Powell deixou ambiguidade de lado e adotou tom mais duro contra a inflação, avaliam analistas

As próximas decisões sobre juros seguem dependendo dos indicadores econômicos, especialmente os de trabalho e inflação

Mitchel Diniz

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O discurso do presidente do Federal Reserve, Jerome Powell, no simpósio anual de Jackson Hole, foi de acordo com o que boa uma parte do mercado previa. O chairman da autoridade monetária deu poucos sinais explícitos do que o Banco Central americano deve fazer no curto prazo. As próximas decisões sobre juros seguem dependendo dos indicadores econômicos, especialmente os de trabalho e inflação.

Também, como se esperava, Powell reafirmou o compromisso do Fed em priorizar o combate à inflação. Ele não repetiu o o tom, mais dovish (mais ameno com relação à inflação), que adotou após a última decisão do BC, quando os juros subiram 75 pontos-base, ainda que tenha dito que em algum momento será apropriado reduzir o ritmo de aperto, sem dizer quando.

Com isso, a visão geral do mercado foi de que as falas do presidente do Fed foram duras (ou hawkish) e que mostraram que, se necessário, as políticas serão restritivas ao crescimento até a inflação chegar à meta, o que pode impactar o crescimento dos EUA.

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“Olhando para o caminho da política de curto prazo, o presidente novamente enfatizou a dependência de dados pelo Fed, mas mostrou estar claramente aberto a outro ‘aumento extraordinariamente grande’ na taxa de juros (de 75 pontos-base). Para nós, isso sugere que o comitê parece menos incomodado em fazer um terceiro grande aumento consecutivo, do que havíamos previsto”, escreveram os analistas do Morgan Stanley.

O banco vê mais riscos de uma alta de 75 pontos na reunião de setembro do Comitê de Mercado Aberto (Fomc, na sigla em inglês),  mas mantém a previsão de que a autoridade monetária vai elevar os juros em 50 pontos.

Sobre a inflação de preços ao consumidor (CPI, na sigla em inglês) do mês de julho, que ficou estável, Powell disse que o dado foi bem-vindo, mas que ficou muito aquém do que o comitê considera uma inversão de curso.

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“Se o próximo relatório de inflação não der sinais muito claros de que os preços estão desacelerando de forma vertiginosa, acredito que o Fed deve seguir com o plano de ajustar os juros em mais 75 pontos-base”, afirma Gustavo Cruz, estrategista da RB Investimentos.

Cruz acredita que a mensagem de Powell foi mais dura, ainda que o chairman tenha se valido de muitos eufemismos para falar dos próximos passos do Fed. “Entendo que o mercado, quando precifica 3,5% de juros para o final do ano, parece pouco. Tudo caminha para, pelo menos, 4%”, diz o economista.

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Dirigente do Fed de Atlanta diz estar inclinado a uma alta de juros de 50 pontos-base em setembro

Angelo Polydoro, economista da ASA Investments, explica que o Fed não se compromete com uma taxa terminal. “O objetivo de trazer a inflação para baixo é a prioridade. Se os preços só caírem com os juros a 4,5%, por exemplo, é para esse patamar que o Fed vai levar os juros”, afirma.

Nicole Kretzmann, economista-chefe da Upon Global Capital, avalia que não houve ambiguidade no discurso do chairman em Jackson Hole. “A mensagem foi bem clara na sinalização de que os juros devem ficar em patamar restritivo por um bom tempo e que a taxa não deve ser cortada prematuramente”, afirma.

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Inflação observada pelo Fed recuou em julho

Nesta manhã, um pouco antes do esperado discurso de Powell, foi divulgado o PCE (índice de preços de gastos com consumo, na sigla em inglês) nos Estados Unidos, considerada a medida preferida de inflação do Fed. O indicador em seu núcleo subiu 0,1% em julho na comparação mensal e 4,6% na anual, segundo dados divulgados pelo Departamento de Comércio americano.

Com o resultado, o indicador desacelerou na comparação com junho (quando subiu 0,6% na base mensal e 4,8% na anual) e ficou abaixo da expectativa do mercado (que projetava uma alta mensal de 0,3% e anual de 4,7%, segundo a Refinitiv).

O núcleo do PCE exclui os preços de alimentos e energia, que são mais voláteis. Considerando esses preços, a inflação de consumo americana (medida pelo PCE) foi de -0,1% na base mensal e 6,3% na anual. Ou seja: houve deflação nos preços.

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“O PCE melhor que o esperado reduz alguma pressão para o Fed em fazer um ajuste de 75 pontos-base na próxima reunião. Como temos dito, acreditamos que o Fomc vai elevar os juros em 50 pontos-base em setembro e encerrar o aperto quando a taxa alcançar 3,25% em novembro. Contudo, vimos o risco de uma alta de 25 pontos base em dezembro aumentar na última semana”, destacou Francisco Nobre, economista da XP, em análise anterior ao discurso do Fed.

Cabe ressaltar que, como apontado por Powell no discurso de hoje, novos dados serão monitorados de perto pelos investidores para uma maior definição de quais serão os próximos passos de política monetária do Fomc, com os dados de emprego de agosto e a inflação deste mês.

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Mitchel Diniz

Repórter de Mercados