Venda de terras a estrangeiros será aprovada este ano, avalia senador Irajá Abreu

Projeto espera trazer R$ 50 bilhões por ano ao País e prevê limites ao quanto cada estrangeiro poderá comprar, destacou o parlamentar em entrevista ao  InfoMoney

Ricardo Bomfim

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SÃO PAULO – A exploração de terras brasileiras para a agricultura por estrangeiros tem sido um grande tabu no Brasil. Mas não precisaria ser, segundo o senador mais jovem do País, Irajá Abreu (PSD-TO), eleito em 2018 aos 35 anos, idade mínima para que uma pessoa assuma o cargo. 

Filho de sua colega senadora e ex-ministra da Agricultura, Kátia Abreu (PDT-TO), Irajá é autor do Projeto de Lei 2.963/2019, batizado de “Terra para + Empregos + Alimentos”. 

Para ele, em um momento no qual o capital é escasso dentro do País, é importante tentar trazer o investimento estrangeiro para o agronegócio, pois isso serviria para trazer “mais empregos e maior produção de alimentos”. 

“O nosso ‘Terra’ tem uma estimativa por baixo, quando junta toda a cadeia produtiva, de gerar R$ 50 bilhões por ano em novos negócios”, afirmou o senador, em entrevista ao InfoMoney.

Mesmo com todas as atenções do País voltadas para a reforma da Previdência, Abreu acredita que conseguirá aprovar sua proposta ainda este ano graças ao viés mais liberal do governo Bolsonaro. 

“Nesses oito anos que tenho de Congresso, esse é o melhor ambiente político que já tivemos para aprovar pautas como essa”, defende ele, ao garantir que Planalto endossa seu projeto. Principalmente por conta do apoio que recebe da ministra da Agricultura, Tereza Cristina.  

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Irajá Abreu é formado em Publicidade e Propaganda e já trabalhou como produtor rural e como empresário. Após ser eleito deputado federal em 2010, Abreu se licenciou no ano seguinte para se tornar secretário de Desenvolvimento Agrário e Regularização Fundiária em seu estado, o Tocantins. Ele foi reeleito deputado em 2014. 

Leia a íntegra da entrevista que o InfoMoney fez com o senador: 

InfoMoney – Como o setor agro está olhando para o governo Bolsonaro? Sabemos que o agronegócio é uma das bases mais sólidas do governo. As pautas do interesse deste setor tem andado mais?

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Irajá Abreu – Nós tivemos, nesses 4 meses de atividade parlamentar, vários momentos positivos, e um deles foi a nova lei do licenciamento ambiental, que ajuda a estruturar as principais grandes obras do País como ferrovias e hidrelétricas. Isso inclui também o licenciamento do agro. Foi uma sinalização do governo de que o tema tem relevância.

A presença da [ministra da Agricultura] Tereza Cristina – que era uma deputada muito ligada ao setor – no governo também é uma indicação de respeito a essa atividade, que movimenta um terço da economia e que é a principal responsável pelo superávit na balança comercial.

O que eu tenho notado é uma pauta mais liberal. Na região do Matopiba [acrônimo formado pelas iniciais dos estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia] houve a concessão de um trecho da ferrovia Norte-Sul, que é um avanço importante.

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Há também as concessões dos aeroportos. Tivemos a aprovação da [Medida Provisória] MP da aviação civil, um marco importante e semelhante ao do [meu projeto, o] “Terra”, que é a autorização da operação de estrangeiros no Brasil. A aprovação do PL do Saneamento também, que facilita a privatização.

Nesses oito anos que tenho de Congresso, esse é o melhor ambiente político que já tivemos para aprovar pautas como o projeto que permite a venda de terras a estrangeiros.

IM – Falando especificamente sobre o seu PL, quais são as possibilidades de aprovação? Já há um cronograma de tramitação no Congresso?

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Irajá Abreu – Primeiro ponto importante é que demos uma nova roupagem à proposta, que já foi apresentada oito anos atrás no governo da presidente Dilma. Naquele momento, apresentamos um projeto com algumas limitações, mas em razão do ambiente político, esse projeto foi retirado de pauta porque teve o impeachment.

Apresentamos novamente durante o governo do ex-presidente Temer, mas as investigações que caíram sobre ele também impediram o tema de avançar. Agora, nós trouxemos um novo projeto, com o nome: “Terra para mais Empregos e mais Alimentos”, que requer uma visão contemporânea, enfrentando mitos que a sociedade criou em volta da proposta ao longo desses anos.

Por que na cidade o estrangeiro pode tudo? Pode ter todos os prédios comerciais na Faria Lima e na Paulista, pode ter todas as empresas industriais e agora também as companhias aéreas? Por que ele não pode ter uma fazenda?

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Esse estrangeiro que quer comprar terras rurais está disposto a abrir uma empresa nacional, que vai responder pelas leis brasileiras, ele só vai internalizar o capital dele e vai nos ajudar a gerar empregos e alimento mais barato, pois aumentará a oferta.

Um primeiro ponto é trazer as pessoas para essa reflexão. Por que não pode liberar para o campo com restrições? Não é um libera geral.

IM – Como o senhor lidou com as críticas de violação da soberania nacional no seu projeto?

Irajá Abreu – A nossa proposta é extremamente conservadora. A preocupação com a soberania nacional é completamente factível, tanto que no projeto nós criamos uma restrição às áreas de fronteiras.

Será proibida a compra de terras por estrangeiros em uma faixa de 150 quilômetros de fronteiras com outros países. Com isso, conseguimos contemporizar a resistência dos militares.

O segundo ponto é [a proibição da compra] no bioma amazônico, que faria o projeto ser bombardeado como já foi lá atrás. O bioma amazônico são seis estados da região Norte inteiros e três estados parciais. Fora um pedaço do norte do Mato Grosso, um pedaço do norte do Maranhão e o meu estado, o Tocantins.

Se não for assim, não é possível avançar. Achamos prudente fazer essa restrição para conter o argumento de que estamos “vendendo a Amazônia para os estrangeiros”.

E criamos também um limite de 25% da área de cada município. Isso foi pensado para poder mitigar a concorrência que os estrangeiros terão com os brasileiros.

IM – O governo tem posição sobre esse projeto?

Sim, a Tereza Cristina apoia o projeto, que foi desenhado com ela de ponta a ponta. Tentamos construir o texto mais conservador possível para que ele possa ser aprovado.

IM – Os chineses têm muito interesse em comprar terras brasileiras, porque eles são os maiores importadores dos nossos produtos agrícolas. Como fica essa questão? Não teria algum receio de eles virem para cá, produzirem aqui e comprarem menos de produtores brasileiros?

Irajá Abreu – Não, porque eles têm que abrir uma empresa nacional para adquirir essas terras, então vão viver sob as leis brasileiras. Em segundo lugar porque existe o Estatuto da Terra, que defende a função social da propriedade. O estrangeiro não pode vir para cá para especular.

E o governo tem outros instrumentos para controlar essa comercialização para fora. Tem a pauta de exportação, a política e dispositivos para dificultar ou facilitar essa exportação. São os dispositivos de segurança do Brasil.

IM – Esses mecanismos viriam em um segundo momento?

Irajá Abreu – Não, eles já estão presentes no projeto. Além do limite de 25% de áreas [de municípios que o estrangeiro pode adquirir], há o limite de de 10% por nacionalidade. Ou seja, dentro desses 25% que o estrangeiro pode comprar de cada município, só 10% podem ser para produtores da mesma nacionalidade. Está no artigo 8º do projeto.

IM – Sabemos que a Previdência é maior prioridade no Congresso hoje. Como fica a agenda para aprovação do seu projeto neste cenário?

Irajá Abreu – São projetos convergentes. O ideal é que a Previdência concluísse a tramitação o mais rápido possível para o “Terra” avançar.

O “Terra” será debatido agora na Comissão de Assuntos Econômicos [CAE] do Senado, em conjunto com a Comissão de Agricultura, sob relatoria do senador Rodrigo Pacheco (DEM-MG).

Depois segue para Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), onde provavelmente ficará nas mãos da presidente, a senadora Simone Tebet (MDB-MS), e será encaminhado com urgência para o Senado.

Imaginamos que depois disso ele tramitará para a Câmara com rapidez. Iremos conversar com o [presidente da Câmara] Rodrigo [Maia] (DEM-RJ) para garantir a celeridade.

IM – Mas qual é o prazo?

Irajá Abreu – A ideia é que passe pelo plenário do Senado até outubro. Aí na Câmara depende de quais comissões ele irá passar, mas esperamos que seja aprovado até o fim do ano. Por isso criamos essas “vacinas” no projeto para minimizar resistências.

IM – Em se aprovando o seu projeto? Já existe alguma projeção de quanto vai entrar de capital?

Irajá Abreu – Fizemos uma comparação com os projetos mais importantes atualmente, como o da cessão onerosa, que prevê recursos da ordem de R$ 70 bilhões em royalties para estados e municípios. A lei da aviação são R$ 12 bilhões, o PL do saneamento são R$ 36 bilhões, o das telecomunicações fala em R$ 20 bilhões e a Lei Kandir são R$ 30 bilhões.

O nosso do “Terra”, tem uma estimativa por baixo, quando junta toda a cadeia produtiva, ou seja, carne, grãos, fruticultura, suinocultura etc., de gerar R$ 50 bilhões por ano em novos negócios.

IM – Como o senhor vê o agronegócio brasileiro atualmente?

Irajá Abreu – O agro vem passando por uma transformação ao longo de 40 anos. Quatro décadas atrás o Brasil importava comida, comprava arroz do Vietnã, feijão do México e carne da Austrália.

O cenário mudou por uma decisão do governo [do presidente militar Ernesto] Geisel, tomada pelo ministro Alysson Paulinelli, de incentivar os produtores das regiões Sul e Sudeste a desbravarem o cerrado, que era algo impensável na época. Foram concedidos incentivos para a migração para essas novas fronteiras.

Um segundo ponto importante para alavancar nosso agronegócio foi a criação da [Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária] Embrapa, que ajudou a viabilizar o plantio no cerrado. 

Um terceiro ponto é o uso de novas tecnologias, que permitiu que o Brasil fosse eficiente da porteira para dentro.

Nosso próximo desafio vai ser da porteira para fora. Não existe nenhum país que compete com o Brasil em eficiência e produtividade no campo. Mas falta fazer a logística chegar lá.

Armazenagem é outro gargalo, assim como tributação e licenciamento ambiental. Essa vai ser a nossa quinta revolução.

Se chegamos até aqui sozinhos, imagine o que aconteceria se permitirmos que alguém venha de fora e se some ao que fizemos ao longo de 40 anos.

IM – O principal gargalo no agronegócio é infraestrutura ou são os impeditivos da lei ambiental e tributária?

Irajá Abreu – Avançamos muito no licenciamento ambiental desde 2012. Falta regulamentar alguns pontos, mas já melhorou muito [em termos de legislação]. A lei trabalhista principalmente.

Se tivesse que pontuar, o principal gargalo é a logística. A tonelada exportada de soja nos EUA é US$ 20, porque eles usam muita hidrovia no Mississipi. No Brasil, essa mesma tonelada é US$ 90.

Somos eficientes dentro da fazenda. Temos um clima melhor, solo favorável e tecnologia, só que perdemos feio do lado de fora.

Nisso, ficamos iguais aos EUA. Então, o desafio é avançar na logística para ficarmos mais competitivos que os norte-americanos.

Temos que incentivar o uso de hidrovias, que é o modal mais barato, porque não precisa construir nada.

É só fazer a derrocagem [processo de retirada ou destruição de pedras ou rochas submersas, que impedem a plena navegação] e as eclusas quando há hidrelétricas. Isso é um problema de projeto lá atrás de quando fizemos as nossas usinas.

Em alguns pontos, precisa fazer derrocagem, como no pedral do Lourenço, entre o Tocantins e o Pará. São pontos de passagem em que há algum impedimento físico, como pedreiras, que precisam ser eliminados.

O principal, que nós temos, são os rios. Temos condições de fazer entre o Rio Tocantis até o Porto Vila do Conde, o nosso Mississipi.

Só com a derrocagem do Pedral de Lourenço e a eclusa do Lajeado. Seriam 1.400 quilômetros de hidrovias. Iria do Centro-Oeste brasileiro ao porto Vila do Conde no Pará.

Mas, infelizmente, hoje fazemos tudo no modal rodoviário, ou ferroviário parcial.

IM – Isso é falta de prioridade do governo?

Irajá Abreu – Sempre foi. Nunca tratamos disso com a devida urgência, mas com essa agenda liberal acredito que possamos reverter isso.

IM – O senhor acha então que a gestão Bolsonaro tem mais prioridade nisso?

Irajá Abreu – Eu vejo que ela tem uma visão mais liberal no macro. A hidrovia e as ferrovias podem aproveitar essa carona.

IM – E essa agenda liberal tem caminhado em um ritmo bom?

Irajá Abreu – Tem sim. O ministro Tarcísio [Gomes de Freitas, da Infraestrutura] tem uma visão bastante aguçada da urgência [de se investir em modais logísticos diferentes do rodoviário]. É uma pessoa muito competente.

IM – Existe uma visão equivocada sobre o agronegócio na sociedade? Vocês vão trabalhar para mudar isso?

Irajá Abreu – O Brasil tem 30% do seu território protegido em reservas naturais e reservas indígenas. O segundo país mais próximo é a Austrália, com 16%, a metade do Brasil. Além desse dado oficial, é importante destacar que 67% do território brasileiro é protegido como há 500 anos. São as florestas originais.

Os EUA, que são nosso maior concorrente na produção agrícola, têm 20%. Se olharmos esses dois números, eles já respondem essa sua pergunta. Melhorar é possível, mas o Brasil é um grande exemplo de preservação do meio ambiente.

IM – Mas o senhor concorda com esses discursos que apareceram muito nas campanhas presidenciais de que o Brasil não precisa expandir a fronteira agrícola porque pode ser mais produtivo com o que já tem?

Irajá Abreu – Concordo plenamente. A abertura de novas áreas requer investimentos altíssimos de preparo de solo, correção, calcariagem, enfim.

Enquanto isso, pegar uma área já produtiva e incrementá-la com o uso de novas tecnologias, além de mais barato é mais rápido.

Para alcançar o pico de produtividade em uma área nova de milho ou de soja, leva, no mínimo, três anos. É uma terra que não está preparada para atingir as produtividades ideais.

Se pegar a área produtiva e colocar agricultura de precisão, já aumenta a produtividade no primeiro ano e com custo muito menor.

IM – Indo em uma questão mais específica, o setor sucroalcooleiro reclama muito do excesso de oferta da Índia, que obriga os fazendeiros a produzir muito mais etanol do que o açúcar em si. Nesse patamar de petróleo perto de US$ 50, como fica essa questão? Esse setor precisa de apoio?

Irajá Abreu – A matriz do álcool tem um fator determinante que é a multiplicação por um fator de 1,6 no posto de gasolina. Quando você tem um produto que é competitivo em relação à outra opção, ele passa a ser mais atrativo e é mais demandado.

O setor fica refém disso. Quando o álcool é mais competitivo, eles ofertam mais. Eles equilibram quando a gasolina fica mais barata. Quem determina isso é a lei de mercado.

O setor passou por crises profundas, mas vem se recuperando, e é uma matriz muito importante.

IM – Mas seria necessário aumentar os subsídios?

Irajá Abreu – Para ser honesto, já tem muito subsídio. É o que consegue segurar o setor.

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Ricardo Bomfim

Repórter do InfoMoney, faz a cobertura do mercado de ações nacional e internacional, economia e investimentos.