Revisão do FGTS pelo Supremo: o que está em jogo para as ações de construtoras de baixa renda?

Tema deve ser alvo de deliberação pelo STF nesta quinta, com possíveis impactos negativos para o Minha Casa Minha Vida; veja no que ficar de olho

Lara Rizério

Reprodução / Pixabay
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Um tema que tem ganhado destaque nos últimos dias para as construtoras de baixa renda é a revisão da política de correção monetária do FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço) pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que deve ser deliberada nesta quinta-feira (20).

Os ministros podem determinar que os valores nas contas do FGTS deveriam ter sido corrigidos sempre para um índice de inflação (IPCA-E ou INPC, ainda incerto), não pela Taxa Referencial (TR) — como ocorre desde o início dos anos 1990. A ação foi proposta pelo partido Solidariedade e tramita no Supremo desde 2014.

De acordo com analistas, se houver alterações na referência para a correção, o impacto pode ser negativo para o programa habitacional Minha Casa, Minha Vida (MCMV), potencialmente causando mudanças significativas devido à menor diferença entre a correção monetária do fundo e as taxas de juros imobiliárias (principal aplicação dos recursos do FGTS).

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Isso pressionaria ações de empresas de construção voltadas à baixa renda, como Tenda (TEND3), Cury (CURY3), Plano&Plano (PLPL3), MRV (MRVE3) e Direcional (DIRR3) que, inclusive, já sentiram o impacto dos rumores sobre as possíveis decisões dos ministros nesta semana.

Com base nisso, o Itaú BBA destacou alguns pontos sobre o que pode ser decidido no STF, após reunião com Flavia Maia, especialista em judiciário com foco no Supremo, para entender os próximos passos.

Os analistas do setor saíram da reunião com as seguintes impressões gerais:

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i) embora se espere que o assunto seja debatido nesta quinta-feira, pode demorar algum tempo até que uma decisão seja anunciada (tema complexo, muitas partes envolvidas, risco de pedido de vista) – mas não vai ser por tempo indeterminado (os atuais e próximos presidentes do STF sabem de sua importância);

ii) um resultado modular é mais provável em caso de alteração (sem efeito retroativo, preservando a saúde do FGTS, mas alterando o índice de correção para o futuro);

e iii) se a medida for aprovada, sua implementação pode levar tempo (o STF pode deixar os próximos passos para o Executivo).

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Dito isso, as preocupações com possíveis mudanças no FGTS e seu eventual impacto no mercado imobiliário aumentaram, exigindo que os analistas acompanhem o debate de perto e com atenção.

A especialista observou que apenas a maioria simples dos ministros do STF é necessária para aprovar a revogação ou preservação da taxa referencial do FGTS. No entanto, se os ministros votarem para revogar, a aprovação de seu efeito retroativo requer maioria de dois terços (de dez votantes).

Caso o tribunal chegue a uma decisão nos próximos dias, os interessados podem recorrer. Se a decisão for contra manter a TR, a decisão só produziria efeitos depois que todos esses processos (incluindo uma decisão sobre uma possível moção de esclarecimento) estejam totalmente concluídos.

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Flavia Maia também mencionou que, dado o baixo quórum observado esta semana e a proximidade do feriado, um
adiamento se torna mais provável. Existe também a possibilidade de um dos ministros solicitar um pedido de vista (mais tempo para revisar os autos), o que poderia atrasar uma decisão por até 90 dias.

O relator do caso, ministro Luís Roberto Barroso, provavelmente votará contra a taxa de referência, como já chegou a ser noticiado, com a nova alíquota se tornando válida a partir do momento da decisão – ou seja, sem efeito retroativo. A especialista não tem muita visibilidade sobre as posições dos demais ministros.

O Itaú BBA destaca que os principais pontos que sustentam a manutenção da TR são: i) o fato de o FGTS ter retornado rentabilidade superior ao IPCA entre 2017 a 2023; ii) as graves consequências que esta mudança pode ter para o MCMV; e iii) a incerteza sobre se esta determinação deve ser feita pelo Judiciário ou pelo Legislativo.

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Antes do caso do Supremo Tribunal Federal, o Superior Tribunal de Justiça votou a favor da manutenção da TR. Segundo  Flavia Maia, antes de chegar ao Supremo Tribunal Federal, este caso foi decidido pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), que decidiu pela manutenção da TR, alegando que a questão não era da competência do Judiciário.

Em relatório desta semana, a XP apontou que, “embora vejamos incerteza sobre a decisão do STF no processo, destacamos que os impactos negativos no FGTS poderiam causar pressão contra a decisão, em nossa opinião. Além disso, a grande mudança nos custos de aquisição do FGTS (TR para Inflação) pode impactar negativamente o programa habitacional Minha Casa, Minha Vida, potencialmente causando mudanças significativas devido à menor diferença entre a correção monetária do fundo e as taxas de juros imobiliárias (principal aplicação dos recursos do FGTS)”.

Para o Bradesco BBI, as notícias desta semana trazendo a possibilidade de o ministro Luís Roberto Barroso se tornar favorável à mudança geram mais preocupações sobre o caso.

“O julgamento do FGTS no Supremo Tribunal Federal é aguardado há muito tempo, e um daqueles casos em que o pior cenário é política e financeiramente tão negativo que parece improvável, pois provavelmente levaria o programa MCMV a encolher significativamente. Embora nada esteja decidido ainda, isso deve continuar sendo uma ‘pendência’ para as ações de baixa renda até que o julgamento seja concluído”, afirmam os analistas.

Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.