Separando o joio do trigo: veja os “tipos” de empresa que mais subiram na Bolsa

Segundo estudo do CSHG, empresas de qualidade e oligopólios foram as que mais subiram na Bovespa nos últimos anos; IPOs, pré-operacionais e estatais caíram

Thiago Salomão

Publicidade

SÃO PAULO – Seja você um investidor experiente e estudado, um profissional da gestão de recursos ou um marinheiro de primeira viagem, é inevitável que já tenha feito escolhas ruins na Bolsa. Ainda que o “perde e ganha” seja algo natural no mundo da renda variável, será que existe uma fórmula para reduzir drasticamente os equívocos ou até mesmo eliminá-los? Investidores experientes sabem que ninguém tem bola de cristal para prever o desempenho futuro das ações, mas, analisando com lupa o desempenho da Bolsa desde a crise de 2008, é possível encontrar grupos de papéis vitoriosos e perdedores que apresentam características comuns.

Um estudo elaborado pela equipe de gestão do Credit Suisse Hedging-Griffo responsável pelo Fundo Verde, o maior “hedge fund” do mundo fora dos Estados Unidos, ajuda a ilustrar como diferentes tipos de ações têm se comportado. O levantamento separa as empresas em seis categorias: “deep value” (empresas negociadas abaixo do valor patrimonial), estatais, “turnaround” (empresas que passaram por reestruturações para tentar melhorar os resultados), pré-operacionais, oligopólios e qualidade (empresas com retorno sobre capital investido, ou ROIC, maior que os custos de capital).

O estudo mostrou que, de 2008 até agosto de 2013, as ações das empresas de qualidade e os oligopólios apresentaram uma valorização média superior a 120%. As estatais e as “deep values”, por sua vez, subiram apenas 37% e 17,8%, respectivamente. No sentido oposto, as “turnarounds” caíram 14% enquanto as pré-operacionais tiveram queda média de 38% (confira tabela) – ou seja, foram os grandes micos do período. Ao apresentar o estudo, o gestor do Fundo Verde, Luis Stulhberger, fez questão de reforçar que o levantamento tem caráter meramente estatístico e não configura indicação de compra ou venda ao investidor.

Continua depois da publicidade

Em busca de qualidades
Alguns fatores são essenciais para definir uma empresa de qualidade. O analista Bruno Gonçalves, da WinTrade, diz que o primeiro deles é a governança corporativa. Quanto mais transparente for o relacionamento da empresa com o mercado, mais protegido o investidor ficará de possíveis erros de percurso que não possam ser previstos. O Novo Mercado é segmento da Bovespa com o nível mais avançado em termos de governança corporativa porque obriga a companhia a adotar importantes ferramentas de defesa ao investidor, tais como o “tag along” de 100% (em caso de mudança no controle acionário da empresa, o acionista minoritário tem direito de vender suas ações pelo mesmo preço pago ao controlador) e a exigência de pelo menos 20% de membros independentes na composição do conselho de administração. Gonçalves aponta a Natura como uma empresa que se destaca no quesito de governança.

O segundo fator importante está associado aos administradores da empresa: ter profissionais comprometidos e com histórico de sucesso liderando companhias é essencial para trazer segurança aos investidores, sobretudo em momentos de turbulência na economia. Um caso emblemático no Brasil é o da Ambev, liderada pelos empresários Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Beto Sicupira.

Embora um bom time de gestores e um relacionamento transparente com o mercado sejam essenciais para uma empresa de qualidade, de nada servirão se não se traduzirem em bons resultados. Então o investidor também precisa estar atento às companhias que entregam crescimento de receita e ganhos constantes de margem de lucro. Analisar como elas costumam reagir em cenários econômicos adversos também é importante. “Previsibilidade de resultados e crescimento constante são fatores imprescindíveis”, afirma Gonçalves. Ele destaca a Souza Cruz, que nos últimos anos tem conseguido entregar maiores margens mesmo com queda no volume de vendas de seu principal produto, o cigarro.

Continua depois da publicidade

Cuidado com o “timing”
Antes de o investidor sair comprnado um conjunto de ações de empresas de qualidade e de oligopólios que nem louco, é importante ter em mente que toda essa filtragem não irá impedir que, vez ou outra, sejam escolhidos papéis que não trarão um resultado positivo. O sucesso de um grupo de empresas no passado não pode ser encarado como garantia de que essas companhias continuem a trazer lucros no futuro. “O investidor precisa entender que cada caso é um caso”, afirma Pedro Galdi, analista-chefe da SLW Corretora. Ele usa como exemplo as estatais, que, embora carreguem uma dose maior de risco pelo fato de serem mais vulneráveis a intervenções do governo, podem se tornar uma boa escolha em determinado momento da economia ou do setor em que atuam.

Isso porque existe um fator que não deve ser negligenciado: o “timing” de mercado. É ele que pode fazer você comprar uma “empresa ruim” em um ótimo momento – ou seja, quando ela está tão desvalorizada que as chances de novas quedas se tornam menores. É o mesmo “timing”, contudo, que pode levá-lo à compra de uma “boa empresa” em uma péssima hora, que seria quando a ação já subiu demais, inibindo novas altas. Como não é segredo para ninguém que a Natura, a Ambev e a Souza Cruz são excelentes companhias, são raros, na verdade, os momentos em que os investidores têm a oportunidade de comprar seus papéis por preços baixos.

Também é importante entender que em momentos de forte euforia no mercado – como entre 2003 e a metade de 2008, quando o Ibovespa subiu 540% – as ações mais arriscadas apresentaram uma arrancada mais forte que papéis de empresas de qualidade. “Tentar separar as empresas na hora de investir é um bom primeiro passo na hora de compor o portfólio. Mas é importante ter em mente que esse tipo de análise é bastante relativo”, diz o analista-chefe da SLW. É imprescindível, portanto, entender se o mercado vive um momento de aumento ou redução do apetite ao risco e, de acordo com essa visão, incluir na carteira ações defensivas ou agressivas.

Continua depois da publicidade

Desempenho das 6 categorias de empresa:

Tipo de empresa Definição Desempenho*
Oligopólio Empresas com market share
relevante nos setores em que atuam
138%
Qualidade Empresas com ROIC maior que os custos
de capital e elogiadas por analistas
121%
Estatais Empresas que possuem o governo
como acionista majoritário 
37%
Deep Value Empresas negociadas abaixo do
valor patrimonial
17,8%
Turnaround Empresas que passaram por mudanças
para melhoria de resultados 
-14%
Dream Cap Empresas pré-operacionais -38%
Ibovespa Principal índice de ações da bolsa brasileira -21%
Fonte: estudo feito pelo Credit Suisse Hedging-Griffo e apresentado pelo gestor Luis Stulhberger durante o 6º Congresso Internacional de Mercados Financeiro e de Capitais, organizado pela BM&FBovespa e realizado em Campos de Jordão no final de agosto.
*Números relativos ao período entre 2008 e 20 agosto de 2013

Por que ter medo?

ESTATAIS
Essas empresas já vêm com um pênalti em seu preço pelo fato de, vez ou outra, o governo acabar usando-as para outros objetivos que jogam contra o aumento do retorno ao acionista. Se você comparar os múltiplos do Banco do Brasil com os do Itaú Unibanco ou do Bradesco, verá que a ação da estatal apresenta um desconto. O múltiplo mais baixo indica que o investidor só compra a ação do BB se ela estiver mais barata que as dos concorrentes privados.

Continua depois da publicidade

PRÉ-OPERACIONAIS
O mercado de renda variável já é por si só arriscado, mas essas empresas embutem uma dose maior de incerteza justamente pelo fato de não entregarem resultados no presente. O caso mais emblemático é o da OGX, que, em poucos anos, passou de empreendimento com enorme potencial de reservas de petróleo a uma companhia endividada e praticamente insolvente. Quem comprou os papéis com expectativa de longo prazo só tem a lamentar: em apenas três anos, as cotações despencaram de R$ 23 para cerca de R$ 0,20.

IPO
Empresas que abrem o capital já dão a largada na bolsa com algumas desvantagens: a ausência de histórico torna muito mais difícil o exercício de projetar quais serão os próximos passos da companhia e o futuro de seus resultados. Mesmo analistas experientes têm mais dificuldade em avaliar se a ação está ou não precificada de maneira justa – em outras palavras, se está cara ou barata. “No caso dos IPOs, o investidor precisa fazer a lição de casa: conhecer bem a empresa, estudar seus balanços e entender o negócio”, diz Gonçalves.

Essa matéria foi publicada na edição 47 da revista InfoMoney, referente ao bimestre novembro/dezembro de 2013. Para tornar-se um assinante da revista, clique aqui.

Thiago Salomão

Idealizador e apresentador do canal Stock Pickers