Trump “light” com tarifa, efeito Datafolha: por que Ibovespa e real saltaram nesta 6ª

Visão é de que anúncio de tarifas abriu margem para negociações; no fim da sessão, Datafolha mostrando queda de popularidade de Lula impulsionou mais os ativos

Lara Rizério Agências de notícias

Painel de cotações na B3. Fonte: Amanda Perobelli/REUTERS
Painel de cotações na B3. Fonte: Amanda Perobelli/REUTERS

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Ibovespa e real em alta forte, em meio a um noticiário movimentado, que começou e terminou com as tarifas de Donald Trump e que encerrou também com o Datafolha, mostrando uma forte queda da popularidade do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

A semana foi marcada por novos anúncios de tarifas feitas por Trump, presidente dos EUA, trazendo a princípio impactos mais diretos para as companhias brasileiras do que as declarações voltadas a outros países num primeiro momento. No início da semana, houve o anúncio do tarifaço, agora de 25%, sobre todas as importações de aço e alumínio de vários países (podendo incluir o Brasil) para os Estados Unidos. As tarifas devem entrar em vigor em 12 de março.

Já na última quinta-feira, a Casa Branca anunciou a implementação de tarifas comerciais recíprocas contra países que taxam os Estados Unidos. Em documento distribuído nesta quinta-feira, a Casa Branca menciona o etanol brasileiro como um dos possíveis alvos das mudanças a serem feitas pelo governo norte-americano. As tarifas não entrarão em vigor imediatamente, sendo uma medida intencional para dar tempo aos países que devem ser impactados negociar novos termos comerciais com os EUA, disse um funcionário da Casa Branca. Howard Lutnick, indicado de Trump para secretário de Comércio, apontou que o governo abordaria cada país afetado um por um e que os estudos sobre o assunto seriam concluídos até o começo de abril.

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Neste cenário, ao contrário do que poderia parecer num primeiro momento, o mercado brasileiro reagiu relativamente bem aos vários anúncios do presidente americano. No acumulado da semana até o início da tarde desta sexta, o Ibovespa avançava cerca de 1,6% e voltava aos 126 mil pontos, enquanto o dólar caía por volta de 1,2%, na casa dos R$ 5,72.

O benchmark da Bolsa, por sua vez, passou a acelerar no fim da tarde de sexta, por volta das 16h (horário de Brasília), fechando o dia com salto de 2,70% na sessão e ultrapassando os 128 mil pontos, enquanto o dólar chegou a cair 1,26% e fechou abaixo dos R$ 5,70 pela primeira vez em 3 meses. Na semana, a queda da moeda americana foi de 1,65%, enquanto o benchmark da Bolsa saltou 2,90%.

Além do efeito Trump, o mercado reagiu ao Datafolha, que mostrou que a aprovação de Lula caiu para 24%, em seu pior patamar de todos os seus mandatos. Assim, o mercado reagiu à possibilidade de renovação política nas proxímas eleições, indicando que 2026 já está no radar dos investidores, conforme ressaltou Alexandre Viotto, chefe da mesa de câmbio da EQI Investimentos.

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Nesta sexta, o mercado também repercutiu os dados fracos de vendas no varejo dos Estados Unidos, que caíram mais que o previsto em janeiro, levando a uma queda dos juros futuros.

Impactos limitados sobre siderúrgicas

Voltando às tarifas de Trump, sobre as siderúrgicas, num primeiro momento, o impacto negativo nas ações sobre o tema não foi tão grande, uma vez que a visão é de que afetará a princípio pouco para a maior parte das empresas listadas.

Em relatório, a XP Investimentos nota que os potenciais impactos nas empresas sob a sua cobertura – Gerdau (GGBR4), CSN (CSNA3), Usiminas (USIM5) e CBA (CBAV3) – são relativamente baixos.

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Em relação à Gerdau, observa uma exposição limitada a exportações para o mercado dos EUA, além de ser diretamente beneficiada pela presença fabril que possui no país (uma vez que a redução potencial na oferta de importação poderia implicar em uma melhor posição de preços). Com isso, o impacto seria até mesmo positivo.

Em termos relativos, as empresas mais negativamente impactadas poderiam ser a CSN e a CBA – no entanto, as exportações como percentual das receitas consolidadas são relativamente baixas (abaixo de 4%), limitando os potenciais riscos de redução das exportações para o país.

Maior flexibilidade

Mais um outro motivo levou a uma reação relativamente tranquila dos investidores – e que vem marcando o desempenho desde os primeiros anúncios sobre tarifas do Trump.

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A visão é de uma postura mais flexível de Donald Trump sobre as tarifas. No caso das recíprocas, elas entram em vigor no início de abril, permitindo negociações antes de decisões definitivas, conforme ressalta o analista de mercado da Stonex, Leonel Mattos. “As tarifas sobre aço e alumínio também só entram em vigor em 30 dias”, destaca.

“O mercado de câmbio acompanha a queda externa do dólar, por conta da postura mais flexível de Donald Trump sobre tarifas recíprocas, que entram em vigor no início de abril, permitindo negociações antes de decisões definitivas”, afirma o analista de mercado da Stonex, Leonel Mattos. “As tarifas sobre aço e alumínio também só entram em vigor em 30 dias”, reforça.

Assim, o anúncio de Trump foi considerado mais uma orientação para que sua equipe comercial e econômica estude as tarifas e outras barreiras comerciais impostas sobre os EUA, sem a apresentação de nenhuma medida recíproca específica.

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Com isso, os mercados entenderam que o posicionamento de Trump abriu espaço para negociações e acordos com os países na mira dos EUA, o que possibilita que as tarifas recíprocas a serem anunciadas à frente podem ser mais moderadas do que o esperado ou até mesmo nem ocorrerem. Uma vez que muitos investidores vinham precificando um anúncio mais agressivo por parte de Trump, o dólar arrefeceu entre outras moedas.

De olho nos impactos

Ainda que as primeiras reações sejam relativamente positivas, o mercado segue acompanhando de perto os impactos das tarifas para o Brasil.

O Bradesco apontou em estudo que as tarifas de 25% sobre as importações dos Estados Unidos de aço teriam impacto de até US$ 700 milhões nas exportações do Brasil. O levantamento aponta que o Brasil exportou US$ 4,1 bilhões em aço, ou 5,8 milhões de toneladas, aos EUA em 2024.

Por outro lado, não seria surpresa o impacto ser “mitigado” por conta das características dos produtos de aço que o Brasil exporta para os EUA. “A maioria é composta por produtos semi-acabados de aço, que servem de insumo para a indústria norte-americana e tendem a ter uma elasticidade de preço menor do que a usual”, ressaltou o banco.

Já sobre as tarifas de reciprocidade, a Capital Economics apontou que o Brasil está entre os mais afetados pelas medidas.

Conforme a consultoria, pelas regras de reciprocidade tarifária é preciso considerar não só a média das taxas que outros países aplicam às exportações dos EUA, mas também o Imposto sobre Valor Agregado (IVA) cobrado sobre essas exportações americanas. Assim, se os EUA decidirem aplicar tarifas equivalentes, que combinem tanto as taxas de IVA quanto as tarifas comuns, o Brasil (28%) estaria entre os mais afetados.

Na visão de Pedro Moreira, sócio da One Investimentos, empresas de commodities, como de mineração e aço, petroleiras, etanol e café devem ser as maiores afetadas caso as tarifas sejam implementadas.

Inclusive, ao anunciar a implementação de tarifas comerciais recíprocas, a Casa Branca mencionou o etanol brasileiro como um dos possíveis alvos das mudanças a serem feitas pelo governo norte-americano.

“Há inúmeros exemplos em que nossos parceiros comerciais não dão tratamento recíproco aos Estados Unidos. A tarifa dos EUA sobre o etanol é de apenas 2,5%. No entanto, o Brasil cobra uma tarifa de 18% sobre as exportações de etanol dos EUA. Como resultado, em 2024, os EUA importaram mais de US$ 200 milhões em etanol do Brasil, enquanto os EUA exportaram apenas US$ 52 milhões em etanol para o Brasil”, diz o memorando distribuído pela Casa Branca.

Já segundo a Amcham Brasil, apesar de Trump ter mencionado o Brasil como um dos países que serão alvo de tarifas de importação “recíprocas”, quase a metade das vendas de produtos norte-americanos ao mercado brasileiro é livre de tarifas, segundo a Amcham Brasil.

A câmara de comércio explica que a tarifa média de importação aplicada pelo Brasil ao mundo é de 12,4%, mas que para produtos dos Estados Unidos ela cai a apenas 2,7%. Isso porque 48% das exportações do país entram no território brasileiro sem tarifas, e outros 15% estão sujeitos a alíquotas de no máximo 2%.

Em meio a tantas incertezas, a visão é de que o Brasil não é uma prioridade para os EUA e o que pode haver é uma negociação de cotas em determinados produtos, o que gera maior tranquilidade. Contudo, a depender das declarações de Trump, a volatilidade deve entrar no radar.

(com Reuters e Estadão Conteúdo)

Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.