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Autores do texto: Alan Ghani e Alexandre Pacheco, colunistas do InfoMoney
Por pouco, Jair Bolsonaro não vence no primeiro turno. É claro que o voto útil antipetista contribuiu bastante para esse desempenho; mas não foi só isso: a votação para deputados, senadores e governadores mostra que o eleitorado deu uma guinada à direita, derrotando a “velha política”.
Para se ter uma ideia, enquanto a bancada do PSL passa de 8 deputados para 52, a do PSDB cai de 49 para 29, tendo quase a metade do partido de Bolsonaro. Geraldo Alckmin, com toda a máquina partidária a favor, teve uma votação pífia. Outros nomes da velha política tiveram derrotas marcantes como Eduardo Suplicy, Lindbergh Farias, Dilma Rousseff, etc. Essa mudança quer dizer alguma coisa.
Definitivamente, a direita entrou para o cenário eleitoral após anos de exclusão da vida política. Alguém poderia dizer: “Ah, mas o PSDB e o PMDB não são de direita?” Aqui cabem parênteses. O PSDB nunca foi um partido de direita, mas uma “esquerda light”, um partido Social Democrata.
O partido foi identificado como direita por duas razões: i) pela disputa pelo poder com o PT, no qual os próprios petistas acusavam “seus inimigos” tucanos de serem de “direita” – tática comum nas brigas internas entre as esquerdas e ii) pelos votos do eleitorado de direita, que votava no partido contra o PT por absoluta falta de opção.
Já o MDB e o DEM estão muito mais próximos de um capitalismo ligado ao fisiologismo estatal do que a defesa do livre mercado e dos valores conservadores, e nesse sentido estão ideologicamente mais próximos da esquerda do que da direita.
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Portanto, o avanço da direita no cenário eleitoral, desde as eleições parlamentares de 1986, é algo inédito. E o que explicaria esse aumento? Basicamente, o distanciamento da classe política, da mídia e dos “especialistas” da academia dos reais problemas da população.
Conforme afirma o antropólogo Flávio Gordon, autor do livro A Corrupção da Inteligência, esse afastamento não é apenas político, mas sobretudo cultural.
Nas palavras de Gordon, “os nossos formadores de opinião têm baixíssima representatividade social, e a opinião pública hodierna é a opinião de uma pequena elite cultural detentora do monopólio sobre os meios de expressão e circulação de ideais”.
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Um sintoma desse afastamento é o choque entre a i) proposição de soluções ideológicas e abstratas e ii) problemas reais e concretos da população. É justamente neste vácuo deixado pelas ideologias, que são de esquerda, que Jair Bolsonaro cresce.
O que a velha classe política não entendeu é que as demandas da população não são aquelas defendidas pelos especialistas e acadêmicos que batem cartão nos grandes jornais do país. O povão não está preocupado com as discussões ideológicas de esquerda sobre ideologia de gênero, legalização das drogas, banheiro unissex, tampouco com as causas sociais que levam o bandido ao crime.
Basicamente, o cidadão comum quer trabalhar, curtir e proteger sua família, andar tranquilamente pelas ruas sem ser assaltado e fazer churrasco no final de semana, conforme abordamos no artigo “Ascensão de Bolsonaro: o cansaço das ideologias e o desejo de retorno ao senso comum”.
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Aliás, de forma inteligente, bem humorada e caricata, o personagem “Joaquim Teixeira”, que se tornou viral nas redes sociais, capta bem o que o espírito do povão e esse distanciamento com as ideais defendidas pelo “high society beautiful people” da lei Rouanet.
Humor à parte, o establishment não entendeu que a população brasileira é conservadora no melhor sentido da palavra. O brasileiro dá importância a tradições e valores que sobreviveram no tempo (ordem pública, família, religião etc.).
No entanto, em vez de entender o que são essas demandas conservadoras – não ideológicas por definição -, as celebridades da academia e do show business tratam o conservadorismo como “obscurantismo”, “preconceito” e “atraso”, conforme observou o escritor Flávio Morgenstern em texto e podcast “Conservadorismo é o novo sexy”.
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Prova desse conservadorismo da população é a votação gigantesca de Jair Bolsonaro no 1º turno. Basicamente, Bolsonaro cresceu pela identificação dele com a defesa de valores e pautas conservadoras: defesa da família tradicional, ataque à sexualização precoce e à doutrinação ideológica nas escolas e segurança pública (não trata bandido como vítima).
Bastou defender essas questões – e não ser citado na Lava Jato – que Bolsonaro quase ganhou no primeiro turno, mesmo sem dinheiro e estrutura partidária.
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Além da falta de estrutura partidária (palanque, tempo de TV, capilaridade), Bolsonaro sofreu diversos ataques de jornalistas e da turma da Lei Rouanet. A campanha do #elenão o colocava como “machista”, “homofóbico”, “fascista”, etc.
Mas, em vez de perder eleitores, Bolsonaro crescia supreendentemente, confirmando seu caráter antifrágil. Mais: o crescimento se dava de maneira espontânea, como se os ataques reforçassem ainda mais as teses defendidas por Bolsonaro e apoiadas pela população
Costumam comparar o fenômeno Bolsonaro ao fenômeno Trump. É verdade que ambos têm algo em comum: a identificação deles com os problemas reais e concretos da população.
No entanto, ao contrário da campanha de Trump que tinha muito dinheiro, que dispunha da máquina do Partido Republicano por trás e que usou estratégias de persuasão de nível militar (veja “Ganhar de Lavada”), Bolsonaro cresceu de maneira mais espontânea, sem dinheiro, sem método – apenas disse o que milhões de pessoas queriam ouvir.
O analista político Filipe Martins bem resumiu o cenário: “Alckmin teve 440 milhões de reais, metade do tempo de TV, a maior coligação, o apoio da mídia e ficou não sai do 4º lugar. Bolsonaro não tem dinheiro, tem 7 segundos de TV, apoio só do PRTB (e do povo), sempre é atacado pela mídia e está em 1º. O establishment nunca foi tão humilhado”.
Bolsonaro ainda não se tornou presidente, mas venceu de forma humilhante o establishment – dos caciques da velha política à turminha da Rouanet.
*Alexandre Pacheco é Advogado, Professor de Direito Empresarial e Tributário da Fundação Getúlio Vargas, da FIA, do Mackenzie e Doutorando/Mestre em Direito pela PUC. Siga no Linkedin, no Youtube, no Facebook, no Twitter e no Instagram.
*Alan Ghani é Economista, PhD em Finanças e Professor de Pós Graduação (Insper, FIA e SaintPaul). Siga no Twitter, no Facebook, no Linkedin.