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Nas últimas semanas, ganhou destaque as notícias sobre os efeitos de uma Medida Provisória (MP) assinada por Jair Bolsonaro no fim de 2022 de número 1.152 (MP 1.152/2022) – e que tem o potencial de reduzir a geração de caixa e o lucro das exportadoras.
A MP foi publicada em 28 de dezembro e aguarda aprovação no Congresso. Basicamente, conforme explica a XP, a MP introduz o princípio de “arm’s length” para preços de transferência, alinhando as regras brasileiras de preços de transferência com os princípios da OCDE. Ou seja, a MP propõe uma nova regra para transações com controladas, que iguala o tratamento fiscal das transações com terceiros.
Assim, estabelece que os preços das mercadorias vendidas a partes relacionadas (ou seja, no caso de vendas intercompanhias) devem ser comparáveis aos preços de mercado de transações semelhantes entre partes não relacionadas. A medida deve ser votada tanto na Câmara quanto no Senado, ou expirara após um máximo de 120 dias.
Se aprovada, a MP poderia aumentar as alíquotas efetivas de impostos a partir de 2024 para alguns exportadores (embora a implementação real possa ocorrer em 2025 ou ainda mais tarde). Isso porque algumas companhias criaram subsidiárias em países como Áustria e Suíça de forma a pagar menos impostos. Um exemplo de operação é a venda dos produtos a preço de custo para essas subsidiárias, depois exportando os produtos de lá para os reais compradores, com o lucro sendo computado na subsidiária, com imposto menor.
Diversas casas de análise traçaram o impacto dessa MP para os lucros de empresas de capital aberto, com destaque principal para a Suzano (SUZB3), WEG (WEGE3) e Vale (VALE3), mas com outras companhias também no radar.
Os analistas do Morgan Stanley destacam ver maior risco potencial para empresas com alta participação nas exportações do Brasil e baixas alíquotas efetivas de impostos.
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Quanto maior a participação das vendas de exportação e menor a alíquota efetiva, maior a possibilidade de que as empresas possam ter se beneficiado, ou estejam se beneficiando, das regras de preços de transferência – a análise não explica necessariamente se uma empresa está usando um política particular de preços de transferência, mas serve como um guia para estimar onde pode existir risco possível.
A Suzano, com as exportações saindo do Brasil respondendo por 84% da receita total e uma alíquota efetiva de imposto de 2,2%, parece particularmente exposta; no entanto, os analistas observam que os benefícios e incentivos fiscais (por exemplo, para investir em certas regiões do Brasil) além de suas práticas de preços de transferência também contribuem para a baixa alíquota efetiva de imposto da empresa.
Enquanto isso, há exceções. Embora a Vale esteja em alta em ambas as métricas, com exportações respondendo por 81% das vendas (segundo estimativas do Morgan) e tenha alíquota efetiva de 15,9% em 2021, o banco acredita ser improvável que a nova medida provisória tenha um impacto material na receita tributária da empresa.
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Com base no relatório de transparência fiscal da Vale, a empresa já utiliza o “Método de Preço de Exportação de Bolsa de Mercadorias” como metodologia de preços de transferência para suas vendas a partes relacionadas no exterior (ou seja, as receitas brasileiras dependem de preços cotados em bolsas de mercadorias reconhecidas internacionalmente, sujeitas a certos ajustes como prazo, localização, custos de intermediação, entre outros).
Além disso, a baixa alíquota efetiva de imposto da Vale em 2021 foi explicada por incentivos que a empresa recebeu por seus investimentos nas regiões Norte e Nordeste do Brasil e o efeito de ajustes cumulativos de conversão, não pelos preços de transferência.
Ao realizarem uma análise de sensibilidade usando o método de fluxo de caixa descontado, os analistas calcularam qual seria o impacto potencial na avaliação das empresas de um aumento de 100 pontos-base na alíquota de imposto. Os valuations de CSN (CSNA3) e da Suzano variam mais, com o valuation diminuindo 2,7 % e 2,3% para cada aumento de taxa de imposto de 100 pontos-base. Em contrapartida, o valuation da Klabin cairia 1,2%. Os analistas ressaltam entenderem que a MP 1.152 não deve impactar negativamente a alíquota efetiva da CSN.
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WEG e Suzano: os casos mais monitorados pelo mercado
Ao falar especificamente sobre a WEG, o Credit Suisse acredita que a nova estrutura de preço de transferência pode aumentar a alíquota efetiva da WEG em um valor substancial – talvez em até 10 pontos percentuais, considerando a participação das exportações nas receitas consolidadas da companhia.
Se for esse o caso, estimam o impacto no lucro liquido da WEG de cerca de 12%. “Vale destacar que essa estimativa provavelmente é exagerada, pois na pratica provavelmente haverá fatores mitigantes, dependendo de como a estrutura for regulamentada e implementada”, aponta.
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Em relatório, o Itaú BBA apontou que, desde 2015, a diferença nas taxas de imposto estrangeiras representou uma média de cerca de 10% do lucro tributável consolidado da WEG, aponta o BBA. Ao também considerar 10 pontos percentuais da taxa de imposto estimada para 2024, a projeção final para o lucro da companhia estimativa pelo banco também diminuiria em aproximadamente 10% para o ano que vem, no pior cenário.
“No entanto, achamos improvável que o impacto da alíquota seja nesse montante, já que a MP provocaria apenas uma redistribuição de lucros entre as operações austríaca e brasileira, enquanto a alíquota da primeira continuará a ser menor. Além disso, como a WEG é uma empresa de caixa líquido, acreditamos que ela pode considerar alavancar seu balanço para aproveitar um efeito de incentivo fiscal”, apontaram os analistas.
Assim, os analistas do BBA acreditam que a WEG poderia utilizar outras ferramentas, como otimizar sua estrutura de capital, para compensar parcialmente o efeito nos resultados. “Deixando de lado essa turbulência, a WEGE3 continuará sendo uma ação sólida e defensiva, e mantemos nossa classificação outperform (acima da média do mercado, equivalente à compra)”, com preço-alvo de R$ 44 por ativo.
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Na mesma linha, o Credit Suisse, embora reconheça o risco, ressalta que a noticia não muda a sua visão construtiva sobre o case de WEG, uma vez que o aspecto operacional do negócio é mais relevante do que a questão tributária.
Se os ganhos de margem do 3T22 (terceiro trimestre de 2022) se mostrarem persistentes nos próximos resultados, essa vantagem por si só pode ser maior do que a discussão fiscal, avalia.
“A estrutura de preços de transferência é definitivamente uma questão importante a ser observada, mas acreditamos que as ações continuarão a ter uma boa performance se o desempenho operacional permanecer forte. O caso de investimento da WEG está positivamente exposto a muitas tendências de longo prazo e acreditamos que a companhia tem espaço para um crescimento de duplo dígito nos próximos anos”, avalia.
Na avaliação preliminar da XP, a empresa mais afetada sob sua cobertura seria a Suzano. Isso levando em conta que cada aumento de 1% na alíquota efetiva reduziria o preço-alvo em R$ 1,70 para SUZB3 (Valor Presente Líquido de R$ 2,2 bilhões ou cerca de 4% do market cap atual).
Na visão dos analistas, o caso mais negativo seria usar 32% de alíquota efetiva a partir de 2024 e, mesmo assim, o preço-alvo ainda seria de R$ 59,90 por ação SUZB3, um potencial upside de 29%.
“Acreditamos que a empresa ainda tem um grande conjunto de ferramentas para reduzir o pagamento de impostos e o JCP [juro sobre capital próprio] pode desempenhar um papel importante daqui para frente. No entanto, a utilização do JCP traria uma discussão mais ampla para a Suzano sobre suas políticas de alocação de capital”, apontam.
O JCP é um mecanismo que a empresa pouco utilizou nos últimos anos, pois não precisava: ele cria um benefício fiscal para a empresa, mas também uma obrigação tributária para os acionistas (15%) versus os dividendos isentos de impostos. Como a base de cálculo do imposto caixa da Suzano já era mínima nos últimos anos, o dividendo foi preferido ao JCP, mas a MP 1.152 pode mudar isso, ressalta a XP.
Com o início das operações do Projeto Cerrado, assumindo que não há mais projetos de crescimento daqui para frente, a empresa pode se tornar uma pagadora de altos dividendos, avalia a XP. A combinação de JCP e uso de créditos fiscais federais poderia reduzir a taxa de imposto de renda em pelo menos 4%-5% em um cenário pessimista, de dividendos mínimos, mas até 13%-15% em um cenário otimista, de maior distribuição de caixa aos acionistas. E isso não considera os benefícios de Sudam/Sudene, impostos diferidos ou amortização do ágio.
Assim, há um questionamento sobre se a Suzano priorizaria os dividendos em vez do crescimento para maximizar a redução efetiva da alíquota em um cenário de aprovação da MP 1.152.
“Historicamente, tanto a Suzano quanto a Fibria priorizavam novos projetos/M&A em detrimento dos dividendos (geralmente esses eram substanciais somente durante os picos de preço da celulose). No entanto, notamos que a Suzano cresceu tanto que novos projetos não alavancarão a empresa como no passado. Então, talvez a empresa consiga combinar crescimento com pagamentos de dividendos mais substanciais, usando o JCP para diminuir sua base tributária”, avalia.
O Goldman Sachs aponta que, no atual cenário, não está claro o quanto as novas regras potenciais sobre preço de transferência alteram os impostos efetivos de longo prazo da Suzano. Mas é justo supor que o impacto seria negativo para o perfil de fluxo de caixa livre da empresa.
“Há algumas considerações a serem feitas. Em primeiro lugar, achamos que a principal consideração negativa decorre do fato de que a maioria dos investidores estava atribuindo uma taxa de imposto muito baixa no curto prazo e lentamente se normalizando em torno de 25% no longo prazo”, avalia o banco.
Além disso, há riscos de que a alíquota efetiva de longo prazo aumente. “De acordo com nosso cálculo, cada aumento de 1% na alíquota efetiva de longo prazo reduz o VPL da Suzano em R$ 0,60 por ação (ou 1,4%), tudo mais constante”, complementa.