Walmart e Target: varejistas dão novo choque de realidade nos mercados e mostram que inflação nos EUA freou consumo

Consumidor comprou menos no primeiro trimestre e empresas não conseguiram repassar aumento de custos, provocado por alta das commodities

Mitchel Diniz

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A reação dos mercados aos resultados do Walmart e Target nos três primeiros meses deste ano é a prova de que um balanço trimestral não fala apenas sobre a saúde financeira de uma empresa, mas também da economia como um todo. Nesse caso, a maior economia do mundo. Não é de hoje que as Bolsas estavam fragilizadas pela escalada de preços nos Estados Unidos e os sinais do Federal Reserve de que os juros podem subir a patamares contracionistas, se assim for preciso, para colocar a inflação nos eixos. Pois os resultados das varejistas apontam que esse pode, sim, ser o caso, ao sinalizar que o poder de compra do americano está se deteriorando.

“O consumidor dos EUA está sendo atingido pela inflação e simplesmente não está comprando tanto, mesmo os itens básicos do dia a dia, que eu e tantos outros compramos na Target. Esse é um enorme sinal de alerta para a economia americana”, diz James Collins, analista da Ohmresearch. O lucro da Target caiu pela metade no primeiro trimestre, comparando com um ano antes, mesmo com um aumento de 3,3% nas vendas, acima das estimativas. E, ainda que a frequência de consumidores nas lojas da companhia tenha crescido no período, o valor gasto por eles diminuiu.

As vendas em dólar da Target aumentaram US$ 950 milhões de um ano para o outro, mas os custos da companhia subiram em ritmo bem maior, em US$ 1,75 bilhão. Resultado: a margem bruta da empresa encolheu 430 pontos-base, para 25,7%.

“Ao longo do trimestre, enfrentamos custos inesperadamente altos, impulsionados por uma série de fatores, resultando em rentabilidade que ficou bem abaixo de nossas expectativas e bem abaixo de onde esperamos operar ao longo do tempo”, afirmou Brian Cornell, CEO da companhia, em texto que acompanhou os resultados.

Dentre os custos citados por Cornell estão aqueles relacionados a frete e interrupções na cadeia de suprimentos, assim como o aumento de remuneração e número de funcionários nos centros de distribuição da companhia – a inflação do mercado de trabalho que o Fed sempre insiste em salientar nos seus discursos.

“Até nos Estados Unidos, onde as vendas do varejo são fortes, o aumento de custos está começando a afetar o comportamento de consumo e margens brutas”, diz análise de Credit Suisse, sobre o desempenho das varejistas.  O lucro da Walmart, divulgado na terça-feira, caiu 24,8%, também com margens pressionadas pela inflação. A empresa não foi capaz de repassar o aumento de custos com fornecedores para o cliente final.

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“Ficou claro que, em um ambiente de inflação, não se pode repassar o aumento de custos de forma integral, ou seja, o cliente lá na ponta não aguenta. Sendo assim, teremos menores margens e menor consumo. Aliás, o caminho para baixar a inflação passa por isso”, escreveram os analistas da XP.

“Com a inflação batendo na porta dos consumidores, a procura por produtos mais ‘em conta’ se tornou uma caçada sem fim em grandes mercados nos Estados Unidos”, diz a análise da Levante Ideia de Investimentos. O conflito no leste europeu, entre Ucrânia e Rússia, acentuou a escalada nos preços das commodities. Logo, o efeito nos preços foi sentido pelos consumidores que frequentam os supermercados do Walmart a as lojas da Target.

O Morgan Stanley explica que a inflação não só diminuiu a capacidade de compra do consumidor, como também altera o perfil do consumo em si, afetando negativamente os bens discricionários. E isso acontece justamente em um momento no qual as empresas aumentaram seus estoques, acreditando que os níveis de demanda do quarto trimestre de 2021 permaneceriam nos próximos meses. “As empresas não queriam correr o risco de ficar sem produtos e perder vendas”, diz a análise do Morgan Stanley.  Até então, os riscos de excesso de estoques parecia mínimo.

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Mas as vendas desaceleram e as varejistas, na visão do Morgan, subestimaram a reversão de demanda – com a inflação mais alta, os consumidores deixaram de procurar por bens não essenciais. Por outro lado, o aumento acelerado dos preços dos combustíveis elevou os custos das varejistas. Logo, as empresas se viram forçadas a remarcar preços para queimar estoques e criar espaço para venda de produtos mais essenciais, que passaram ser mais demandados.

Depois de desabarem na Bolsa, puxando o mercado como um todo junto, as ações da varejista tendem a enfrentar mais turbulência pela frente, na avaliação da Levante. “Acreditamos que os preços das ações dessas companhias podem ser impactados negativamente em um intervalo maior de tempo, na medida que maiores pressões inflacionárias afetem seus custos/despesas, sem que as empresas consigam repassar nos preços de seus produtos, o que continuará comprimindo suas margens e lucros”.

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Mitchel Diniz

Repórter de Mercados