Risco Brasil flerta com maior patamar em 8 meses, com fiscal e falas de Lula

Incertezas sobre gastos públicos e nova presidência do BC pesam sobre ativos brasileiros, elevando prêmio de risco pago por estrangeiros

Vitor Azevedo

(Shutterstock)
(Shutterstock)

Publicidade

O Risco Brasil, índice que mede o quanto o mercado enxerga a possibilidade de o país não honrar seus compromissos financeiros, vem nas últimas semanas flertando com os seus maiores níveis desde novembro de 2023. 

Nesta quarta-feira (26), o risco escalou, um pouco mais, acompanhando a alta do dólar, que superou os R$ 5,50, em meio a falas do presidente Lula, evitando sinalizar corte de gastos e ressaltando que a troca da presidência do Banco Central “não será indicada pelo mercado”.

“O Credit Default Swap [CDS], que pode ser traduzido como um swap [troca] de crédito para inadimplência, é um derivativo baseado na dívida de um país. Em resumo, trata-se de um seguro contra a inadimplência de suas emissões”, explica Alexandre Dellamura, mestre em economia e head de conteúdo da Melver.

Continua depois da publicidade

Assim, quanto maior a pontuação de um CDS, mais os credores de títulos de um país pagam para proteger os seus valores a receber. Essa alta, em suma, indica uma piora na percepção de risco dos investidores

Baixe uma lista de  10 ações de Small Caps que, na opinião dos especialistas, possuem potencial de crescimento para os próximos meses e anos

Dellamura lembra que os CDS para o Brasil iniciaram 2024 a 131,47 pontos, mas passaram a subir de forma marcante em abril, quando alcançaram 163,10 pontos. Em maio, eles chegaram a cair, mas hoje voltaram ao patamar dos 163 pontos. 

Continua depois da publicidade

Risco fiscal brasileiro. Imagem: reprodução Bloomberg

Questões internas impulsionam risco Brasil

Rodrigo Melo, estrategista do ASA Hedge, explica que a alta do CDS se dá por vários fatores. A deterioração da política fiscal talvez seja a principal no cenário interno. 

Fatores como a revisão das metas de superávit, mudança na presidência da Petrobras (que vem ajudando as contas da União por meio dos dividendos) e dificuldades em compor receita (como, por exemplo, a MP das Compensações sendo devolvida) são algumas das explicações recentes.

Neste cenário, com as contas públicas piores, é claro que o risco de o governo não “dar conta” dos seus compromissos é maior. Fora que a própria piora fiscal impulsiona as taxas de juros, com investidores querendo maiores retornos para os maiores riscos. Taxas de juros maiores, por si só, geram mais gastos. 

Continua depois da publicidade

Ao mesmo tempo, o carry está em patamar mais baixo (com diferencial de juros entre Brasil e Estados Unidos menor), “já não aguentando desaforos”, segundo o especialista da ASA. 

Troca no Banco Central

Por fim, ele cita também que a mudança na presidência do Banco Central, com o mandato de Roberto Campos Neto previsto para acabar no final do ano, também gera ruído.

A visão do mercado é que se a mudança do BC levar a uma derrubada forçada da Taxa Selic, a inflação deve acelerar diminuindo o juro real pago pelos títulos brasileiros e gerando, no longo prazo, taxas ainda mais altas. 

Continua depois da publicidade

Fator Lula

Felipe Pontes, da Avantgard Asset Management, menciona que nesta quarta-feira (26), falas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ajudaram a impulsionar o Risco Brasil.

“É difícil isolar o efeito das falas de Lula hoje, mas as preocupações com o futuro dos gastos públicos e o risco fiscal que sempre estão nos atormentando e foram reforçadas hoje cedo pelo presidente quando falou que o ‘tema fiscal’ é mais forte aqui no Brasil do que em outros países e que não é verdade que o governo brasileiro esteja gastando demais, por exemplo. Isso reforça as preocupações com o cenário fiscal, porque o presidente parece não entender o tamanho do problema”, diz. 

EUA também ajudam

Fora as questões internas, as externas também elevam o risco Brasil. “Lá fora, ajuda a explicar (o risco) a alta da inflação, mais persistente nos EUA, sugerindo que o FED deve demorar mais a cortar juros”, comenta Melo, da ASA.

Continua depois da publicidade

Além disso, ele cita algumas eleições que “não foram bem digeridas” por investidores, como no México, que pode mostrar uma tendência “mais populistas no mundo”.

E prossegue: “Assim, como o prolongamento de déficits fiscais relativamente grandes para o ponto em que estamos no ciclo (desemprego relativamente baixo para um resultado fiscal bem ruim), principalmente nos EUA”.

Por fim, juros mais altos nos Estados Unidos, seja pela inflação ou mesmo pela deterioração das contas públicas por lá, ajudam a segurar as taxas brasileiras em níveis mais elevados. Os treasuries americanos são considerados “ativos livre de risco”, servindo de parâmetro para qualquer decisão de investimento. 

Se as suas taxas aumentam, as demais – sobretudo de países emergentes – também tendem a aumentar.

“Tudo isso leva o governo a gastar mais e parece que ele não se preocupa tanto com essa relação dívida versus PIB. Então, apesar de a gente ter ainda uma inflação relativamente controlada e um PIB positivo, as projeções não estão tão animadoras assim pensando lá na frente”, menciona Marco Noernberg, líder de renda variável da Manchester Investimentos.