Quais ações ganham e quais perdem com o corte de juros nos EUA e a alta no Brasil?

Analistas de mercado veem impacto líquido no geral positivo para a Bolsa brasileira, mas veem que nem todos setores podem se beneficiar

Camille Bocanegra

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Ontem, o Federal Reserve iniciou seu ciclo de cortes nas taxas de juros dos Estados Unidos. Conforme o antecipado já há alguns dias por analistas, o ajuste foi de 0,50 ponto percentual (p.p.). Por aqui, a decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central também veio dentro das expectativas e aumentou a taxa básica de juros em 0,25 p.p., levando a Selic ao patamar de 10,75% ao ano.

Apesar de já antecipadas, as decisões devem mexer os ponteiros dos investidores, sendo que a do Fomc levou a uma forte volatilidade dos mercados acionários logo após a decisão na tarde de quarta, com os investidores também digerindo as falas de Jerome Powell, presidente do Fed. Enquanto isso, o mercado analisa se a alta de juros no Brasil pode afastar os investidores da renda variável ou se pode aumentar a atratividade por sinalizar compromisso com o controle da inflação.

No geral, a expectativa de analistas é que o impacto positivo do corte de juros dos EUA deva prevalecer e, inclusive, ajudar estrangeiros a manter aportes na Bolsa.

Porém, nem todas as companhias da Bolsa devem se beneficiar nesse cenário de alta de juros aqui e queda lá fora. Desta forma, quais papéis se beneficiam da movimentação de juros vista ontem e quais são prejudicados?

De acordo com especialistas ouvidos pelo InfoMoney, setores como utilities (em especial, companhias de energia elétrica) e bancos podem se beneficiar de taxas mais altas. Recentemente, o Bank of America (BofA) acrescentou também telecomunicações, transporte e shoppings dentre os setores que podem se dar bem com o cenário desenhado ontem.

Para Enrico Cozzolino, sócio e head de análises da Levante Investimentos, Cemig (CMIG4) e Bradesco (BBDC4) se destacam entre os nomes que podem se beneficiar. Em sua visão, o setor elétrico e eventualmente bancos vivem melhor momento nesse cenário. Ainda que a subida de juros por aqui seja prejudicial para a Bolsa normalmente, Cozzolino destaca que a inflação dentro da meta é muito mais importante. Dentre os nomes mais prejudicados, destaca construtoras como Eztec (EZTC3) e Cyrela (CYRE3).

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A Hike Capital sustenta que, na queda de juros nos EUA, companhias de commodities serão favorecidas, em especial as que não fazem hedge integral contra oscilações da matéria prima, juntamente com empresas fazem maior uso de endividamento estrangeiro. “Dentre elas, mencionamos empresas como a Marfrig (MRFG3), JBS (JBSS3), Klabin (KLBN11), Suzano (SUZB3), assim como os bancos com elevado grau de solvência, como Banco do Brasil (BBAS3) e Itau (ITUB4), com reflexo na redução do custo de capital deles”, afirma Ângelo Belitardo, gestor da Hike Capital.

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Por outro lado, com a visão de dólar mais fraco pelo movimento de carry trade (em que o investidor toma dinheiro emprestado barato em moeda forte e depois investe em outra com rendimentos mais elevado), empresas de exportação como as mencionadas por Belitardo e também a Minerva (BEEF3) podem entrar no grupo de menor interesse de investidores, segundo aponta Gustavo Cruz, estrategista chefe da RB Investimentos. Este pode ser um contraponto que torna o impacto neutro.

Olhando pelo aspecto da alta de juros no Brasil, empresas como a Porto Seguro (PSSA3) se beneficiam, assim como Bradesco e Banco do Brasil, na visão de Cruz.

A Hike destaca que o conselho por conta dos juros mais altos no Brasil é adquirir papéis de empresas com nível de alavancagem inferior a 2 vezes a dívida líquida sobre o lucro antes de juros, impostos, depreciações e amortizações (Ebitda, na sigla em inglês). Além disso, Belitardo avalia que pode valer a pena priorizar na B3 setores da economia cuja receita reflita consumo obrigatório e constante – ou seja, os chamados “portos seguros” da Bolsa. O gestor cita a Sanepar (SAPR11), Copasa (CSMG3), Sabesp (SBSP3), CPFL (CPFE3) e Cemig (CMIG4), de utilities; Mills (MILS3), companhia de logística; Banco do Brasil (BBAS3), BB Seguridade (BBSE3) e Caixa Seguridade (CXSE3), do setor financeiro e; por fim, a CSN Mineração (CMIN3).

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“Acreditamos que essas companhias sejam as melhores oportunidades para uma eventual piora no cenário econômico local, dado que mesmo em um cenário turbulento, elas irão continuar entregando margens de lucro consistentes e elevadas assim como robustos ganhos de escala em seus modelos de negócio”, sustenta.

Para Alex Carvalho, analista CNPI da CM Capital, a PRIO (PRIO3), a Braskem (BRKM5), Gerdau (GGBR4) e a BrasilAgro (AGRO3) são nomes que poderão se destacar positivamente no cenário atual. Carvalho destaca que a moeda local mais forte pode tirar parte da pressão sobre a inflação e garantir também desempenho mais positivo para serviços públicos.

Já na ponta negativa, o gestor considera que companhias muito alavancadas e com baixas margens de lucro, como DASA (DASA3), Kora Saúde (KRSA3) e Mater Dei (MATD3) podem se prejudicar. Belitardo também cita empresas com receita cíclica e vulnerável ao comprometimento de renda disponível, como nomes do varejo. Dentre eles, cita Magazine Luiza (MGLU3), Casas Bahia (BHIA3), Lojas Quero-Quero (LJQQ3) e Natura (NTCO3), além de CVC (CVCB3), como mais vulneráveis no cenário de alta de juros por aqui.

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“Varejo pode ser um dos setores mais prejudicados, tendo em vista que o crédito do consumidor interno fica mais caro, tirando fôlego para novas compras. Assim podemos também incluir o setor imobiliário, em que o financiamento se torna menos acessível”, concorda o analista da CM Capital, que também cita a Tenda (TEND3) como potencialmente prejudicada.

Outro grupo que deve sofrer, na visão do gestor da Hike, é o de empresas intensivas em capital ou que estejam em processo de reestruturação de dívidas, como Gol (GOLL4), Azul (AZUL4), Americanas (AMER3) e Azevedo & Travassos (AZEV4), ainda que aéreas se beneficiem do dólar mais fraco por ter grande parte das dívidas atreladas à moeda.