Dividendos bilionários X incerteza política: analistas seguem divididos sobre Petrobras (PETR4) após produção e tombo de ações

Risco-retorno: relação é vista como muito alta por algumas casas, como Credit e BofA, enquanto XP segue vendo assimetria positiva

Lara Rizério

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Ofuscada pela forte volatilidade recente de suas ações, a Petrobras (PETR3;PETR4) divulgou sua prévia operacional na noite da última segunda-feira (24), sem trazer grandes surpresas, uma vez que alguns números já tinham sido antecipados pela Agência Nacional de Petróleo, Gás e Biocombustíveis (ANP).

Contudo, os dados e a proximidade da divulgação dos resultados do terceiro trimestre, no dia 3 de novembro (após o fechamento do mercado), ajudam a desenhar o quadro que vem ganhando força nas últimas sessões, com os analistas cada vez mais divididos entre cautela pré-eleitoral e ânimo levando em conta os bons resultados no radar e, por consequência, bons dividendos.

O Credit Suisse, que na semana passada cortou a recomendação para os ativos de equivalente à compra para neutro, destacou em nota a clientes que a Petrobras relembrou os investidores nos últimos dias que vivemos em um período de eleição. “Vários estavam com a estratégia de reduzir (posição em Petrobras) entre quarta e quinta desta semana para chegarem com menos riscos no dia 30 [domingo, segundo turno da eleição], mas o caso Roberto Jefferson mudou toda a dinâmica”, apontam os analistas, com as ações desabando quase 10% e perdendo R$ 50 bilhões em valor de mercado apenas na segunda-feira. Nesta terça, os ativos PETR3 e PETR4 caem cerca de 1% por volta das 12h30 (horário de Brasília).

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O episódio envolvendo a prisão do ex-deputado foi avaliado como negativo à campanha de Jair Bolsonaro, em uma visão receosa de que o evento possa frear o movimento de recuperação do atual presidente, o que tinha impulsionado os ativos na semana passada em meio a expectativas de menor interferência na estatal em relação a seu oponente, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Neste cenário, aponta o Credit, a prévia operacional divulgada ontem à noite teve uma atenção bem menor do que a que receberia normalmente. Porém, avalia o banco, trouxe notícias marginalmente negativas. As importações de diesel ficaram um pouco acima do esperado, enquanto que as exportações de petróleo cru ficaram um pouco aquém das projeções do banco suíço.  A Petrobras importou e produziu mais diesel do que vendeu.

Já para a XP, os números ficaram em linha com as suas estimativas. A produção total de petróleo e gás da petroleira somou 2,644 milhões de barris de óleo equivalente ao dia (boed) no terceiro trimestre, queda de 6,6% versus um ano antes e recuo de 0,3% ante o trimestre anterior.

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A produção neste trimestre foi afetada principalmente pela vigência do Contrato de Partilha de Produção dos Volumes de Excedente da Cessão Onerosa de Atapu e Sépia, que teve início em maio, e pelo descomissionamento e desmobilização do FPSO Capixaba. Tais efeitos foram compensados pelo ramp-up do FPSO Guanabara, o qual iniciou a produção recentemente, pelo bom desempenho da P-68 e pelo menor volume perdido com paradas e intervenções.

Na produção de óleo e LGN, o pré-sal manteve sua representação de 76% da produção. Na comparação anual, houve um aumento de 2 pontos percentuais.

“A expectativa é que a participação do pré-sal na produção total fique em torno de 80% em 2026. Vale lembrar que o petróleo do pré-sal é de maior qualidade e possui um menor teor de enxofre, sendo menos poluente. O custo de extração da estatal também é muito baixo no pré-sal, tornando este um ativo único no mundo. Portanto, vemos como acertada a estratégia da companhia de focar seus esforços, e investimentos, em exploração e produção no pré-sal”, destaca a Levante Ideias de Investimentos.

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Já a produção em terras e águas rasas segue perdendo espaço, por conta principalmente dos desinvestimentos realizados pela companhia e do declínio natural destes campos. Neste trimestre, houve a conclusão da venda da participação do Polo Peroá e Polo Fazenda Belém para a 3R Petroleum (RRRP3), lembra a casa de análise.

Analistas divididos

Levando em conta o noticiário eleitoral e a proximidade dos resultados, que devem vir positivos e trazer junto novo anúncio de dividendos, os analistas se dividem se vale a pena ter posição na estatal, principalmente após os eventos da véspera.

“As ações da Petrobras vêm apresentando crescente volatilidade, acompanhando de forma mais intensa o noticiário político, à medida que o segundo turno das eleições presidenciais se aproxima. Negociando a um múltiplo de 2,5 vezes o valor da empresa sobre o lucro antes de juros, impostos, depreciações e amortizações (EV/Ebitda) esperado para 2023 e com um carrego de dividendos positivo, ainda vemos a ação como uma assimetria interessante, e mantemos nossa recomendação de compra”, aponta a XP.

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Andre Vidal e Helena Kelm, analistas da XP que assinam o relatório de Petrobras, estimam dividendos a serem declarados em cerca de US$ 6 bilhões (R$ 2,40 por ação ou cerca de US$ 0,90 por ADR, equivalente a 7% de yield para PETR4 no trimestre, 28% anualizado). “Derivamos essa estimativa aplicando a fórmula 60%*(Fluxo de Caixa das Operações – Investimentos) e somando os US$ 1,2 bilhão da parcela em caixa da venda da Gaspetro no trimestre”, apontam os analistas.

A projeção é de mais um trimestre sólido para a empresa, embora tenha havido uma queda nos preços médios do Brent (US$ 98 o barril, ou baixa de 13% na base trimestral), uma vez que foi parcialmente compensada por um real mais fraco (média R$ 5,22 por dólar, ou alta de 5% da moeda americana trimestre a trimestre).

A estimativa é de um Ebitda ajustado de US$ 17,6 bilhões, ligeiramente superior (em 4%) ao consenso de mercado, mas com queda de 12% frente o segundo trimestre de 2022. A margem Ebitda (Ebitda sobre receita líquida) de exploração e produção deve permanecer sólida (71%), enquanto esperam margens saudáveis ​​em Refino, Transporte e Comercialização (RTC), devido aos maiores crack spreads no trimestre, especialmente para diesel (preço médio líquido em alta de 4% frente o 2T22).

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Além disso, a margem de Gás e Energia (G&E) deve apresentar bons números, em função de menores importações de GNL no trimestre (dinâmica semelhante ao 2T22).

O Credit também espera resultados fortes, com projeção do Ebitda do 3T22 de US$ 17,5 bilhões (queda trimestral de 13%, mas alta anual de 46%), com uma queda  sequencial principalmente devido aos preços médios do Brent mais baixos.

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“Os resultados provavelmente não serão tão empolgantes quanto no 2T22, quando a Petrobras pagou dividendos extraordinários, mas ainda vemos uma geração sólida de FCF  [Fluxo de Caixa Livre] de cerca de US$ 9 bilhões no  trimestre. Isso deve levar a dividendos de US$ 6-9 bilhões (7-10% de rendimento) no 3T22, em nossa opinião”, apontam os analistas do banco suíço.

Porém, o Credit reforça a visão destacada na semana passada que, mesmo com os dividendos ainda atraentes, está agora com uma visão mais cautelosa. “Corremos o risco de ficar fora da Petrobras quando os fundamentos podem sugerir o
contrário. Talvez as eleições possam até ser o catalisador que as ações estavam esperando. No entanto, de uma perspectiva de risco-recompensa, preferimos ficar à margem”, avaliam.

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Na mesma linha, o Bank of America mantém recomendação neutra para os ativos. “Embora a Petrobras tenha muitos aspectos positivos, incluindo um forte fluxo de caixa livre e rendimento de dividendos, as incertezas potenciais relacionadas à alocação de capital da empresa após o segundo turno das eleições presidenciais do Brasil no próximo domingo podem limitar o potencial de alta”, afirmam.

Volatilidade ditará semana

A Levante também destaca que as ações da estatal vêm andando de acordo com a expectativa de resultado das eleições, tendo forte alta na semana passada e queda de mais de 9% no dia de ontem.

“As pesquisas mais recentes mostram um cenário muito apertado, o que aumenta as incertezas com relação à companhia. Por tal motivo, preferimos manter a recomendação neutra até que tenhamos uma maior visibilidade sobre o seu futuro. Apesar dos fortes resultados apresentados pela empresa neste ano, enxergando uma conjuntura binária”, avaliam.

Em um cenário de reeleição do presidente Bolsonaro, a expectativa é da manutenção da estratégia vigente, com a venda de ativos não-core (campos onshore, refinarias, participações não estratégicas etc.) e a volta do PPI (Preço de Paridade de Importação), que já apresenta certa defasagem. “Neste cenário, acreditamos que os fundamentos da Petrobras se sobressaiam, diminuindo o desconto de suas ações com relação a seus pares internacionais”, avaliam .

“Já no cenário em que o ex-presidente Lula volte ao poder, a expectativa é de que o plano de desinvestimentos da estatal seja interrompido, o preço dos combustíveis praticado no Brasil apresente defasagem com relação ao preço no mercado internacional e os grandes investimentos em refino sejam retomados”, afirmam. Para os analistas, apesar dos avanços recentes na questão de governança, os mecanismos de defesas instaurados conseguem ser contornados, com um certo custo político. “Com tais medidas, os impactos na empresa (e nas ações) são praticamente impossíveis de se calcular”, apontam.

As carteiras de ações para ganhar em cada cenário para as eleições, segundo a Levante

Os analistas lembram novamente que o Brasil não é autossuficiente em derivados de petróleo e deve importar cerca de 20% da demanda interna para suprir o mercado. Atualmente, a estatal praticamente não realiza importações, cabendo principalmente às distribuidoras este papel, pois teria que arcar com os prejuízos de se vender algo que comprou a um preço mais caro, como aconteceu em anos recentes. Já a retomada de grandes investimentos em refinarias, avalia a Levante,  demandaria um alto desembolso de capital, o que deve reduzir drasticamente os dividendos distribuídos.

“Faltando menos de uma semana para o segundo turno, as ações da Petrobras devem continuar apresentando alta volatilidade, com foco apenas no cenário político”, conclui a casa de análise.

De acordo com compilação feita pela Refinitiv, de 10 casas que cobrem os ativos preferenciais da Petrobras (PETR4), 6 recomendam compra, enquanto 4 têm recomendação neutra, com preço-alvo médio de R$ 38,94 (upside de 13,7% frente o fechamento da véspera).

Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.