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NOVA YORK – A história do Facebook pode ser contada pelas controvérsias que envolveram a empresa desde sua fundação.
Da jogada de Mark Zuckerberg para afastar os sócios fundadores às constantes reclamações sobre falta de privacidade. Do escândalo da interferência russa na eleição do presidente Donald Trump ao poder excessivo da companhia (que também é dona do WhatsApp e do Instagram) sobre a vida das pessoas, os 16 anos de uma das maiores potências da internet são uma sequência constante de polêmicas.
Zuckerberg, 36, é quem decide tudo o que o Facebook faz ou deixa de fazer. Em alguns tropeços célebres, ele voltou atrás e pediu desculpas. Em outros, simplesmente ignorou as reclamações e continuou focado no seu objetivo maior: crescer, crescer e crescer.
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Mas, desta vez, nenhuma dessas saídas parece ser suficiente. A campanha Stop Hate For Profit (Parem de lucrar com o ódio, em tradução livre), que defende uma suspensão temporária da publicidade no Facebook para protestar contra a inação de Zuckerberg em relação ao conteúdo de ódio, já conta com centenas de adesões.
Queixas quanto à permissividade do Facebook sempre existiram. A onda atual foi precipitada por posts de Donald Trump durante a onda de protestos por justiça racial depois do assassinato de George Floyd por ex-policiais na cidade americana de Minneapolis.
O Twitter foi a primeira empresa a acrescentar checagem de fatos e alertas de discurso de ódio a postagens de Trump. A primeira reação de Zuckerberg – que estaria se aproximando de Trump nos últimos meses, segundo relatos da imprensa americana – foi ficar de braços cruzados.
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Segundo ele, trata-se de uma questão de liberdade de expressão. As manifestações de políticos e governantes não devem ser sujeitas a intervenções, diz Zuckerberg, porque elas são de interesse público.
Os observadores discordam. Liberdade de expressão é uma coisa. Permitir incitações à violência, discursos racistas e outras formas de conteúdo de ódio é outra.
“Algo muito importante está em jogo. A plataforma tem de evoluir”, disse Steve Lesnard, vice-presidente de marketing da fabricante de artigos esportivos The North Face. A empresa foi uma das primeiras a suspender anúncios na rede social.
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Adidas, Unilever, Starbucks, Coca-Cola, Diageo, Levi Strauss, Volkswagen e Patagonia são outros nomes conhecidos que aderiram ao boicote. A lista das participantes segue aumentando.
Quando companhias dessa envergadura entraram para a campanha, na última semana de junho, aconteceu um fenômeno raro: as ações do Facebook começaram a cair.
Em 23 de junho, os papeis da empresa eram negociados a US$ 242. Dois dias depois, tinham caído 8%. Em 26 de junho, chegaram a valer US$ 216,08, menor valor desde 18 de maio.
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Parte das perdas já foi recuperada desde então – as ações do Facebook fecharam a semana em US$ 233,42.
Uma das explicações é simples: por mais conhecidos que sejam os participantes do boicote, o peso deles nas receitas da companhia é irrisório.
O Facebook conta com 8 milhões de anunciantes, em sua maioria companhias de pequeno e médio porte.
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Se os dez maiores abandonassem a plataforma por seis meses, a receita cairia somente 1,7%, segundo um relatório da analista Heather Bellini, do Goldman Sachs. Somente no último trimestre, o Facebook faturou US$ 17 bilhões em publicidade.
Também é importante observar que esses anunciantes de menor porte encaram a presença nas redes sociais de maneira muito diferente das grandes marcas. Para eles, não se trata de campanhas de branding, mas sim de geração de negócios.
Apesar de o impacto financeiro ser pequeno, a campanha de boicote fez muito mal à imagem do Facebook – que já não era das melhores. Para tentar reparar os estragos, Zuckerberg finalmente anunciou as primeiras medidas práticas na semana passada.
A lista de termos de ódio proibidos em postagens e anúncios foi ampliada. Caso os autores sejam políticos importantes, como Trump, os posts serão assinalados com um aviso indicando se tratar de conteúdo de interesse jornalístico.
Posts relacionados à eleição presidencial americana serão acompanhados de informações verificadas, para evitar informações falsas que têm o objetivo de afastar os eleitores das urnas em novembro.
“Meu compromisso é garantir que o Facebook continue sendo um lugar em que as pessoas possam usar sua voz para discutir questões importantes, porque acredito que avançamos quando ouvimos uns aos outros”, disse Zuckerberg na teleconferência com os funcionários em que apresentou as mudanças.
O quanto o próprio Zuckerberg ouve os críticos, entretanto, é motivo de especulações há muito tempo. O empresário estruturou a companhia de modo que ele mantém o controle das ações com direito a voto.
“É difícil saber se ele age por princípio ou por interesse próprio”, diz Steven Levy, autor de Facebook: The Inside Story (a história de bastidores do Facebook, em tradução livre).
Segundo Levy, todos os algoritmos da rede social têm o objetivo de gerar mais engajamento – o que se traduz em mais receitas publicitárias.
“Dá para mudar? Sem dúvida. Mas é preciso querer. Se a prioridade fosse essa, a empresa inteira se dedicaria a fazer as mudanças”, afirma Levy.
Uma reportagem publicada pelo site The Information dá a entender que, por enquanto, a crise atual é encarada mais como um problema de relações públicas do que qualquer outra coisa.
“Não vamos mudar nossas políticas ou nossa abordagem por causa de uma ameaça a uma pequena porcentagem da nossa receita, ou a qualquer porcentagem da nossa receita”, teria dito Zuckerberg. “Acho que os anunciantes não vão demorar para voltar à plataforma.”
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