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SÃO PAULO – Imagine que em 1968, ano em que o Ibovespa foi criado, um investidor tenha aplicado R$ 10 mil em um fundo que replica o principal índice de ações da Bolsa paulista. Passados mais de 40 anos, o patrimônio teria alcançado R$ 616.350, já descontada a inflação. A Bolsa, como era de se esperar, serviu para multiplicar o patrimônio dos brasileiros ao longo do tempo. O surpreendente, porém, é que o mesmo investidor poderia ter alcançado rentabilidade semelhante se tivesse investido na Bolsa em apenas nove meses específicos, segundo um levantamento realizado pela gestora de recursos Mint Capital.
A pesquisa mostra que toda a alta do Ibovespa esteve muito concentrada nos meses de maio de 1971, março de 1986, março de 1988, abril de 1989, abril de 1990, julho de 1990 e janeiro, maio e dezembro de 1991. Se retirássemos esses nove meses de forte valorização do levantamento, o investidor não apenas teria deixado de ganhar uma elevada quantia como ainda teria ficado no vermelho, passando a ter um patrimônio de apenas R$ 9.332. E se retirássemos apenas o mês de abril de 1990 (alta de 92,4% do Ibovespa), o rendimento já teria caído quase pela metade, com o patrimônio atingindo R$ 332.319.
Os dados comprovam que ganha muito dinheiro na Bolsa quem entra na hora certa. Mas como antecipar esses movimentos antes que eles aconteçam? “A probabilidade de acertar esse ‘timing’ é muito menor do que acertar na Mega Sena”, diz o sócio-fundador da Mint, Cássio Beldi. Se não quiser perder um movimento forte de alta da Bolsa, o investidor, com exceção dos muito sortudos, terá de comprar ações e permanecer posicionado até que ele aconteça. “Diferentemente do que alguns pensam, investimento em Bolsa é de longo prazo. O investidor pode e deve, se necessário, mudar a composição de seu portfólio, mas é importante estar sempre posicionado na Bolsa, independentemente do cenário político, econômico e social”, explica.
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Para muitos investidores, o problema dessa estratégia é manter os nervos sob controle. Quem entra na Bolsa em momentos turbulentos, provavelmente se sentirá tentado a realizar o prejuízo para não se sentir cada vez mais pobre quando as ações caem. Mas é aí que as pessoas perdem dinheiro. Em sua estratégia de seleção de ações, a Mint Capital afirma misturar a filosofia de finanças comportamentais ao “value investing” (estratégia de valor). O objetivo é comprar papéis que estão com uma boa relação custo/benefício e não se assustar com eventuais reveses – desde que a empresa seja realmente sólida.
A ideia de juntar os dois métodos é controlar alguns vícios, também chamados de vieses comportamentais. Sentimentos como ganância, medo e autoconfiança exacerbados têm o poder de interferir nos planos dos acionistas e deixá-los no prejuízo. Beldi explica que, ao administrar uma carteira de ações, é preciso ter em mente que os mercados não são eficientes a todo o momento e que alguns comportamentos geram distorções, culminando em oportunidades para os investidores que estão focados.
Um dos vieses mais comuns é o “discurso de consenso”, no qual o investidor acredita ser melhor errar junto com um grupo de pessoas do que acertar sozinho. “É o clássico efeito manada. Quando você erra com os outros, se torna mais fácil justificar para os clientes [no caso dos gestores profissionais], amigos e familiares o porquê da falha”, explica. Outro vício nocivo a uma carteira é o da “autoridade e confirmação”, no qual investidores buscam a opinião de especialistas a fim de embasar suas escolhas. Como cada gestor ou analista possui diferentes objetivos e tendências, é preciso entender quais são seus vieses para não seguir por um caminho indesejado. Ler notícias e cartas das instituições financeiras com cautela e dar grande importância a opiniões diferentes das suas é um dos pontos-chave para não cair em armadilhas.
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Outra conduta corriqueira, principalmente entre profissionais que atuam na Bolsa, é o da “autoconfiança” – ou seja, confiar demais nas próprias capacidades. “Uma pesquisa mostrou que mais de 80% dos gestores americanos se acham melhores que a média. No entanto, menos de 50% conseguiram bater o índice S&P 500 [um dos principais da Bolsa americana]”, lembra o gestor. “Esses números apenas comprovam que é preciso ter humildade.”
Já entre os pequenos investidores, um vício comum é chamado de “bilhete de loteria”, no qual a pessoa enxerga as oscilações da Bolsa como um grande cassino, realizando diversas negociações em um curto espaço de tempo; e o de “aversão a perdas”, em que o medo de sofrer prejuízo prevalece e faz com que os investidores saiam de um papel antes do tempo, perdendo boas oportunidades de lucro no longo prazo.
Beldi também aconselha controlar a expectativa que grande parte dos investidores cria sobre as empresas que fazem parte de sua carteira. Nesses casos, os preços pagos pelas ações costumam ser altos, já que a expectativa é de que os resultados das companhias venham excelentes. E quando não se concretizam, muitos acabam vendendo os papéis, decepcionados com o desempenho. “Como já dizia Warren Buffett, investir em uma ação é como um casamento: é preciso ter baixa expectativa. Se você não esperar muito, pode se surpreender com os resultados.”
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Como montar a carteira
Dado que a estratégia deve ser de longo prazo, como o investidor deve montar seu portfólio? “O primeiro ponto é não aplicar em apenas uma ação, mas em um grupo delas”, aponta Beldi. A sugestão é que a carteira tenha de 10 a 20 ações com pesos iguais e que sejam de empresas atuantes em diferentes setores para conseguir compensar eventuais perdas em alguns momentos. Harry Markowitz, Prêmio Nobel de Economia em 1990, se tornou celebridade no mercado financeiro por conseguir comprovar que a diversificação ajuda a reduzir os riscos.
Além disso, é preciso escolher ações subavaliadas, ou seja, precificadas abaixo de seu valor intrínseco. De acordo com o especialista, em períodos bons, companhias desacreditadas pelo mercado costumam ter uma melhor performance que as mais negociadas, e vice-versa. Como nem sempre é possível antecipar os resultados da economia, uma boa dica é buscar empresas que pagam bons dividendos, são lucrativas e possuem baixo endividamento. “Empresas com essas características dificilmente quebram.” Logo, quem só compra esse tipo de ação na Bolsa e tem paciência para esperar a valorização de um papel terá mais chances de ganhar dinheiro.
Ganhadores do Nobel explicam
Robert Shiller, Eugene Fama e Lars Peter Hansen ganharam o Prêmio Nobel de Economia de 2013 por realizarem uma “análise empírica sobre o preço das ações”, abordando como é possível prever a valorização dos preços de um ativo no futuro. Além de demonstrar que é mais fácil conseguir prever o preço em um horizonte de tempo mais longo, de três a cinco anos, os economistas também estudaram finanças comportamentais para explicar tendências ou vieses que costumam criar ineficiências de preços, gerando boas oportunidades no longo prazo para aqueles que conseguem utilizar o lado racional no mercado de ações.
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Essa matéria foi publicada na edição 48 da Revista InfoMoney, referente ao bimestre janeiro/fevereiro de 2014. Para tornar-se um assinante da revista, clique aqui.
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