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SÃO PAULO — A pandemia interrompeu uma retomada do mercado imobiliário que acontecia desde 2019 — e muito aguardada pelo setor, após cinco anos de recessão. Mas não demorou para a crise na saúde ser contornada pelo setor de imóveis.
Depois de uma queda na comercialização de casas e apartamentos entre o final de março e abril deste ano, as vendas começaram a se recuperar em maio. Para os especialistas ouvidos pelo InfoMoney, um cenário realmente favorável se viu de julho em diante. Agosto bombou e setembro teve um resultado forte, ainda que o mês anterior tenha absorvido mais a demanda reprimida pela pandemia.
Mas quem está por trás das chaves compradas mesmo em tempos de pandemia — os que querem morar ou os que querem investir? Segundo o último levantamento divulgado pelo Fipe/Zap, que mostra o comportamento do setor imobiliário no segundo trimestre de 2020, a maioria continua comprando para moradia (58%).
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Mesmo assim, os investidores são parte bem relevante (42%). O percentual de compras para investimento já oscilou entre 31% e 53% ao longo das pesquisas do grupo – que começou a mapear o perfil dos usuários do portal de classificados imobiliários Zap em 2014 – e atingiu o menor patamar histórico em maio de 2019.
Desde então, a parcela de compras classificadas como investimento foi se ampliando e ficou em 44% no primeiro trimestre de 2020. No segundo trimestre do ano, houve um leve recuo para 42%, mas ainda assim um percentual que mostra um apetite maior dos investidores em relação a uma boa parte dos anos de 2018 e 2019.
Os objetivos dos investidores permaneceram os mesmos ao longo dos anos estudados pelo Fipe/Zap: obter renda com aluguel (entre 60 e 63% dos entrevistados) e revender no futuro (entre 37% e 40% dos entrevistados).
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Por que moradores e investidores estão comprando agora?
A grande explosão de comercializações veio logo depois do segundo trimestre de 2020, em agosto – pelo menos na cidade de São Paulo. Foram 6.350 unidades residenciais vendidas, 46,3% a mais do que em julho e 35% a mais do que em agosto do ano passado, mostra o Sindicato da Habitação de São Paulo (Secovi-SP). É a maior comercialização de agosto da série histórica, iniciada em 2004.
Setembro também foi um mês forte para o setor, ainda que não tanto quanto o anterior. A comercialização atingiu 5.147 unidades, 18,9% a menos que agosto, mas uma alta de 19,2% em relação a setembro do ano passado.
Mesmo assim, o volume de vendas deve encerrar o ano em patamares similares ou um pouco menores do que 2019.
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“Tivemos uma recessão séria entre 2014 e 2018. Mas as pessoas não deixaram de querer um imóvel, o que levou a lançamentos e vendas excepcionais em 2019. A gente achava que 2020 poderia até ganhar de 2019, mas a pandemia fechou os estandes e todo mundo voltou a ficar preocupado com o futuro”, diz Emílio Kallas, vice-presidente de Incorporação e Terrenos Urbanos do Secovi-SP. “Em abril, as vendas representaram 35% do que antigamente esperávamos. Em maio, 51%. Junho, 70%. A corrida pela compra começou mesmo em julho.”
Diversos fatores explicam essa vontade de comprar propriedades mesmo durante uma pandemia. Kallas afirma que parte do movimento ainda vem de uma demanda reprimida entre 2014 e 2018.
Pedro de Seixas Corrêa, coordenador acadêmico do MBA em Gestão de Negócios de Incorporação e Construção Imobiliária da Fundação Getúlio Vargas (FGV), também considera que muitos moradores recentemente passaram a buscar moradias com mais espaço, mesmo que em detrimento da localização, o que movimentou o mercado.
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Em reportagem anterior, o InfoMoney já abordou especificamente essa questão, ao mostrar que com o isolamento social e a ampla adoção do home office, a relação das pessoas com suas casas foi fortalecida, provocando uma mudança no perfil dos imóveis buscados.
Mas o principal componente destacado pelos especialistas ouvidos pelo InfoMoney foi a forte queda da taxa básica de juros, a Selic, que de agosto de 2019 a agosto de 2020 teve nove quedas seguidas, passando de 6,5% ao ano para os atuais 2% ao ano.
O menor nível histórico da taxa básica de juros permitiu uma redução das taxas cobradas nos financiamentos imobiliários. “Há uma redução do custo final do imóvel quando os juros do financiamento caem, especialmente nos prazos mais longos. Para as famílias, o que importa é o valor final da parcela”, afirma Corrêa.
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A Selic também mexe com os investimentos. A atual taxa de juros leva a uma rentabilidade real que pode ser negativa nas aplicações de renda fixa, se contarmos a inflação medida pelo IPCA e a cobrança do Imposto de Renda. Já na renda variável, o câmbio desfavorável se une à volatilidade do mercado de capitais, que se acentua em períodos de incerteza, como o atual.
Nesse cenário, os imóveis se apresentaram como uma alternativa capaz de superar a rentabilidade da renda fixa mas, ao mesmo tempo, com menor risco do que as ações.
“Este foi um ano bom para mostrar como o imóvel pode ser um porto seguro. Como investimento de segurança, absorve melhor momentos de recessão sem necessariamente perder seu valor de mercado. Por outro lado, tem menos liquidez do que as outras aplicações financeiras”, diz Corrêa. “Tijolo é uma moeda forte. O investidor sabe que o apartamento está ali e é raridade perder dinheiro. Quando você inaugura um prédio, o terreno ao lado já se valoriza”, completa Kallas.
Além da valorização do imóvel, o vice-presidente do Secovi estima uma rentabilidade advinda de aluguel entre 0,3% a 0,6% ao mês. É um ganho interessante na comparação com a renda fixa atual, mas o docente da FGV alerta para a dificuldade de reajustar os contratos de aluguel seguindo o tradicional Índice Geral de Preços – Mercado (IGP-M).
No acumulado de 12 meses até setembro de 2020, os novos contratos tiveram correção de 0,14% na cidade de São Paulo, segundo o Secovi-SP. No mesmo período, o IGP-M valorizou 17,94%, contra uma alta de apenas 3,14% da inflação oficial, medida pelo IPCA. Para Corrêa, a demanda do mercado é que está regulando esses contratos hoje. “Você pode perder o inquilino se praticar a correção pelo IGP-M.”
Também é preciso ficar de olho na diversificação. Propriedades pedem um alto valor inicial. Então, no caso dos pequenos investidores, boa parte do valor de aplicação pode ficar comprometida com apenas um ativo, impossibilitando a diversificação. Uma opção é investir por meio de fundos imobiliários.
É o momento certo de comprar um imóvel?
Boa parte dos brasileiros quer comprar propriedades. O Fipe/Zap do segundo trimestre de 2020 mostra que 43% dos entrevistados tinham a intenção de comprar um imóvel nos próximos três meses. Esse percentual de potenciais compradores é maior do que o visto no primeiro trimestre de 2020 (36%) e na média histórica (37%).
Ao mesmo tempo, o Fipe/Zap apontou uma percepção de que os preços dos imóveis estão “altos ou muito altos” principalmente a partir do segundo trimestre de 2019, após anos de sentimento contrário.
Entre o segundo trimestre de 2019 e o segundo trimestre de 2020, houve aumento de 55% para 60% na participação de entrevistados que consideram os preços atuais como “altos ou muito altos”. E caiu o número de usuários do portal de classificados que consideram os preços “baixos ou muito baixos” (de 18% para 8%).
Então, este seria o momento certo para adquirir uma casa ou apartamento? “Houve queda de preços em diversas cidades nos últimos anos, e as condições de financiamento colaboram para essa maior acessibilidade do imóvel. Mas já temos visto um aumento nos preços, e essa tendência deve durar mais alguns meses pelo menos”, afirmou Eduardo Zylberstajn, consultor da Fipe.
Kallas concorda: quem esperar pode encontrar propriedades mais caras. Os custos das matérias-primas da construção civil têm subido por se correlacionarem ao câmbio. Alumínio, cobre e ferro são commodities negociadas em bolsa e seus preços seguem as cotações do mercado internacional, em dólar. Como a moeda americana já valorizou cerca de 40% ao longo de 2020, os custos estão pressionados.
“Os vendedores de materiais seguraram seus preços. Agora que o ritmo de vendas voltou, estão recuperando o tempo perdido. As construtoras veem esse aumento nos insumos e uma valorização dos próprios terrenos, pela lei da oferta e da demanda. As incorporadoras repassam todos esses custos no valor final apresentado aos compradores.”
Já Corrêa condiciona um aumento futuro nos preços aos outros dois fundamentos que permitem o crescimento do mercado imobiliário, além de acesso a financiamento: trabalho e salário. “Não adianta vender mais caro se não há compradores. É precipitado chamar esse movimento de boom. Mas, especialmente pelas novas taxas de financiamento, estamos criando condições para um novo ciclo de alta no mercado imobiliário tão logo tenhamos a recuperação do emprego e da renda.”
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