Canadá busca mais de 400 mil novos residentes: como funciona a imigração e o que fazer para se mudar para lá?

Salário mínimo canadense é pago por hora, mas na média, por mês gira em torno de 2 mil dólares canadenses, cerca de R$ 8,3 mil

Giovanna Sutto

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SÃO PAULO – O governo canadense vem incentivando cada vez mais a entrada de imigrantes no país. Com o avanço da pandemia, ele ampliou a meta de aumentar a população imigrante nos próximos três anos: o plano é receber 401 mil novos residentes permanentes aprovados em 2021, 411 mil em 2022 e 421 mil em 2023. Totalizando pouco mais de 1,2 milhão de pessoas estrangeiras. 

Para 2021, as admissões começaram em 6 de maio e vão até 5 de novembro, de acordo com o governo canadense. Aproveitando essa oportunidade, Humberto Andrade, gerente de TI que mora em Goiânia, conta que deu início ao processo de imigração.

“Eu quero ir para o Canadá porque quero uma melhor qualidade de vida para os meus filhos e minha família. Acho que terei mais segurança, além do salário ser maior do que eu vou conseguir aqui”, afirma.

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O salário mínimo do Canadá é pago por hora, mas na média, por mês gira em torno de 2 mil dólares canadenses, cerca de R$ 8,3 mil na província de Nova Escócia, um dos locais para os quais Humberto considera a mudança. Os valores variam um pouco de província para província, podendo chegar em cerca de R$ 10 mil por mês em alguns locais como na região de Ontário, cuja capital é Toronto.

Assim como Andrade, milhares de pessoas buscam o Canadá para ter melhores condições de vida. E os números mostram que o número de imigrantes vem crescendo e representa uma parte importante da economia do país.

Segundo dados do governo canadense, em 2019, imigrantes foram responsáveis por 80% do crescimento da população.

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Em 2018, cerca de 320 mil pessoas receberam o direito de moradia permanente no Canadá. Já em 2019, o número aumentou para 341,1 mil imigrantes. No ano passado, a expectativa era de que mais 341 mil pessoas se tornassem residentes permanentes, mas com a pandemia e redirecionamento de prioridades, o número não foi atingido – o que fez o governo canadense aumentar o patamar de aprovações para os próximos anos.

Pensando na janela de oportunidade que o governo do Canadá está oferecendo, o InfoMoney conversou com especialistas em imigração para entender como funciona o processo de embarque para o Canadá, vantagens e desvantagens. Confira.

Por que o Canadá quer atrair mais imigrantes?

Embora o Canadá seja o segundo maior país em extensão territorial do mundo, ficando atrás apenas da Rússia, possui apenas 38 milhões de habitantes, ou seja, menos do que a quantidade de pessoas que vive no estado São Paulo – que, segundo dados do Seade (Sistema Estadual de Análise de Dados), possui cerca de 45 milhões de habitantes.

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“É um processo histórico e demográfico. Basicamente falta gente para manter a economia girando em um país tão grande. Como consequência, há um déficit de mão-de-obra. Soma-se a isso, o envelhecimento da população que reduz a quantidade de pessoas em idade para trabalhar”, explica Leonardo Freitas, especialista em imigração e sócio fundador da Hayman-Woodward.

Em seu site, o governo federal do Canadá reforça a importância dos estrangeiros para o seu desenvolvimento.

“A imigração é um meio de apoiar o crescimento populacional, econômico e cultural do Canadá. Milhões de pessoas qualificadas em todo o mundo optaram por residir no Canadá. Quer esteja buscando melhores oportunidades econômicas, reunindo-se com membros da família ou buscando proteção como refugiados reassentados ou outras pessoas protegidas, os recém-chegados ao Canadá têm sido uma importante fonte de crescimento contínuo e prosperidade”, diz o texto.

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Diante da pandemia, porém, como grande parte dos países ao redor do mundo, o Canadá enfrentou momento difíceis na economia: a taxa de desemprego fechou o ano em 9,5% – a maior desde 1996, e chegou a bater 13,7% em maio do ano passado – maior patamar da série histórica iniciada em 1976, de acordo com os dados do governo.

Ainda, o país sofreu uma queda de 5,3% no PIB em 2020 e teve seu maior déficit orçamentário desde a Segunda Guerra Mundial diante dos gastos extras para tentar conter a pandemia.

Dados da Universidade John Hopkins mostram que até o último dia 30 de junho, foram 1,42 milhão de casos de Covid-19 registrados no país e 26.246 mortes.

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Como resultado da pandemia, a prioridade do governo canadense em termos de atração de novos imigrantes foi centralizada em preencher ocupações essenciais – como os profissionais da área da saúde, como médicos, enfermeiros, fisioterapeutas, e de bem-estar, como psicólogos, entre outros.

“Durante a pandemia global Covid-19, há uma necessidade crescente de garantir que o Canadá tenha a força de trabalho necessária para apoiar a saúde e o bem-estar dos indivíduos, bem como a recuperação econômica”, diz o site do governo federal canadense.

Passado um ano e meio desde que a pandemia teve início, o Canadá aposta no fluxo de estrangeiros de diversas ocupações para sair da crise gerada pela pandemia do novo coronavírus.

Por isso, o governo quer aumentar de forma significativa o número de novos residentes estrangeiros, além de conceder mais vistos permanentes.

“A imigração continuará a ser um fator-chave no avanço da economia do Canadá, especialmente no contexto de baixas taxas de natalidade e seu papel vital no crescimento da população em idade ativa, e assim permanecerá no futuro. No início de 2030, espera-se que o crescimento populacional do Canadá dependa exclusivamente da imigração”, diz o governo canadense em seu site.

Mas se a situação parece favorável e você ficou interessado, afinal, como funciona todo o processo?

Como funciona a imigração?

Primeiro, é preciso entender que há alguns tipos de vistos, como o temporário e o de residência permanente.

Há vários tipos de vistos temporários a depender dos motivos que levam a pessoa ao Canadá, por exemplo: o visto de turista, o de estudante, o de profissionais que vão ficar por um período determinado no Canadá, entre outros.

Geralmente, esse visto permite a permanência de até seis meses no país, podendo ser renovado a depender do objetivo da pessoa, conforme indica o site do governo canadense.

Já o visto de residência permanente é o que vai permitir que a pessoa more e viva no Canadá de fato, sem ser no caráter temporário. Entre os benefícios estão a permissão de trabalhar no país, acesso ao sistema de saúde, e a possibilidade de se tornar um cidadão canadense.

Nesse contexto, há diversos programas passíveis de aplicação. Na prática, o brasileiro não precisa estar no Canadá para conseguir essa permissão.

“É possível já sair do Brasil com a residência permanente”, diz Braun. Andrade, por exemplo, que pretende ir com a família de quatro pessoas, quer tirar a residência permanente estando no Brasil e somente depois se mudar para o Canadá.

Em relação a Cidadania, porém, é necessário ter um visto de residência permanente e ficar fisicamente no país por no mínimo 1.095 dias dos últimos cinco anos, idioma fluente (inglês ou francês), além de uma série de documentações, como ter declarado imposto de renda também em três dos últimos cinco anos, entre outros, conforme explica Freitas, da Hayman-Woodward.

O Canadá tem programas no âmbito federal e também no provincial, que funciona como se fosse o nível estadual aqui no Brasil.

“O país de maneira geral facilita a entrada de jovens formados, se a pessoa tiver uma oferta de emprego de uma empresa que está no Canadá o processo pode ser ainda mais ágil”, explica Daniel Braun, presidente da Cebrusa Northgate, agência de imigração especializada no Canadá.

Segundo ele, experiência profissional e inglês e/ou francês fluente também são peças importantes que podem ajudar o brasileiro a conseguir um visto de residência permanente.

Porém, ele ressalta que não há impedimento caso a pessoa não tenha experiência ou idioma. “Tudo depende do perfil da pessoa. O processo pode ser mais ou menos burocrático, mas há tantos programas que basta fazer uma boa análise para entender qual é a melhor opção para você”, diz.

Tipos de programas

O Canadá possui mais de 60 programas de imigração, com diversos público-alvos e perfis de profissionais e talentos que quer atrair. No site do governo canadense há mais detalhes sobre as  categorias de programas possíveis.

O InfoMoney conversou com especialistas e separou os principais pontos informados no site do governo canadense para entender quais os programas mais populares de imigração e quais podem ser boas opções para brasileiros.

O programa Express Entry é um dos mais famosos em relação a residência permanente e, segundo o governo canadense, um dos mais ágeis em termos de documentação. Segundo Freitas, por meio do Express Entry, é possível embarcar para o Canadá já aprovado em cerca de seis meses – em alguns programas a burocracia pode levar mais de um ano e meio.

Dentro dessa categoria, há alguns tipos de programas que podem ser federais ou provinciais, e a pessoa pode escolher qual vai prestar.

Na prática, todo o processo e preenchimento dos formulários podem ser feitos online e seguem o mesmo padrão.

De acordo com o site do governo, o passo a passo funciona em quatro passos principais:

1.Testes de elegibilidade: o próprio site disponibiliza um teste para que as pessoas façam testes e entendam se possuem os requisitos mínimos para se eleger ou não ao processo.

2.Prepare os documentos: é necessário separar uma série de documentos, como testes de proficiência de língua, comprovante de renda, passaporte válido, comprovantes de formação de ensino superior, exame médico, certidão de casamento, se tiver, entre outros.

3.Dê entrada no processo: depois de separar a documentação, você pode se candidatar ao processo e submeter seu perfil ao governo canadense para análise; se você for aceito vai entrar no que eles chama de pool de candidatos, que é uma lista com todos os candidatos e seu perfil vai receber uma pontuação.

Cada categoria como educação, idade, proficiência no idioma, experiência de trabalho, habilidades, etc tem um sistema padrão de pontos. Por exemplo, o sistema de pontuação de idade vai de 0 a 100 pontos, o de educação até 140 pontos.

4.  Receba o convite para aplicar para ser um residente: o governo vai enviar convites para os candidatos de maior pontuação na lista e a partir desse convite a pessoa tem 90 dias para fazer a aplicação para a residência permanente. Essa etapa exige preenchimentos de mais formulários, além de pagamento de algumas taxas.

Os custos das taxas são de 1.325 dólares canadenses (cerca R$ 5,3 mil) para o aplicante; mais 1.325 dólares canadenses pelo cônjuge e mais 225 dólares canadenses (cerca de R$ 900) por filho de até 22 anos.

Há outras taxas ainda, como a de processamento, que gira em torno de 825 dólares canadenses (cerca de R$ 3,3 mil), e a taxa de residência permanente paga durante o processo de obtenção do visto que é de 500 dólares canadenses (cerca de $ 2 mil) por adultos (acima de 22 anos).

“Há várias formas de pontuar nesse sistema. Pessoas que se destacam têm: fluência em inglês ou francês, geralmente já têm ofertas de trabalho no Canadá – mesmo se ainda não aceitaram, só de terem recebido já podem usar como argumento, nível de educação alto impulsiona ainda mais porque eles querem profissionais qualificados, então, graduação tem uma pontuação, menor que a de pós-graduação e mestrado, por exemplo”, conta Freitas.

Além disso, a idade é um fator importante nesse processo. Pessoas que possuem entre 20 e 29 anos possuem pontuação máxima no critério idade, depois disso os pontos são menores. “Eles estão buscando mão-de-obra jovem”, diz Freitas. Mas não significa que não seja possível imigrar sendo mais velho que isso.

Andrade conta que com 48 anos está aplicando para um outro programa, diferente do Express Entry.  Embora o governo canadense não especifique qual a nota correspondente a cada faixa etária depois dos 30 anos, ele explicou que a pontuação ia ser baixa. “Não valia a pena, ia afetar minha avaliação final e eu tentei buscar um programa que tenho mais chance de ser aprovado”, diz.

Os programas provinciais buscam candidatos com as habilidades específicas exigidas por suas economias locais. As pessoas podem dar entrada pelo Express Entry ou diretamente nas páginas das províncias por meio de processo mais burocrático em papel. Como vai funcionar essa aplicação vai depender do local que a pessoa escolher. Vale lembrar que todo processo PNP também vai para a esfera federal, portanto, as taxas obrigatórias são similares.

O passo a passo online é similar ao Express Entry citado acima.

De qualquer maneira, a pessoa precisa atender aos requisitos de elegibilidade da província ou território e ter um perfil elegível, conforme as regras do Express Entry.

Segundo Freitas, esse tipo de aplicação leva entre 12 e 20 meses de processamento até a aprovação.

O programa para as Províncias do Atlântico é específico para quatro localidades: Novo Brunswick, Ilha do Príncipe Eduardo, Nova Escócia e Terra Nova e Labrador.

Programa mais recente, lançado em 2017, não funciona pelo sistema de pontos, mas também é online. E não exige menos papeladas: é necessário mostrar comprovante de renda, de educação, proficiência no inglês e permissão de trabalho e/ou estudo. Há três programas possíveis dentro dessa categoria. Há taxas inclusas para processamento e documentação.

É neste programa que Andrade se inscreveu, por exemplo. É focado em estudantes e profissionais que queiram morar na região.

“Como minha idade já não é ideal para o Express Entry estou aguardando uma oferta de trabalho. Já fiz algumas entrevistas com empresas que estão no Canadá e pretendo dar andamento no processo assim que receber uma proposta”, afirma.

Esse programa tem como foco empreendedores que querem desenvolver seus negócios no Canadá. “São as incubadoras do país com interesse em apostar em negócios promissores. Eles são a oportunidade de negócio, e o interessado precisa apresentar o plano de negócio, mostrar que vai trazer empregos e competitividade para o país”, explica Freitas.

O tempo de processamento até a aprovação leva na média 16 meses. As taxas partem de 2.075 dólares (cerca de R$ 8,3 mil) canadenses por aplicante. Nesse programa, a empresa do aplicante recebe investimentos de fundos de venture capital, investidores anjos e incubadoras interessados no negocio.

Nesse caso também é exigido comprovante de renda, proficiência no idioma, além de preenchimento de formulários para fazer a aplicação.

Esse programa é da província de Quebec e feito especificamente para os interessados em morar lá. “Como Quebec é o principal reduto que fala francês a ideia é manter essa tradição, por isso, falar o idioma é requisito”, explica Freitas.

O prazo de aprovação varia entre 15 e 17 meses e tem uma taxa de 1.325 dólares canadenses para o aplicante e taxas extras para cônjuges de 825 dólares canadenses (cerca de R$ 3,3 mil) e 225 por filho. Ainda é preciso pagar uma taxa extra de residência permanente de 500 dólares canadenses (cerca de R$ 2 mil) por pessoa. Há outras taxas inclusas para processamento e documentação.

Em todos os casos citados há a necessidade de toda documentação estar em inglês via tradução juramentada – que também tem custos para ser feita. Nesse caso da imigração via Quebec, é necessário estar traduzida também em francês.

Caminhos alternativos

Além desses programas, que permitem a residência permanente, se a pessoa for aprovada, há alguns caminhos possíveis que podem abrir portas para tirar a residência permanente depois de um período.

Por exemplo, há vistos de estudo, que permitem que a pessoa faça uma universidade, pós-graduação, mestrado ou doutorado, além das permissões de trabalho quando as empresas arcam com os custos para trazer o profissional.

“Esses não são vistos de residentes permanentes, mas já estando lá é possível dar entrada para se tornar residente também. Não é mais fácil, os processos são os mesmos, mas são outros caminhos possíveis”, afirma Braun.

Ainda, Freitas lembra que há programas específicos para atletas e artistas, e mesmo para profissionais como babás e cuidadores de idosos.

Alertas para os brasileiros

Apesar das oportunidades, o brasileiro também precisa ter atenção. “É preciso um planejamento para fazer a mudança, há muitos programas que são para morar na parte norte do Canadá, por exemplo, onde há muito menos pessoas e é ainda mais frio. Nem sempre a adaptação é fácil, fora os custos”, alerta Dilmeire Vosgerau, professora da pós-graduação da PUC-PR, especialista em imigração.

Vale lembrar que existem agências especializadas em imigração com consultores regulamentados pelo governo canadense, caso a pessoa não se sinta segura em fazer o processo todo sozinha.

“Minha sugestão é que ao analisar as possiblidades, o candidato não saia tomando decisões aleatórias sem antes entender seu perfil. São muitas variáveis que influenciam e há diversas oportunidades, nem sempre é fácil fazer tudo sozinho”, diz Braun.

De fato, o processo não é exatamente simples. Suzan Pause é brasileira, de Porto Alegre, e já mora no Canadá há dois anos, mas ainda sem a residência permanente. Em 2019, ela tirou o visto de permissão de trabalho, que venceu durante a pandemia.

“Eu trabalhava em uma escola em Montreal, que faliu durante a pandemia. Como na época meu visto estava regularizado, ganhei o auxílio financeiro do governo canadense. Mas meses depois meu visto venceu. E dei entrada em um novo visto de estudante para continuar morando aqui. Agora, estou no início do processo para conseguir a residência permanente. Mas não é simples”, conta.

Segundo ela, há algumas dificuldades em relação à cultura e carreira. “No geral, os canadenses são receptivos, mas em Quebec senti uma distância maior. Morei em Toronto como turista alguns meses e senti diferença quando me mudei para cá. Talvez porque eu não falava francês. Quando fui aprendendo e tentando mais eles se abriam mais e ajudavam”, diz.

“Avançar na carreira nem sempre é simples também. Vai exigir muita dedicação e esforço: melhorar o inglês ou francês, fazer um perfil no LinkedIn super completo e fazer conexões com pessoas, o networking faz diferença. Além disso, fazer cursos, fazer equivalência dos certificados no Brasil e mesmo assim algumas pessoas trabalham em serviços que no Brasil são considerados de base como construção. Mas como o salário é bom, muitas pessoas ficam e nem usam os diplomas que já têm”, conta.

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Giovanna Sutto

Jornalista com mais de 6 anos de experiência na cobertura de finanças pessoais, meios de pagamentos, economia e carreira. Formada pela Cásper Líbero com pós-graduação pelo Ibmec.