Por que o investidor gringo poupou o real na sessão pós-eleição de Trump?

Real se destaca entre moedas emergentes após a vitória de Trump, atraindo investidores pelo diferencial de juros e pela sua função de hedge frente à volatilidade global

Murilo Melo

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A vitória de Donald Trump nas eleições americanas trouxe um cenário de maior volatilidade e incertezas para os mercados globais, com destaque para a dinâmica das moedas de países emergentes. O dólar, como esperado pelos mercados, se fortaleceu, mas o real brasileiro se comportou de maneira positivamente nesta quarta-feira (6), destacando-se entre as divisas emergentes com um desempenho relativamente mais forte.

O movimento também foi na contramão das outras moedas de países desenvolvidos. O índice DXY, que mede a força do dólar contra rivais fortes, subiu 1,60%, aos 105,088 pontos e ao maior nível desde 3 de julho.

O dólar comercial chegou a subir quase 2% em relação ao real na abertura dos negócios e bateu os R$ 5,86, em meio às primeiras reações à vitória do republicano, mas perdeu força ao longo da sessão e fechou com forte baixa de 1,26%, na casa de R$ 5,67 na sessão de hoje. Especialistas apontam que esse movimento é graças a fatores como o diferencial de juros, o papel do real como ativo de hedge e a adaptação das políticas fiscais e monetárias brasileiras.

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O diretor de câmbio da Ourominas, Elson Gusmão, explica que o real se destaca no atual cenário devido ao atrativo diferencial de juros entre Brasil e Estados Unidos. A taxa de juros elevada no Brasil, frente à possível estabilização ou queda nas taxas norte-americanas, segundo ele, torna o real mais interessante para investidores em busca de retornos superiores em mercados emergentes.

Conforme ele, o real é uma moeda acessível, com um mercado de câmbio profundo e de fácil transação, o que facilita os movimentos de hedge e investimentos em busca de rentabilidade. “Esse diferencial favorece fluxos de capital para o Brasil, fortalecendo o real em comparação com outras moedas emergentes”, diz.

Gusmão explica ainda que o diferencial de juros também desempenha um papel importante na escolha do real como principal moeda de hedge. Com a vitória de Trump e a perspectiva de políticas mais protecionistas, moedas de países como México e China poderiam sofrer mais pressões devido a tarifas e incertezas comerciais.

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O real, por outro lado, oferece uma opção de proteção mais acessível, permitindo aos investidores se beneficiar de um retorno mais elevado sem custos excessivos. “Se os EUA mantiverem ou reduzirem suas taxas, e o Brasil continuar com juros altos, o real deve continuar a atrair investidores globais em busca de rentabilidade em ativos emergentes, enquanto moedas como o peso mexicano podem não apresentar a mesma atratividade devido a juros mais baixos e exposição às políticas protecionistas dos EUA”, afirma.

Fatores fiscais e monetários em jogo

O chefe-estrategista do Grupo Laatus, Jefferson Laatus, aponta que o contexto fiscal e monetário do Brasil também favorece o desempenho do real em dias turbulentos como hoje. “A expectativa de que o Brasil avançará nas reformas fiscais, somada a [até então] um possível tom mais hawkish [duro, mostrando preocupação com inflação] do Comitê de Política Monetária (Copom), fortalece o apelo do carry trade [operação em que o investidor toma dinheiro emprestado barato em moeda forte e depois investe em outra com rendimentos mais elevados] no país”, explica Laatus. Em um cenário global de inflação crescente e uma política monetária mais moderada nos EUA, diz ele, o Brasil se apresenta como uma opção atrativa para investidores que buscam rentabilidade em ativos emergentes.

Como esperado, após o fechamento do mercado (e do dólar) o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central do Brasil acelerou o ritmo e elevou a taxa básica de juros (Selic) em 50 pontos-base, para 11,25% ao ano. A diretoria não indicou os próximos passos da política monetária, defendendo ainda que o governo adote medidas fiscais estruturais que gerem impactos para a política monetária.

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Além disso, Laatus explica que a intervenção do Banco Central brasileiro e ajustes na taxa Selic podem ajudar a manter o real competitivo frente a outras moedas emergentes. Para ele, se o Brasil continuar com juros altos e avançar nas reformas fiscais, a moeda brasileira pode se manter atraente para os investidores, mesmo com a força do dólar. No entanto, o estrategista alerta que um aumento significativo nas taxas de juros dos EUA pode diminuir a atratividade do real no médio prazo.

A preparação para a volatilidade e o papel do hedge

Na opinião do vice-presidente do Grupo Studio, Fabiano Barboza, o Brasil estava “superpreparado” para a vitória de Trump, com o governo federal já implementando medidas fiscais que contribuíram para a estabilidade econômica e ajudaram a diminuir as pressões sobre a taxa de juros no futuro.

Ele acrescenta que a falta de movimento agressivo na política monetária dos EUA, somada à ação do Banco Central brasileiro, cria um ambiente favorável para o real se manter competitivo. O diferencial de juros em relação a outras economias emergentes, como o México, torna o real uma moeda mais interessante para investidores que buscam maior retorno e menor volatilidade. “Intervenções do Banco Central e possíveis mudanças na Selic podem levar investidores a ajustar suas posições, o que pode fortalecer o real a curto prazo. Esse ajuste pode ampliar a atratividade do Brasil em relação a outras moedas emergentes, mas pode aumentar o risco de volatilidade se as mudanças forem bruscas”, completa.

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No curto prazo, para os especialistas, o cenário segue de dólar forte, que pressionará o real, mas o diferencial de juros ainda deve atrair investimentos. Em médio prazo, o desempenho do real dependerá de como o Brasil lida com ajustes fiscais e crescimento econômico. Com reformas, o real pode se manter competitivo, mas se o Fed elevar os juros, o real pode perder um pouco de atratividade mesmo com as reformas.

O hedge e a volatilidade no câmbio

O comportamento do real também é explicado pela função de hedge que desempenha no contexto global. Investidores que buscam proteger seus portfólios da volatilidade política e econômica, especialmente em relação a políticas protecionistas nos EUA, têm utilizado o real como uma moeda de proteção.

Esse movimento de “hedge”, dizem os especialistas, ajudou a manter o real relativamente forte, ao contrário de outras divisas emergentes, como o peso mexicano, que sofreram mais com a pressão do dólar forte e com as incertezas sobre as políticas econômicas de Trump.

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Os mercados de derivativos no Brasil, especialmente o mercado futuro de câmbio, oferecem aos investidores uma maneira eficaz de se proteger contra as oscilações do dólar, aproveitando o retorno mais elevado do real. O alto volume de operações nesses instrumentos tem ajudado a sustentar a demanda pela moeda brasileira, mesmo em um cenário de volatilidade externa.