Via Varejo muda marca para Via para ir “além” e adota metas ambiciosas: qual o impacto para o setor?

Plano traçado é visto como positivo, mas analistas fazem alerta sobre concorrência com metas agressivas da companhia
Novo logo Via, ex-Via Varejo (Foto: Reprodução)
Novo logo Via, ex-Via Varejo (Foto: Reprodução)

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SÃO PAULO – As transformações não podem parar. Após grandes mudanças nos últimos meses, a Via, antiga Via Varejo (VVAR3), que anunciou alterações em sua marca nesta semana, busca atingir novos patamares. Essa foi a principal mensagem transmitida pela companhia durante Investor Day realizado na última segunda-feira (26).

Roberto Fulcherberguer, CEO da Via, destacou no evento que a loja física segue sendo muito importante, mas além de um ponto de venda para o consumidor direto, também será o centro de relacionamento e logística.

Em comunicado, a companhia destacou que os resultados têm mostrado que a Via não é mais uma empresa de varejo, mas que está indo além. “No último ano, a empresa se reinventou, rompeu e unificou as barreiras físicas e digitais das lojas, sites e aplicativos, também se associou a startups que deram ainda mais velocidade ao sistema logístico e tecnológico, rejuvenesceu a marca Casas Bahia e mudou todo a plataforma de marketplace.” Vale ressaltar que, no mesmo dia, foi anunciada a compra da fintech Celer Processamento Comércio e Serviço, plataforma proprietária de soluções de pagamentos.

Antes disso, na sexta, foi anunciado que a marca Pontofrio passa a ser chamada apenas de Ponto :>, com a nova fase focada em tecnologia, com a “essência de romper o óbvio por meio de uma comunicação divertida, simples e digital”, disse a empresa. De acordo com Fulcherberguer, o Ponto :> vai se conectar muito com os jovens e com as classes A e B: “ele vai agregar muito do que existe nas redes sociais. Temos mais de 20 mil vendedores e nosso desafio era transformar isso em online, o que conseguimos na pandemia à força”.

Concluindo uma série de grandes anúncios nos últimos dias, a companhia também fez uma completa atualização da estratégia da companhia e seus principais focos no curto e médio prazo, sendo dividida em seis blocos: 1) Marketplace Via; 2) Soluções Financeiras Via; 3) Logística Via; 4) Inovação e Novos Negócios Via; 5) ESG Via e e 6) Via 2025.

Com relação ao marketplace, destaque para as iniciativas que aumentam a recorrência e fidelidade. Em relatório, Danniela Eiger, Gustavo Senday e Thiago Suedt, analistas da XP, destacam os números do benefício dos clientes do aplicativo da Casas Bahia, o chamado Casas Bahia Play, que foi disponibilizado em março e traz desconto na assinatura do serviço de streaming Paramount+ . Nos primeiros 30 dias de campanha, os downloads do aplicativo cresceram 50%. Entre outras iniciativas, estão as Casas Bahia VIP (com previsão de lançamento no terceiro trimestre) – programa de fidelidade que oferecerá frete grátis, promoções exclusivas e opções de entretenimento.

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Um ponto importante também foi a adição de 10 mil vendedores à plataforma em março e a abertura de Mega Loja em SP e mais 120 unidades no Brasil (principalmente nas regiões norte e nordeste) este ano, todas configuradas para atender os canais de o varejo digital direto (1P) e o marketplace (3P).

Com relação às soluções financeiras, atenção para o banco digital banQi, que conta com 2 milhões de contas ativas. No segundo trimestre, a empresa espera disponibilizar a opção de empréstimos pessoais para clientes do banco.

Em termos logísticos, ao longo do segundo semestre, a empresa dará início às suas operações de: fulfillment. O termo, muito usado no e-commerce, quer dizer que o estoque dos vendedores é gerenciado pela própria empresa – desde o armazenamento da mercadoria até a entrega para o cliente. Além disso, também na segunda metade do ano, a companhia também começará os serviços de entregas na mesma hora (inclusive para o 3P), entregas C2C (contratação à parte do serviço de transporte para a doação, transporte ou descarte de produtos) e utilização das lojas físicas para entregas e logística reversa do marketplace.

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Também em destaque, está a criação do CVC, um braço de corporate venture da companhia em parceria com o Distrito (plataforma de fomentação de startups), chamado Via Next, que deve investir R$ 200 milhões em 5 anos em startups que complementem seu ecossistema.

Busca de maior market share e impacto nas outras companhias

Já pelo Plano Via 2025, última divisão do plano estratégico, o grande destaque ficou para a meta da companhia de atingir uma participação de mercado online de pelo menos 20% até 2025. Baseando no pressuposto da empresa de R$ 500 bilhões no mercado online, a orientação implica uma venda bruta de mercadorias (GMV, na sigla em inglês) online de R$ 100 bilhões em 2025, uma alta de 525% ante os R$ 16 bilhões em 2020.

Os números são considerados desafiadores: analistas do Bradesco BBI estimam que a participação de mercado da Via em 2020 foi de aproximadamente 9%, aumentando para algo em torno de 10% em 2021. Nos cálculos da XP, para chegar à participação de mercado de 20% tão almejada em 2025, seria necessário um crescimento médio anual de 40% ao ano, ante a estimativa dos analistas de que a companhia alcançará 12% de market share até o período (correspondente a um crescimento de 26% ao ano).

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A projeção da companhia também é de que o comércio eletrônico seja responsável por dois terços do GMV geral até 2025, ante 21% em 2019 e 43% em 2020.

Apesar de destacar a apresentação como positiva, de forma a trazer uma completa atualização da estratégia da companhia e seus principais focos no curto e médio prazo, os analistas da XP avaliam que não houve nenhum grande anúncio. Ao mesmo tempo, sentiram falta de mais dados para sustentar a projeção do ganho de participação de mercado esperado até 2025.

Indo além, os analistas do BBI apontam que as metas agressivas de crescimento de participação de mercado pressupõe um aumento da concorrência, o que pode afetar o setor como um todo.

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Em termos de participação de mercado, avalia o BBI, existe precedente para um aumento tão grande (pelo menos 10 pontos percentuais em cinco anos), com Mercado Livre (MELI34) tendo conseguido isso em dois anos (2015-2017) e Magazine Luiza (MGLU3) alcançando esse patamar em três anos (2017-2020).

“Dito isto, ambas as empresas tiveram de fazer investimentos significativos para conseguir esta marca – o lançamento do frete grátis no caso do Mercado Livre e uma contração de 5 pontos da margem Ebitda no caso de Magalu. Além disso, as duas empresas conquistaram esses ganhos de participação em um mercado menos competitivo e consolidado”, apontam.

Portanto, na visão de Richard Cathcart, João Andrade e Victor Gaspar, analistas do banco, embora a Via tenha ativos fortes – sua marca, escala, base de clientes e operações de crédito – para usar para se tornar um player maior, ela enfrenta uma tarefa mais difícil do que seus pares.

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O guidance também deve ser negativo para os outros grandes nomes do comércio eletrônico – como os já citados MercadoLivre e Magalu, além de B2W (BTOW3). Isso porque os quatro principais participantes respondem por 75% do mercado de comércio eletrônico e os ganhos de participação de mercado no futuro provavelmente ocorrerão às custas de um dos outros players importantes. “Se a Via quiser atingir sua meta de R$ 100 bilhões no GMV online, acreditamos que a concorrência ficará muito mais agressiva”, avaliam.

Neste cenário, tanto os analistas do BBI quanto da XP possuem recomendação neutra para as ações, com preços-alvos respectivos de R$ 17 e R$ 20 por ativo VVAR3. Os analistas destacam que o discurso e as iniciativas da Via abordam os pontos corretos para a empresa continuar desenvolvendo seus recursos digitais e evoluindo seu mercado. Porém, entre os pontos de atenção, os investidores ficarão de olho na sustentabilidade do crescimento, apontam os analistas.

Assim, entre os desafios da maior competição e o cenário de que a integração entre o digital e as lojas físicas veio para ficar, analistas se mostram, em sua maioria, otimistas sobre o futuro das ações da companhia, de acordo com consenso Refinitiv. De dezesseis casas que cobrem o papel, dez possuem recomendação equivalente à compra, cinco recomendação neutra e somente uma de venda.

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Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.