Taxas futuras de juros despencam no Brasil após dados fracos do varejo dos EUA

O adiamento da cobrança de novas tarifas de importação pelo governo Trump foi outro fator de alívio para as curvas de juros nos EUA e no Brasil, assim como o recuo do dólar

Camille Bocanegra

Publicidade

As taxas dos DIs fecharam a sexta-feira em forte queda, superior a 30 pontos-base nos vencimentos mais longos, refletindo o recuo dos rendimentos dos Treasuries após as vendas no varejo dos Estados Unidos caírem mais que o previsto em janeiro.

O adiamento da cobrança de novas tarifas de importação pelo governo Trump foi outro fator de alívio para as curvas de juros nos EUA e no Brasil, assim como o recuo do dólar.

No fim da tarde a taxa do DI (Depósito Interfinanceiro) para janeiro de 2026 — um dos mais líquidos no curto prazo — estava em 14,785%, ante o ajuste de 14,832% da sessão anterior, enquanto a taxa para janeiro de 2027 marcava 14,78%, ante o ajuste de 14,946%.

Continua depois da publicidade

Entre os contratos mais longos, a taxa para janeiro de 2031 estava em 14,53%, em queda de 31 pontos-base ante 14,839% do ajuste anterior, e o contrato para janeiro de 2033 tinha taxa de 14,49%, ante 14,8%.

Na véspera, o governo Trump detalhou um roteiro para aplicar tarifas de reciprocidade contra qualquer país que imponha impostos sobre os produtos norte-americanos. No entanto, as tarifas não entraram em vigor nesta quinta-feira, o que foi visto pelo mercado como uma estratégia do presidente Donald Trump para iniciar negociações comerciais com outros países.

Este adiamento das tarifas pesou sobre o dólar e os rendimentos dos títulos norte-americanos, com reflexos sobre as taxas dos DIs.

Continua depois da publicidade

“Com o discurso um pouco mais leve de Trump e a compreensão de que a guerra comercial seria prejudicial, o mercado avalia que talvez este cenário (de tarifas mais altas) não ocorra tão rapidamente”, comentou Fabrício Voigt, economista da Aware Investments.

A queda das taxas futuras se intensificou no meio da manhã após o Departamento do Comércio dos EUA informar que as vendas no varejo caíram 0,9% em janeiro, depois de um aumento revisado para cima de 0,7% em dezembro. Economistas consultados pela Reuters previam que as vendas no varejo, que são em sua maioria mercadorias e não são ajustadas pela inflação, cairiam apenas 0,1%.

“O grande driver (condutor) hoje foram as vendas no varejo dos EUA, principalmente a parte do grupo de controle, que é como se fosse um núcleo, que veio muito aquém”, pontuou Lais Costa, analista da Empiricus Research.

Continua depois da publicidade

De fato, as vendas excluindo automóveis, gasolina, materiais de construção e serviços de alimentação caíram 0,8% em janeiro, ante projeção de alta de 0,3%, conforme o Departamento do Comércio.

“Este descolamento com as expectativas, não explicado por uma questão sazonal, pareceu ser um sinal sobre a economia dos EUA, e não um ruído”, acrescentou Costa.

Em reação, investidores elevaram as apostas de mais cortes nos juros dos EUA, o que se refletiu também na curva a termo brasileira e na queda firme do dólar ante o real.

Continua depois da publicidade

Para Voigt, da Aware, o recuo das taxas futuras também esteve ligado ao ambiente interno, marcado nos últimos dias pela percepção de desaceleração da economia.

“O mercado já esperava um PIB (Produto Interno Bruto) menor, e agora o governo também passou a enxergar um PIB menor”, pontuou Voigt. Na véspera o ministério da Fazenda alterou sua previsão de crescimento para a economia em 2025 de 2,5% para 2,3%.

“Com o dólar recuando, deve haver espaço para a taxa de juros não crescer tanto. Mas tudo indica que ela vai chegar a 15% — isso dificilmente não ocorrerá, porque a meta de inflação é de 3%”, acrescentou.

Continua depois da publicidade

Pela manhã, durante evento em São Paulo, o presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, demonstrou cautela quanto aos impactos do câmbio na inflação.

“Os modelos têm dispersão considerável sobre o que se espera de transmissão do câmbio para a inflação. A transmissão do câmbio depende muito de o quão aquecida está a atividade e se o movimento de depreciação é contínuo”, disse o presidente do BC.

No mesmo evento, Galípolo disse que o BC tem as ferramentas para perseguir a meta contínua de inflação de 3%, ressaltando que o “remédio” da Selic vai funcionar.

“O mandato do BC é colocar os juros em patamar restritivo suficiente para colocar a inflação na meta. O remédio vai funcionar, o BC tem ferramentas para perseguir a meta”, acrescentou.

Neste contexto, a curva de DIs seguiu precificando elevação de 100 pontos-base da Selic em março, como tem sinalizado o BC, mas no mercado há dúvidas sobre o que a instituição fará a partir do encontro seguinte, em maio.

Na quinta-feira o mercado de opções de Copom da B3 precificava 48,50% de probabilidade de alta de 50 pontos-base da Selic em maio, 18,00% de chances de elevação de 75 pontos-base e 12,00% de probabilidade de alta de 100 pontos-base.

Em relatório desta sexta-feira, o banco Inter reduziu de 15,00% para 14,75% sua projeção para a taxa Selic no fim do atual ciclo de altas, dando como justificativas os sinais de desaceleração da atividade e a acomodação do câmbio.

No exterior, às 16h44, o rendimento do Treasury de dez anos — referência global para decisões de investimento — caía 5 pontos-base, a 4,472%.