Queimadas pelo Brasil e seca histórica: como e quais empresas da Bolsa são afetadas?

De seguradoras a empresas de transportes e agro, analistas traçam perspectivas para as companhias com o clima atípico

Lara Rizério

Publicidade

O tempo quente fora de época e as queimadas assolando o Brasil são destaques há várias semanas no noticiário, trazendo consequências na geração de energia e na produção das safras, o que já é monitorado de perto pelos analistas. O governo tenta se movimentar na questão do clima para além do discurso e anunciou Medida Provisória para enfrentar emergência climática.

O Bank of America (BofA) ressalta que o Brasil pode enfrentar uma onda de calor severa de setembro a novembro, com mais de 50% de probabilidade de: 1) altas temperaturas, 2) baixa precipitação nas regiões Sudeste e Centro-Oeste. Esse cenário marca o fim da estação seca do Brasil, que já figura entre as secas mais severas da história.

Os analistas discutiram as possíveis implicações em vários setores, sem desconsiderar a falta de visibilidade sobre a próxima temporada de chuvas (entre dezembro e abril).

Continua depois da publicidade

O impacto a curto prazo é mais provável nos setores de utilities (concessões de energia), além do impacto macro (por meio da aceleração da inflação).

Uma seca prolongada pode representar ainda riscos para a agricultura e transporte. Com base nisso, analistas de mercado têm traçado como essas alterações climáticas afetam os preços no geral quanto empresas específicas que fazem parte da Bolsa brasileira – e vários segmentos estão no radar. Confira abaixo:

Macro: riscos de piora da inflação


Com o agravamento da seca e redução do nível dos reservatórios, a expectativa é de maior uso das térmicas para geração de energia. Quanto à inflação, o maior despacho térmico será coberto por tarifas adicionais (“bandeiras”).

Continua depois da publicidade

Esses custos terão um impacto de 28 pontos-base sobre o IPCA mensal de setembro, mas o BofA não espera encargos adicionais a partir de dezembro (“bandeira verde”), não ocorrendo assim impacto na inflação de 2024. Em termos de atividade, o principal risco seria para a agricultura, citando principalmente as culturas de soja e milho.

Concessões de serviços públicos: preços mais altos limitando riscos de oferta

O período de seca e a forte demanda por energia podem ter duas implicações, aponta o BofA: 1) preocupações com a oferta, uma vez que a energia hidrelétrica representa 2/3 da matriz energética do Brasil, 2) preços de energia, já que o despacho térmico substitui a hidrelétrica, como já destacado acima. Em relação ao primeiro ponto, o banco vê riscos limitados, dado que setembro-novembro representa 9% do reservatório anual de água, e tem havido um despacho de 5 GW (gigawatt) em capacidade térmica flexível (7% da demanda). Ou seja, ainda é um cenário visto como administrável. Quanto ao segundo ponto, o BofA espera preços à vista superiores a R$ 200/MWh (megawatt/hora) até o final de 2024 e preços provavelmente mais firmes em 2025, o que deve beneficiar os geradores de energia.

Entre as empresas de energia, o Bradesco BBI também destaca a Eneva (ENEV3) sendo uma possível beneficiária com o aumento dos despachos térmicos com a previsão de chuvas fracas, com o Operador Nacional do Sistema (ONS) optando por mais despacho térmico.

Continua depois da publicidade

Agronegócio: impacto limitado nas culturas de grãos, por enquanto


Temperaturas mais altas e precipitações abaixo da média em setembro devem ter um impacto limitado no plantio das culturas de verão 24/25 no Brasil. Apenas 4% da soja é plantada em setembro, ante 57% em outubro.

As previsões apontam para chuvas mais regulares em outubro. Mas, se a seca persistir, há um risco aumentado para os rendimentos da soja e o plantio do milho da segunda safra em 2025. Consultores esperam uma produção de soja de 165 milhões de toneladas (+12% ano a ano) e 125 milhões de toneladas de milho (+4% ano a ano), destaca o BofA.

Para o segmento de açúcar e álcool, em outro relatório desta semana, o time de análise do BofA destacou ainda que os volumes de moagem de cana no Brasil ficaram abaixo das expectativas devido ao clima seco e os recentes incêndios florestais no estado de São Paulo devem levar a uma produção ainda menor. Se por um lado a produção é menor, por outro isso deve sustentar os preços das commodities. Assim, o banco americano reiterou recomendação de compra para São Martinho (SMTO3) e Raízen (RAIZ4).

Continua depois da publicidade

Transporte: rendimentos e volumes e risco?


Em um cenário pessimista de perda de safra para a soja e atraso no plantio do milho em 2025, o BofA acredita que os volumes e/ou rendimentos da Rumo (RAIL3) e Hidrovias do Brasil (HBSA3) podem ser afetados.

Ambas as empresas mencionaram que negociações com empresas de trading podem ser adiadas para o final do ano, mas nenhuma delas espera atualmente rendimentos mais baixos. “Em nossa visão, isso pode levar a mais volumes no mercado à vista para o próximo ano, o que não é necessariamente negativo para os preços, mas aumenta os riscos de volume/preço”, avalia.

Seguradoras

Olhando para o futuro, as temperaturas ainda altas nas próximas semanas provavelmente reforçarão as incertezas em relação a incêndios adicionais. No entanto, o evento levou a uma maior demanda por produtos de seguros, que também se concentraram nos segmentos rural e patrimonial.

Continua depois da publicidade

Na avaliação do Bradesco BBI, ainda é muito cedo para avaliar o impacto total dos incêndios no estado de São Paulo. No entanto, ressalta que a alta participação de resseguradores no segmento rural deve ajudar a suportar a mitigação dos sinistros totais para as seguradoras, sendo que a BB Seguridade (BBSE3) provavelmente será a principal empresa afetada por tais eventos em sua cobertura.

Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.