Atualização de valor de imóveis é desaconselhada por tributaristas: ‘Pegadinha’

Medida que passou a valer em setembro não convenceu advogados especializados, que desaconselham adoção da novidade

Anna França

(Foto: Pixabay)
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A perspectiva era boa: reduzir o valor do imposto na hora de negociar imóveis. Mas, na prática, a atualização dos imóveis para valor de mercado na Receita Federal, permitida pela Lei 14.973/24, acabou não convencendo os tributaristas, que desaconselham os proprietários a fazer a mudança – especialmente quem pensa em vender o imóvel no curto prazo.

Sancionada no final de setembro, a nova regra permite à pessoa física atualizar o valor dos seus bens imóveis para o valor de mercado e reduzir o famoso “ganho de capital” na hora da venda. Assim, a alíquota do imposto cobrado de pessoas físicas cairia dos 15%  para 4% e, para pessoas jurídicas, iria a 6% e 4%, referente à Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL).

A atualização é voluntária e pode ser feita no prazo de 90 dias a contar da publicação da lei, até 16 de dezembro. O valor atualizado dos imóveis será considerado como acréscimo patrimonial e, nas futuras vendas, os contribuintes poderão usar esse novo valor como base de cálculo para o imposto.

Cuidado com a pegadinha

Segundo o advogado Caio Ruotolo, sócio da área Tributária do escritório Silveira Advogados, num primeiro momento a medida aparenta ser uma excelente oportunidade para proprietários de imóveis, pois além de atualizar o valor que está lançado na sua declaração de Imposto de Renda ele pagaria só 4% de IR sobre o ganho de capital, ao invés das alíquotas da regra geral de 15%, que incidem quando se vende um imóvel.

“Todavia, existe uma pegadinha na norma, pois se o imóvel for vendido nos próximos 36 meses (após a atualização), o contribuinte terá de pagar uma complementação do imposto. Ou seja, tanto para a pessoa física como para a jurídica que tenham a intenção de vender o imóvel no curto prazo não será vantajoso, pois se vender em até três anos, pagará os 4% agora e os 15% sobre o ganho de capital na próxima declaração do IRPF, totalizando 19% de alíquota definitiva. Uma péssima escolha”, explica ele.

Mesmo em casos de venda após esse prazo, ainda haverá complementação da tributação, pois estão previstas 14 faixas percentuais, que aumentam a depender do tempo em que o bem não é alienado.

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Isso ocorre porque, na realidade, essa medida visa aumentar a arrecadação ao estimular a regularização de bens não atualizados no patrimônio. No entanto, traz limitações para que os contribuintes possam se beneficiar plenamente dessa reavaliação, pois somente após 15 anos é que o benefício seria integral, de acordo com Ruotolo. “Nesse período, muitas leis podem ser alteradas e podem acontecer mudanças no mercado imobiliário e até nas normas de zoneamento, impactando diretamente no valor dos imóveis”, explica.

Ele frisa, porém, que já existe lei que permite a redução da base de cálculo do tributo pelo tempo em que a titularidade do imóvel é inalterada, no artigo 40 da Lei nº 11.196, de 2005, e artigo 18 da Lei nº 7.713, de 1988. “Além disso, a legislação antiga também traz a possibilidade de não pagar IR sobre o ganho de capital, se o intervalo entre a venda e a compra de outro imóvel for dentro de 6 meses”.

O advogado e fundador da Larafy Contabilidade, Waldir de Lara, confirma que, embora a Instrução Normativa RFB nº 2222/2024 possa ser vista como uma forma benéfica de atualizar o valor de mercado dos imóveis, é importante avaliar se essa opção realmente traz benefícios a longo prazo.

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“A promessa de antecipar tributos com alíquotas menores deve ser observada com cautela, pois o contribuinte pode ser penalizado depois, uma vez que o mercado imobiliário é altamente volátil, e a liquidez de um bem nem sempre está garantida.”

Segundo o advogado Georgios Anastassiadis, sócio do Gaia Silva Gaede Advogados, por todas essas questões, a medida adotada pelo governo deve ter um impacto limitado no mercado. “Pelas condições exigidas, nem todos os proprietários serão beneficiados.”

Como fazer a atualização do valor do imóvel

Interessados em atualizar o valor de um imóvel perante à Receita Federal devem apresentar a Declaração de Opção pela Atualização de Bens Imóveis (Dabim). O documento está disponível no Centro Virtual de Atendimento (e-CAC), no site da Receita Federal.

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Pessoas físicas que optarem pela atualização do valor dos imóveis declarados na Declaração de Ajuste Anual pagarão uma alíquota definitiva de 4% de IRPF sobre a diferença. As alíquotas, sem redução, variam de 15% a 22,5%, de acordo com a Receita.

Anna França

Jornalista especializada em economia e finanças. Foi editora de Negócios e Legislação no DCI, subeditora de indústria na Gazeta Mercantil e repórter de finanças e agronegócios na revista Dinheiro