“Todo mundo errou sobre o pós-Dilma”, diz Maílson: uma nova fase para o Brasil só em 2019

Os economistas e mercado fracassaram ao projetar o cenário pós-Dilma, mas isso ocorreu não por um erro específico do governo Temer, mas pelo "desastre" da gestão anterior, diz Maílson; segundo ele, o grande objetivo de Temer não é trazer uma nova fase de expansão, mas colocar o "trem de volta aos trilhos"

Paula Barra

Maílson da Nóbrega
Maílson da Nóbrega

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SÃO PAULO – Tanto o mercado quanto os economistas de uma maneira unânime fracassaram ao tentar projetar o cenário para o Brasil pós-Dilma. E o motivo não foi um erro específico do governo de Michel Temer (embora ele tenha mostrado falha na comunicação com o povo), mas sim o fato de ter ficado muito difícil fazer estimativas após a “catástrofe da administração petista”. Quem diz isso é Maílson da Nobrega, economista e ex-ministro da Fazenda do governo Sarney (1988-1990), em entrevista exclusiva ao InfoMoney. 

“Todo mundo errou sobre o pós-Dilma”, disse o ex-ministro, colocando-se dentro do grupo dos que erraram os cálculos. Embora as projeções atuais empurrem a recuperação do Brasil para cada vez mais perto de 2018, ele não demonstra-se preocupado, pois o grande objetivo de Temer não será entrar em uma nova fase de expansão, mas de colocar o trem de volta aos trilhos. 

“Estamos realmente chegando ao fundo do poço, mas a um ritmo menos rápido do que as expectativas indicavam logo após a entrada do governo Temer (…) Uma nova fase começará somente em 2019”, afirma Maílson em entrevista ao especial “Onde Investir 2017 – InfoMoney”. Mas sobre essa nova fase em 2019, ele aponta um grande risco: o Brasil eleger um “candidato típico aventureiro, como Ciro Gomes e Jair Bolsonaro”, disse. “Isso realmente poderia gerar uma situação inadministrável para o Brasil”.

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Confira abaixo a entrevista na íntegra com o ex-ministro Maílson da Nobrega:

InfoMoney: Todo mundo achou que o Brasil iria melhorar no pós-Dilma, os indicadores de confiança davam força para esse sentimento, mas após alguns meses essa expectativa se mostrou fracassada. O que ocorreu?

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Maílson da Nobrega: Acho que houve uma expectativa excessiva dos efeitos da saída de Dilma. Era um governo tão desastrado que, se livrar dele, parecia que seria o ponto de partida para uma recuperação muito rápida e forte da confiança e nos primeiros momentos parecia que era isso mesmo. As pesquisas mostravam a confiança voltando e ela é um dos elementos fundamentais para a decisão de investir e de consumir. No entanto, o que está se vendo agora é que esse otimismo foi excessivo, o nível de endividamento das famílias ainda é muito elevado. Acho que ainda vai levar um tempo para vermos uma recuperação mais forte do consumo, para que os empresários se animem a não apenas ocupar a capacidade ociosa, mas a investir. 

O Brasil ainda está imerso em uma grande crise econômica, social e política. Uma herança terrível que veio dos erros cometidos na gestão do PT, especificamente no período de governo de Dilma Rousseff. A percepção recente é que a economia vai conseguir se recuperar, mas a um ritmo muito inferior ao que se imaginava. As projeções para 2017 estão sendo revisadas para baixo e corremos o risco de continuarmos em recessão pelo 3° ano consecutivo, mas acredito que o mais provável é fecharmos com um crescimento de 0,5% no ano que vem. É medíocre, mas é melhor que uma queda de 3% como o estimado para 2016. 

A boa notícia virá do lado da inflação, que deve seguir em declínio, podendo chegar a faixa de 4,5% e 4,8% em 2017. Por outro lado, o desemprego vai continuar alto, já que ele é o último indicador macroeconômico que a se recuperar em uma recessão. A recuperação virá do lado da ocupação da capacidade ociosa. Enquanto o governo está com capacidade ociosa, as empresas não investem. Além disso, não se investe antes de se ter uma razoável convicção de que a recuperação não é episódica, é um fato permanente, que vale a pena arriscar ampliar a capacidade.

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IM: O governo Temer errou em algum momento?

MNNão, pelo contrário. O governo elegeu uma agenda correta, que é a fiscal, e tem feito um trabalho para evitar uma consequência desastrosa de todo os erros cometidos pelo PT, que é evitar a insolvência do governo. Nós estávamos caminhando para uma direção em que o governo poderia não ter condições de pagar sua dívida, o que seria uma catástrofe. Além disso, as expectativas de retomada econômica foram frustradas não por erro do governo, mas porque é muito difícil fazer estimativa depois de uma catástrofe dessas. Eu tinha uma expectativa de crescimento de 1,5% em 2017 e revi para 0,5%. A frustração pegou todo mundo: os melhores analistas, as melhores casas de investimentos, o governo, a imprensa. Todo mundo errou. 

Agora, o governo Temer pode estar cometendo erros de outra natureza, o de comunicação, por exemplo, que não tem sido feita da melhor forma para vender a ideia das reformas. Isso permitiu que se formasse uma oposição à PEC dos gastos, o que é cínico, porque o PT é o principal responsável por esse desastre do país, é um dos causadores dessa situação de calamidade nas contas públicas e que gerou essa necessidade de limitar os gastos. Ou o Brasil fazia essa limitação ou iríamos para uma catástrofe, precisávamos parar o trem desgovernado que estava se transformando o Brasil.

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Mas acho que se tivermos uma continuidade em 2018 e elegermos um presidente responsável, o Brasil vai conseguir se recuperar em alguns anos. O País tem todas as condições para isso, tem um agronegócio competitivo, um judiciário independente, a sociedade está mudando e a imprensa é livre. Isso vai evitar que o Brasil jogue fora todo seu potencial em meio à incapacidade de enfrentar e resolver seus problemas.

IM: O senhor acredita que já exista esse candidato?

MN: Existir, existe, mas temos uma carência de líderes como ocorre no mundo inteiro. Há uma grande escassez de líder no Brasil, mas temos um núcleo razoável de brasileiros, com experiência, que passaram por eleições, que exerceram a carreira política e que podem virar líderes. Claro que é muito difícil fazer projeções em uma crise, já que ninguém sabe quais que sobreviverão à Lava Jato, mas eu não compro a ideia que tem circulado ultimamente de que vamos eleger um desconhecido em 2018, que será um empresário ou alguém de fora do sistema. 

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Para eleger-se presidente no Brasil é preciso reunir 3 fatores: ser um nome nacionalmente conhecido; ter estruturas de diretórios no partido, candidatos a deputado, senador, governador, que trabalhem com ele; e tem que ter tempo de TV e, para isso, precisa de um partido estruturado, com quantidade expressiva de parlamentares. Diferente disso, ocorreria somente se o País passasse por uma catástrofe, semelhante a que estava vivendo na eleição de Collor, em que as pessoas vão buscar um salvador. Só que a experiência mundial mostra que todo salvador dá errado, porque normalmente se elege alguém sem a capacidade política de gerir um país e é sempre polêmico. Um país que dá certo é aquele dirigido pela classe política. Mas, claro, temos exceções, como o caso dos EUA, mas por condições muito particulares nesse momento, que dificilmente se aplicaria ao caso brasileiro. 

Por isso acredito que o próximo presidente da República será um nome conhecido. Não sei dizer qual seria esse nome, mas será alguém já de dentro da classe política.

IM: Então estamos seguros do risco de eleger “salvadores da pátria” em 2018?

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MN: Infelizmente não. A democracia brasileira está consolidada e pode sobreviver às crises. Enquanto as instituições funcionam, as crises são resolvidas, por isso não vejo o risco de haver uma ruptura democrática no Brasil, nem um colapso do sistema político. Acho que a própria crise vai deixar lições e gerar a busca por saídas. 

No entanto, claro que temos o risco de eleger aventureiros e demagogos em momentos turbulentos como este, que prometem mundos e fundos de maneira irresponsável, e isso realmente poderia gerar uma situação inadministrável para o Brasil. Hoje, temos dois candidatos que são exemplos típicos de aventureiros: Ciro Gomes e Jair Bolsonaro. Embora seja um risco pequeno de ocorrer, porque eles não reúnem aquelas 3 questões apontadas acima, eu diria que, para 2018, essa é a grande preocupação. 

Não tenho nada contra eles, pessoalmente falando, mas são demagogos. Esses dias, por exemplo, Ciro Gomes fez um vídeo irresponsável em que dizia que não existia déficit na previdência. Então, milhares de pessoas que estudaram isso durante anos são desonestos, incompetentes? Ele faz isso tudo porque é um demagogo, um aventureiro, um irresponsável e está jogando para obter vantagem de uma população pouco informada.

IM: O senhor vê o Brasil saindo dessa situação com Temer? 

MN: Não, a saída só acontecerá a partir de 2019. O presidente Temer lidera um governo de transição, e a herança que ele recebeu é terrível, ele se enfraqueceu em vários episódios (como o envolvimento de seus ministros na Lava Jato). Temer, no entanto, é um homem muito experiente, que tem uma capacidade grande de avaliar suas próprias condições politicas e é por isso que ele está dizendo que o grande objetivo dele é colocar o País nos trilhos. Eu eu acho que a PEC do Teto e a Reforma da Previdência podem colocar esse trem de volta nos trilhos.

Temer pega o desgaste econômico, mastigam e adota algumas medidas para digerir esses erros, mas uma nova fase começará somente a partir de 2019.

IM: Pegando um gancho com o filme “O Brasil Rico”, lançado recentemente pelo senhor e pela cineasta Louise Sottomaior, o País ainda vai prosperar? E se sim, quando?

MN: O filme entrevistou 36 personalidades no Brasil, como os ex-presidentes Fernando Henrique Cardoso e José Sarney, ex-ministros, ex-presidentes do Banco Central, empresários, banqueiros e economistas. Todos são de opinião unânime que o Brasil tem condições de se tornar um dia um país rico, mas isso depende essencialmente de melhorias expressivas na educação, de esforços para aumentar a produtividade e evitar a insolvência fiscal, além de investimentos em infraestrutura.

O Brasil preserva uma série de condições para constituir uma plataforma para sua recuperação até que se torne um País rico, com instituições fortes, uma democracia consolidada, o agronegócio competitivo, uma indústria diversificada e a imprensa livre. Tudo isso junto pode abrir janelas de oportunidade para o País voltar a trilhar o caminho da prosperidade, do retorno da confiança e do prestígio internacional. O filme discute saídas e o Brasil tem, sim, muitas saídas.