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Matéria do jornal Folha de S. Paulo deste fim de semana traçou um cenário para o setor de energia e petróleo caso o ex-presidente Lula (PT) seja eleito presidente, com ideias trazidas também pelo senador Jean Paul Prates (PT-RN), que prepara o plano de governo do ex-presidente na área de óleo e gás e que foi entrevistado pela publicação. O plano, cabe ressaltar, ainda não está fechado. O InfoMoney está fazendo uma compilação dos programas econômicos de todos os candidatos à presidência.
De acordo com a reportagem da Folha, a campanha do ex-presidente Lula pretende excluir a Petrobras (PETR3;PETR4) da lista de privatizações, interromper a venda de refinarias em andamento (comprando participação em algumas) e adquirir participação relevante na Vibra (VBBR3), antiga BR Distribuidora.
Aliados do pré-candidato à presidência chegam a defender a criação de uma estatal de energia a ser formada por Eletrobras (ELET3;ELET6, recém privatizada, e Petrobras, que dependeria da recompra de ações recentemente vendidas durante a privatização da empresa de energia. A equipe do ex-presidente também estuda a compra de participações nas refinarias já vendidas: RLAM (antiga Refinaria Landulpho Alves, hoje Mataripe) e Reman.
Segundo o senador Jean Paul Prates (PT-RN) a ideia não é reestatizar, mas adquirir participações grandes o suficiente para ter assentos em seus respectivos conselhos. “A União, por meio de suas estatais, fará uma oferta a essas empresas. Se os acionistas aceitarem, levamos o negócio adiante.”
Analistas comentaram as falas de Prates e as novas sinalizações do programa de Lula para o setor.
O Bradesco BBI ressalta que, para as refinarias, o processo de venda faz parte de um termo de compromisso firmado pela Petrobras com o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), órgão antitruste. Assim, a decisão de não prosseguir com o processo de desinvestimento pode acarretar multas para a petroleira.
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Enquanto isso, para Vibra, o governo teria que aderir aos estatutos da empresa que determinam que ofertas por mais de 25% da empresa exigiriam que o comprador pagasse o preço mais alto das ações dos últimos seis meses ou uma avaliação conduzida por um avaliador independente.
Para a Eletrobras, as cláusulas da poison pill (ou pílula do veneno, medidas de proteção no estatuto da companhia para evitar uma retomada de controle) também são muito rígidas e, para o governo exercer alguma influência na empresa, precisaria desembolsar montantes significativos de capital.
“Uma possibilidade seria alavancar a Petrobras para usar o caixa da empresa para comprar ações da Eletrobras. No entanto, isso pode enfrentar uma grande resistência dos mercados e de fontes de financiamento”, avaliam os analistas.
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O Morgan Stanley, em relatório específico sobre a Eletrobras, revisitou as condições estatutárias após as notícias do fim de semana.
Os analistas também apontaram não acreditar que o mercado considere esse cenário de comprar ações da estatal crível dadas as novas condições estatutárias, como o limite de 10% do direito de voto para qualquer acionista ou grupo de acionistas e a “poison pill”.
De acordo com o novo estatuto, o acionista ou grupo de acionistas que ultrapassar 30% do capital votante da Eletrobras e não reduzir a participação a um patamar abaixo dessa referência em até 120 dias deverá realizar oferta pública de aquisição das ações ordinárias remanescentes para, no mínimo, 100% acima do que a maior cotação da ação nos últimos 504 pregões, corrigido pela taxa Selic. Da mesma forma, o acionista que ultrapassar 50% das ações com direito a voto deverá realizar oferta pública de aquisição com prêmio de no mínimo 200% até os últimos 504 pregões, também nas condições mencionadas.
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No caso da Petrobras, no fim de julho, após a divulgação dos resultados do 2T22, o BBI elaborou um índice de “medo e cobiça” para a companhia, que vai utilizar a partir de agora até depois das eleições. “No momento vemos Petrobras negociando dentro da zona do medo, mostrando que o mercado acredita que haverá uma política mais intervencionista na empresa após as eleições presidenciais de 2022”, explicam os analistas.
O BBI apresentou seu preço-alvo para PETR4 ao final de 2023, de R$ 53 e de US$ 20 para os ADRs da companhia, com recomendação equivalente à compra para os ativos. Os analistas explicam que a cotação pode ser ainda maior, chegando a R$ 93, no caso de uma privatização. Por outro lado, o ativo poderia cair para R$ 14 com problemas de administração e perda de controle das contas públicas.
“Enquanto existe uma chance da Petrobras sair privatizada das eleições, outro resultado nas urnas poderia acarretar em uma Petrobras como a de 2014, sobrecarregada de investimentos e com balanço patrimonial esticado”, explicam os analistas.
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Estatais mais fortes, segundo o Goldman
Em relatório da semana passada, o Goldman Sachs traçou um cenário para as estatais (e as que deixaram de ser recentemente) na Bolsa.
“Vemos as companhia sob nossa cobertura negociando a múltiplos mais baixos versus sua média histórica (cerca de 30% abaixo da média de 10 anos na base de preço sobre lucro esperado para 2023) no contexto de i) governança aprimorada, especialmente devido à lei das estatais aprovada em 2016; e ii) alavancagem significativamente menor versus ciclos eleitorais anteriores, o que diminui os riscos de crédito e ações para essas empresas”, apontam.
Assim, embora os investidores devam ter em mente que, dependendo dos resultados das eleições de outubro, pode haver riscos para algumas histórias de investimento, os analistas veem um ambiente mais saudável para essas empresas em relação aos ciclos eleitorais anteriores.
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Além de Petrobras e Banco do Brasil (BBAS3), os analistas incluíram em suas análises a Eletrobras e a empresa de saneamento paulista Sabesp (SBSP3). No caso da Eletrobras, eles destacam que, embora tenha concluído recentemente seu processo de capitalização/privatização, conta com participação de 40% do governo, enquanto os analistas acreditam que o mercado ainda não está refletindo totalmente a mudança da companhia para uma empresa privatizada.
“Observamos que as quatro empresas estão agora menos alavancadas do que antes. Estimamos que Petrobras, Eletrobras e Sabesp terminarão 2022 com uma relação entre dívida líquida e Ebitda [lucro antes de juros, impostos, depreciações e amortizações] cerca de 60% abaixo dos anos eleitorais anteriores. O mesmo se aplica ao BB com ativos sobre patrimônio líquido de 14 vezes, 16% abaixo dos ciclos eleitorais anteriores”, avaliam os analistas, vendo assim menor o risco para a qualidade de crédito e patrimônio dessas empresas.
Os analistas destacam também os menores riscos com a introdução das Lei das Estatais em 2016. Ela estabelece que, se uma empresa estatal decidir entrar em qualquer negócio ou adotar qualquer método diferente de uma estratégia que seria utilizada pelos pares do setor privado, esta deve ser amparada por leis e ter suas despesas incorridas claramente registradas em seu plano contábil.
Como tal, qualquer eventual modificação por um futuro governo nas operações delas provavelmente exigiria apoio do Congresso. “Em nossa opinião, esta lei representa uma camada de proteção contra potenciais reversões políticas significativas por parte do governo”, aponta o banco.
Além disso, os analistas observam algumas melhorias específicas de governança para as empresas. No caso da Petrobras, o Estatuto Social foi alterado em 2018 e estabelece que, se a empresa for obrigada a conduzir práticas comerciais diferentes de qualquer outro par privado – como a venda de combustíveis com preços abaixo do mercado – isso deve ser amparado por uma lei ou regulamento e, além disso, deverá receber ressarcimentos do Governo Federal para compensar as perdas geradas pela adoção dessa estratégia.
Para atualizar o estatuto social da Petrobras, seu Conselho de Administração teria primeiro que convocar uma Assembleia Geral Extraordinária e propor novas alterações, que seriam votadas pelos acionistas ordinários (já que o governo detém mais de 50% das ações com direito a voto) de acordo com o estatuto.
“Ressaltamos que o estatuto menciona que os acionistas minoritários podem desaconselhar (mas não necessariamente vetar) mudanças no estatuto. Essas emendas propostas poderiam ser aprovadas em poucos meses e, portanto, têm um poder limitado de impedir mudanças a médio/longo prazo caso tal evento ocorra”, aponta.
Sobre o BB, o Goldman reforça que é o único brasileiro listado no Novo Mercado, segmento de maior listagem da B3 em governança corporativa. As características deste segmento incluem: uma única classe de ações com iguais direito a voto; direitos de “tag along” de 100% (dispositivo que permite aos acionistas minoritários vender seus ativos pelo valor total de venda dos acionistas majoritários, em caso de alienação da direção da empresa); pelo menos 20% de conselheiros independentes indicados pelos acionistas minoritários; e transparência na divulgação de remuneração, riscos e demais políticas.
Além disso, como uma entidade estatal, o Banco do Brasil deve publicar um relatório anual de prestação de contas à CGU (Controladoria Geral da União). Além disso, de acordo com o estatuto social da empresa, o Governo Federal deve solicitar a aprovação dos acionistas para: 1) a nomeação do CEO; 2) quatro dos oito conselheiros; 3) e um conselheiro eleito pelos empregados. O diretor-presidente do banco é nomeado e destituído a critério do Presidente da República, conforme estabelecido no estatuto. Por fim, o governo reduziu sua participação de 54,4% em 2016 para 50,0% desde 2019, mantendo o controle da empresa.
Já sobre a Eletrobras, após a capitalização da empresa, os analistas veem o risco político substancialmente mitigado pela nova estrutura de governança.
“Apesar do governo manter uma participação de 40% na Eletrobras, não vemos o risco político tão significativo para a empresa, pois a estrutura de governança determinada durante o recente processo de capitalização provavelmente dificultará que um futuro governo desfaça seus resultados. Além de o governo ter apenas 10% dos direitos de voto (conforme novo estatuto), precisaria desfazer o processo de capitalização no Congresso”, aponta.
Com relação à Sabesp, as empresas de saneamento no Brasil estão sujeitas às agências reguladoras locais de cada estado.
“Em nossa opinião, isso cria riscos regulatórios e de governança para as empresas, que podem estar expostas a decisões regulatórias que podem impactar negativamente seus resultados, como diferimento de reajustes tarifários ou menor reconhecimento de capex durante processos de revisão, o que ocorre historicamente”, avalia.
Os analistas ressaltam que no caso da Sabesp (e outros nomes de saneamento listados), a agência reguladora é controlada pelo Governo do Estado de São Paulo, que também é o principal acionista da empresa, com 50,3% de participação. “A nosso ver, esse quadro aumenta a percepção de risco de mercado para o setor”, aponta o Goldman.
Cenário para as eleições
O Goldman aponta que, embora não tenha opinião sobre os resultados das próximas eleições, nota que os candidatos pró-privatização podem mencionar suas intenções durante a campanha, possivelmente impulsionando o sentimento dos investidores, a depender de seu desempenho nas pesquisas.
O governo brasileiro concluiu recentemente o processo de capitalização da Eletrobras e também incluiu a Petrobras na lista de empresas para as quais será estudado um potencial processo de privatização.
“Acreditamos que, mesmo que um processo semelhante avance, ele possa ser demorado. Embora a recente privatização da Eletrobras crie uma precedência, notamos que a regulamentação da indústria do petróleo é baseada no fato de que a Petrobras é controlada pelo governo. Como tal, acreditamos que a potencial privatização da petroleira possa exigir uma revisão mais ampla de todo o marco regulatório para a indústria do petróleo”, apontam os analistas.
Quanto à Sabesp, o atual governo do estado de São Paulo mencionou no início de seu mandato (2019) que a privatização era uma possibilidade. No entanto, este processo não avançou.
Já para o BB, a alienação de ativos não essenciais tem sido um tema central nos últimos anos. Por exemplo, sob a atual administração presidencial, o Banco do Brasil decidiu vender ações da Neoenergia (NEOE3) e no IRB (IRBR3), além de fazer parceria com o UBS em sua divisão de banco de investimento.
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Trazendo uma breve visão geral das participações atuais da empresa, os analistas apontam que a Cielo (CIEL3) e a BB Seguridade (BBSE3) representam atualmente aproximadamente 40% do valor de mercado da empresa. O banco estatal também possui participações nas subsidiárias estrangeiras BB Americas e Patagonia, bem como no Banco Votorantim (BV) e Elo.
“Embora a privatização seja geralmente um processo complexo e demorado, as vendas de ativos historicamente têm sido menos dependentes de aprovações regulatórias e podem gerar menor alavancagem e maiores pagamentos de dividendos ao longo do tempo”, afirmam os analistas. Os analistas do Goldman possuem recomendação de compra para Petrobras, BB e Eletrobras.
Já a recomendação é neutra para a Sabesp, com uma visão menos favorável dada a estrutura regulatória dos players de saneamento listados no Brasil. “Além disso, à medida que as eleições se aproximam, esperamos que o fluxo de notícias sobre as potenciais perspectivas de privatização da Sabesp seja um catalisador do desempenho das ações”, apontam os analistas.