na mais nova trend sobre o funcionário “CLT Premium”. Mas o que você não sabe é que a brincadeira da internet tem como base duas mudanças cruciais ocorridas no mercado de trabalho desde 2017. Uma delas foi a reforma trabalhista de 2017 e a outra foi a pandemia, que obrigou muitos empregados a ficarem confinados em suas casas de um dia para outro.

A reforma abriu a possibilidade de o empregador pagar premiações ou benefícios aos funcionários, sem que isso se configurasse como um aumento de salário. Uma questão legal importante, uma vez que sobre o salário incide Imposto de Renda, além de todas as questões legais obrigatórias. Já sobre benefícios, há flexibilidade e toda uma possibilidade, inclusive, de se abater do IR da empresa, segundo advogados ouvidos pelo InfoMoney.

“Falar em prêmio e não em comissão é importante dentro do ponto de vista legal”, explica advogado Marcus Linhares. Segundo o especialista e coordenador da área trabalhista no escritório Nelson Wilians Advogados, a Consolidação das Leis Trabalhistas, mais conhecida pela sigla CLT, é um compilado das regras que regem as relações de trabalho há mais de 80 anos. Foi ela que estabeleceu coisas básicas como trabalho de 8 horas por dia, com intervalos de uma hora de almoço, por cinco dias por semana, incluindo o direito ao descanso semanal, férias, 13º salário entre outros.

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Por que “CLT Premium”?

O que os funcionários “CLT Premium” têm são benefícios extras, que vão bem além do básico vale refeição ou convênio médico, chegando a vales para academia de ginástica, incentivo para estudo como pagamento de pós-graduação, cursos de idiomas, acesso a psicólogo, entre outros profissionais.

“As empresas sempre tiveram cuidado com pagamentos de remunerações extras para que não configurassem aquilo como parte do salário. Além disso, se outro empregado na mesma função ganhasse menos, isso poderia servir para reclamações na Justiça do Trabalho”, explica Linhares.

Efeito pandemia

Por outro lado, a pandemia trouxe à tona uma questão importantíssima que as empresas sentiam, especialmente com as altas taxas de absenteísmo, mas passavam ao largo. A saúde mental dos funcionários e seu bem-estar começaram a ficar claros na medida em que a pessoa não saía mais de casa. Segundo especialistas de recursos humanos, o confinamento expôs problemas que já existiam, mas que ganharam maior importância dentro das novas circunstâncias de uma pandemia global.

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O home office expôs problemas que muitos viviam em suas casas e trouxe à tona a discussão sobre como as empresas tinham de pensar na qualidade de vida daquele indivíduo. Isso ajudou a mudar o perfil dos benefícios concedidos pelas companhias, que passaram a criar novas opções, desde verbas para montar o escritório em casa até fazer terapias, explica o CEO da Niky Benefícios Flexível, Elvis Tinti. “Somada à mudança criada pela pandemia, tivemos a entrada da nova geração no mercado de trabalho, ajudando a mudar mais ainda o cenário”, diz.

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O jogo virou

Neste cenário, ficou cada vez mais difícil atrair e, principalmente, reter talentos. O mercado em que antes as empresas selecionavam seus funcionários começou a mudar e as empresas passaram a assistir os candidatos selecionando onde queriam trabalhar. Tudo isso criou uma preocupação a mais para os departamentos de RHs das corporações, que tiveram de pensar em ferramentas que ajudasse não só a conquistar esse novos talentos. “Empresas de tecnologia já vinham mostrando que a preocupação com o ser humano era importante. Por isso, muitas criaram salas de descompressão e ambientes de escritórios mais confortáveis”, conta a recrutadora Maria Eduarda Silveira.

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Sócia-fundadora da Bold HRO, consultoria de recrutamento especializado e desenvolvimento organizacional, ela diz que as startups também estabeleceram um novo padrão, garantindo maior flexibilidade, o que chamou atenção das novas gerações. Muitos preferiam ganhar menos em um lugar com ambiente mais saudável e com benefícios extras fora do tradicional. “Isso mostrou que o salário está entre o benefício tangível, mas o intangível incluía essa flexibilidade, relações mais saudáveis e ambientes descontraídos”, explica Maria Eduarda.

O pessoal mais antigo já estava acostumado ao básico, mas o pessoal de 25 anos ou mais, a chamada geração Z, é mais exigente a diferenciais nos benefícios corporativos, disse Bruno Carone, CEO e fundador da Férias & Co., empresa criada justamente pelo interesse das empresas em oferecer benefícios diferenciados. “E viajar está entre os benefícios mais procurados pelas novas gerações”, diz o executivo.

É aí que nasce a trend da internet, que vem justamente porque a geração Z, que é muito conectada e usa essas ferramentas para explorar questões sociais, expôs as questões. Os benefícios, assim, se tornam parte de um “pacote remuneratório” que ajuda a conquistar esses jovens, segundo o diretor executivo da Croma Consultoria de Recursos Humanos, Camilo Zanette. “Quando uma empresa contrata uma pessoa e paga salário, ela tem um alta carga tributária, mas quando consegue oferecer mais, mas em forma de benefícios, ela aumenta o pacote de remuneração para o funcionário e reduz sua carga. Assim todos ganham”, diz.

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Realidade para poucos

A única questão é que essa realidade dos “CLTs Premium” ainda é para poucos, por isso os vídeos virais dão a sensação de exclusividade e ostentação. De acordo com Elvis Tinti, a tendência, no entanto, é que isso cresça também para o interior do país. “As mudanças sempre começam nos grandes centros e depois se expandem. Foi assim quando as empresas começaram a conceder vale refeição ou convênio médico, mas hoje isso está em todo o país”, explica o CEO da Niky, empresa especializada em benefícios flexíveis, que incluem descontos não apenas em serviços de saúde e alimentação, como de bem-estar como vales para farmácia, academia, cultura, consultas de telemedicina, exames e até combustível. “Estamos incluindo agora o crédito consignado, que inclui educação financeira.” Hoje a Niky já conta com 50 mil vidas e espera encerrar o ano com 100 mil.  “Nossa ideia é ir além das commodities dos pagamentos. E o colaborador reconhece quando a empresa concede algo que está além do obrigatório”, afirma.

Não só reconhece, como faz o marketing do empregador de graça, como está ocorrendo hoje nas redes sociais, brinca Zanette. “No final, as empresas oferecem mais, conquistam seus funcionários, que vestem a camisa e ainda fazem o marketing de graça para a empresa, reforçando sua marca no mercado. E todo mundo fica feliz”, acrescenta.  

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Anna França

Jornalista especializada em economia e finanças. Foi editora de Negócios e Legislação no DCI, subeditora de indústria na Gazeta Mercantil e repórter de finanças e agronegócios na revista Dinheiro