Bets: com salários altos, empresas tentam driblar “má fama” e gap de profissionais

Especialistas ouvidos pelo Infomoney reconhecem potencial do mercado de bets, mas afirmam dificuldades no recrutamento de profissionais para o segmento

Maira Escardovelli

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Apesar de estar envolvido em inúmeras polêmicas, com os casos da influenciadora Deolane Bezerra e do cantor Gusttavo Lima em ações contra lavagem de dinheiro e jogos ilegais, o setor de bets no Brasil está recrutando cada vez mais profissionais para as operações regulamentadas, que entrarão em pleno funcionamento a partir de janeiro de 2025.

Especialistas do segmento ouvidos pelo Infomoney estimam que cada empresa que irá operar regulamentada deverá ter entre 80 a 150 profissionais diretos e indiretos, contabilizando departamentos já comuns da área de apostas, como marketing, trader (geralmente estatísticos, que determinam a cotação das apostas), tecnologia e atendimento, além de novos canais criados devido à legislação, como setores de proteção à lavagem de dinheiro, fiscalização contra fraude e combate ao terrorismo.

Fabricio Murakami, CMO da Pay4Fun, fintech de meios de pagamento, prevê, inclusive, que o Brasil será “um grande celeiro de formação de profissionais para América Latina”. Em relação aos altos cargos de direção das empresas, Murakami aponta a vinda de executivos de outros países que precisarão se adaptar sobretudo às especificidades do mercado brasileiro, relacionadas ao comportamento do jogador e à máquina tributária do país.

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“Os executivos estrangeiros estão habituados com o mercado que é desenvolvido. Então, atuar em países da América Latina, em especial no Brasil, passa a ser um desafio grande. Vai acontecer uma formação em massa de profissionais desse setor, e com grandes possibilidades inclusive de exportar talentos, até pelo tamanho do mercado nacional”, detalha Fabricio.

Nova onda de contrações

Para Lucas Papa, gerente-executivo da Michael Page, as contratações de profissionais terão um segundo pico no início de 2025, quando houver a formalização do segmento, inclusive no aspecto tributário e em relação às possíveis aquisições.

Segundo o especialista, no primeiro trimestre de 2024, as empresas recrutaram colaboradores que não eram propriamente do setor de bets, mas de mercados de entretenimento, de internet e de marketing. Conforme os dados mais recentes, só em maio, a consultoria calculou um aumento de 37% na procura por profissionais para o segmento.

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“No early stage das empresas usou-se muito a mão de obra de fora. Nesse cenário, não era necessário trazer [o profissional] fisicamente para o Brasil. A tendência é o oposto agora — é realmente empregar os profissionais daqui”, detalha Lucas.

De acordo com Lucas Nogueira, diretor regional da Robert Half, hoje as empresas estão vindo para o Brasil primeiro como operação pequena. “Montam o time comercial, jurídico, marketing, um pouco do desenvolvedor para ‘tropicalizar’ os sistemas. Mas as grandes concentrações desses profissionais ainda não estão no Brasil, porque essas empresas utilizam o CSC (Centro de Serviços Compartilhados), estabelecido em outros países do Leste Europeu e América Central”.

O gerente-executivo da Michel Page aponta, ainda, para uma nova posição no mercado, ligada à formação de conselho para as bets. Segundo ele, o cargo, que pode ter variação de nome, tem como função “transitar em Brasília, para conseguir entender qual vai ser o formato e qual a melhor maneira de operação”, explica.

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“Alguém que consiga encabeçar pautas lá em Brasília, como parte do Conselho da empresa que quer vir para o Brasil também uma tendência”, afirma.

Salários inflacionados e dificuldade na atração

Mesmo com a alta demanda e o potencial de capital como atrativo, as empresas de recrutamento têm notado certa resistência dos trabalhadores para ingressar no mercado de bets, frequentemente associado às fraudes e à dependência ou ludopatia. No último dia 17, o Ministro Fernando Haddad afirmou que há “uma pandemia que está instalada no País”, quando questionado sobre o vício em jogos de apostas.

A saída para driblar esse cenário, tem sido, entre outras medidas melhoras as propostas financeiras. Nogueira, da Robert Half, afirma que observa “uma inflação salarial, com companhias oferecendo aumentos superiores a 50% em determinados cargos”. Pelo mercado ainda incipiente, nesse momento é uma percepção mais generalizada, sem direcionar aumentos para cargos específicos.

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“Não é específico para uma ou outra posição. Existem cargos, por exemplo de desenvolvedor ou de trader, que vemos salários 50% até 60% maiores. Posições de analistas que antigamente pagava R$ 4 mil ou R$ 5 mil, hoje pagam quase R$ 10 mil”, afirma Nogueira.

Apesar de o pacote de remuneração ser uma ferramenta de atração, o maior desafio deste segmento ainda é cultural, o que reflete na dificuldade de contratação.

Papa, da Michael Page, destaca uma grande a dificuldade na contratação de vagas para a área jurídica, de compliance e de governança. Já para as posições de marketing e para a área digital, há mais facilidade de encontrar profissionais.

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O receio dos profissionais é observado no recrutamento, principalmente no setor bancário e de tecnologia, que são segmentos mais tradicionais, avalia Nogueira, da Robert Half. Por mais que a regulamentação esteja em andamento e a atividade já seja legalizada no país, há também um nível de fraude muito alto associado ao segmento. “A maior barreira neste momento não é a questão salarial, porque as empresas até pagam um pouco mais. É a questão cultural quando se trata de trabalhar no setor”, afirma o diretor.

Cenário de apostas no Brasil

Em 2023, os brasileiros gastaram entre R$ 100 bilhões e R$ 120 bilhões nas populares bets, de acordo com o relatório da XP Investimentos. O documento aponta também que o mercado do Brasil tem aparecido como mais lucrativo do que o estadunidense: no país, as plataformas rentabilizaram 13% do total de apostas, com faturamento de cerca de R$ 13 bilhões, enquanto nos EUA o lucro das empresas foi 7% do total.

Dados publicados pelo Banco Central nesta semana mostram um contexto chocante no Brasil: somente em agosto de 2024, 5 milhões de pessoas pertencentes a famílias beneficiárias do Bolsa Família enviaram R$ 3 bilhões para empresas de apostas via Pix.

Com a regulamentação do setor, a tendência é que os números se tornem ainda maiores — o Ministério da Fazenda já divulgou projeções que consideram uma arrecadação de até R$ 12 bilhões por ano. Só com os valores das outorgas concedidas para funcionamento (cada companhia deve pagar R$ 30 milhões pelo pedido) já se tem a expectativa de quase R$ 4 bilhões para os cofres públicos.

“Hoje o Brasil se posiciona como o terceiro maior mercado do mundo, e já vemos uma movimentação gigante das empresas procurando profissionais dentro desse setor, que é relativamente muito novo aqui no no país. Não temos mão de obra que atenda desse mercado por enquanto, que é muito peculiar. Ele é fomentado já em países europeus e nos Estados Unidos, mas, aqui, ainda é embrionário. Existe uma lacuna de profissionais e eles terão de ser formados”, afirma Fabricio.

No Brasil, o setor de apostas esportivas foi autorizado em 2018, com a assinatura da Lei nº 13.756, e empresas do segmento se espalharam pelo país. O crescimento maior, no entanto, foi observado durante a pandemia e a Copa do Mundo de 2022. Segundo estudo da empresa Hibou, 68% da população nacional aposta atualmente em algum tipo de jogo de azar. A participação nas bets é escolhida por 11% das pessoas, os casinos on-line ficam com 8%.

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