Publicidade
SÃO PAULO – Personagens do mercado desta vez leva o investidor de volta à sala de aula. Sem maiores pretensões de ensinar História ao leitor, lembra um episódio marcante do Brasil que acaba esquecido ao longo dos anos. O contexto favorece a recordação – afinal, em meio a uma crise, nada como buscar lições em outras.
O caso em questão pode ser listado entre as grandes crises que a economia brasileira já enfrentou. Mais do que isto, também se encaixa no debate atual sobre os limites da intervenção do Estado na dinâmica da economia, além da possibilidade de que esta intervenção alimente consequências indesejáveis no futuro, como inflação. Falamos do primeiro ministro brasileiro da Fazenda, Rui Barbosa.
Um dos mais controvertidos
Rui Barbosa é figurinha carimbada. Não necessariamente nos mercados, mas também nos mercados. Como descreveu o economista Gustavo Franco*, Rui Barbosa “é objeto de irrestrita admiração principalmente em função de sua atuação como jurista e orador, havendo várias dezenas de biografias e estudos a seu respeito”. Como o primeiro ministro da Fazenda da República, no entanto, “foi por certo um dos mais controvertidos”.
Não perca a oportunidade!
Rui Barbosa assumiu este posto com uma missão ingrata: promover o desenvolvimento industrial do Brasil no final do século XIX. Para isso, primeiro tinha de lidar com algumas barreiras que o cenário lhe oferecia, como a completa dependência brasileira do capital externo e um sistema financeiro defasado em relação às necessidades de liquidez da economia.
Inovador, apesar de tudo
Estes dois coelhos foram mortos com uma cajadada só. Como se tratava de um Governo Provisório, Rui Barbosa encontrava dificuldade de financiamento por fontes externas. Então, a ideia de levantar os recursos para dar o passo inicial deste projeto de industrialização veio amarrada a uma reforma financeira, que introduziu a lei bancária de 17 de janeiro de 1890.
As alterações foram inspiradas no modelo dos bancos nacionais norte-americanos, e sua principal mudança foi permitir a emissão de moeda sem lastro em ouro, lastreada em títulos da dívida pública. A iniciativa acarretou uma verdadeira inundação de papel-moeda na economia e seu propósito inicial, de fomentar a industrialização, acabou desviado para diversas atividades especulativas.
Continua depois da publicidade
Para se ter uma estimativa do tamanho do baque, foi injetada na economia praticamente a mesma quantidade de papel-moeda que circulava no mercado à época. Apesar de tudo, não dá para tirar o caráter inovador da política de Rui Barbosa, que quebrou com o padrão-ouro ao permitir as emissões lastreadas em títulos de dívida.
Interesses
O plano foi chamado de encilhamento, em alusão ao processo de preparar o cavalo para a corrida, como um preparativo antes da escalada projetada para a indústria. A livre concessão de crédito pelos bancos sem um controle mais abrangente dos tomadores remete ao episódio recente do subprime; no caso do encilhamento, levou a uma onda de especulação, com a abertura de diversas empresas-fantasma e lançamento de ações sem qualquer lastro na bolsa.
O episódio acabou desencadeando um processo inflacionário traumático, diversas falências e uma das mais severas crises que o País enfrentou, vindo a declarar moratória em 1898. Por outro lado, a maneira com que Rui Barbosa conduziu o plano sugere para muitos que suas escolhas foram tomadas com base nos interesses de um grupo de banqueiros, principalmente de seu conselheiro Mayrink.
Rui Barbosa saiu do ministério quatorze meses após assumi-lo, sócio de Mayrink em companhias fundadas durante o encilhamento.
*Fonte de pesquisa: “A primeira década republicana”, capítulo 1 do livro “A Ordem do Progresso”; editora Campus