Otimista com Brasil, “papa” do valuation segue com Vale e quer comprar mais brasileiras

Professor da Stern School of Business, Aswath Damodaran mostra sua visão da economia global e comenta os riscos da política no mercado e o cenário no exterior

Rodrigo Tolotti

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SÃO PAULO – De passagem em São Paulo para apresentar um seminário, Aswath Damodaran, professor da Stern School of Business e um dos mais renomados nomes do mercado quando o assunto é “valuation”, diz estar otimista com o Brasil, alegando que sempre existem ótimas oportunidades em momentos de crise. Em entrevista exclusiva ao InfoMoney, Damodaran reconhece que a situação política dificulta o processo de avaliação das ações brasileiras, mas que, com paciência, o mercado oferecerá ótimos rendimentos.

Damodaran é considerado também um dos maiores especialistas do mundo em avaliação do preço de ações e empresas (“valuation”, em inglês) e comenta também o cenário para a Petrobras, que no ano passado foi apontada por ele como o melhor caso de destruição de valor. Para ele, as mudanças que estão sendo feitas na companhia por conta da Lava Jato não são suficientes para melhorar o ambiente e tornar a estatal um bom investimento.

O professor não falou apenas de Brasil: ao comentar Estados Unidos, ele vê a espera pela alta de juros do Federal Reserve como o “evento mais superestimado da história”; a China, por sua vez, continua sendo uma grande preocupação, mas não pela desaceleração, e sim pela falta de transparência. Por isso, Damodaran recomenda que a hora agora é de paciência: quem buscar “operar” o noticiário vai sofrer com o excesso de informações.

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O seminário de Damodaran acontece nos dias 13 e 14 de junho na HSM Educação Executiva, onde falará sobre a maximização de valor de companhias, apresentando os caminhos disponíveis para criação de valor das empresas e modelos de avaliações. Confira abaixo os principais trechos da entrevista concedida ao InfoMoney:

InfoMoney – Em 2014, em entrevista ao InfoMoney, você afirmou que para investir em um mercado emergente é preciso sempre esperar por uma crise antes. Desta forma, o Brasil se mostra um bom investimento neste momento?

Aswath Damodaran – Sim se você for um investidor e não se você for um “trader” e eu acho que esta é a diferença. Trades vivem de momentos. Mas se você é um investidor de verdade, você pode ser seletivo, e o Brasil oferece oportunidades porque nem todas as empresas brasileiras estão sofrendo.

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Hoje a política se tornou um componente ruim de investimento quando você compra uma Petrobras, Vale ou mesmo uma Embraer porque há um componente governamental em todas elas. A solução seria olhar para empresas menores, mas infelizmente estas companhias vem com um custo de serem “empresas familiares”. Não são apenas companhias geridas por famílias, mas também aquelas lideradas por pessoas que essencialmente controlam e não deixam você mudar a forma como eles comandam.

Eu acredito que esta é uma oportunidade de se investir no Brasil, mas você também precisa ser cuidadoso com as companhias que você está investindo, porque algumas destas empresas podem ser “travadas” na forma como elas são geridas e não há nada que você como acionista pode fazer para mudar isso.

IM – Você vê alguma ação brasileira como um bom investimento neste momento?

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AD – Eu não tenho adicionado ações brasileiras em meu portfólio faz um tempo. Mas como estarei no Brasil, vou começar a olhar mais para algumas companhias de maneira mais profunda. Creio que no fim de junho ou julho terei uma ou duas ações no meu portfólio. E provavelmente não será uma empresa de “grande nome”.

IM – Em 2014 você afirmou que estava confortável em ter Petrobras e Vale em seu portfólio…

AD – Eu tenho Vale em meu portfólio, eu comprei novamente quando ela voltou para US$ 2,00 (cerca de R$ 7,00 em janeiro). Eu estou segurando-a como um investimento de longo prazo e eu acho que a Vale está em uma boa trajetória para retomar sua saúde, caso os preços do minério de ferro se recuperem.

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Eu tive Embraer por um bom tempo, eu tenho ações brasileiras em meu portfólio, mas eu acho que muitas companhias estão sofrendo nos últimos anos.

IM – Em 2015 você fez uma análise sobe a Petrobras e usou a companhia como um exemplo de destruição de valor. Desde então tivemos algumas mudanças de diretores e uma troca de governo. Você acha que a empresa tem feito mudanças suficientes para começar a recuperar seu valor?

AD – Aconteceram algumas mudanças, mas elas não são suficientes e eu explico o porquê: o problema fundamental com a Petrobras não é que ela é corrupta ou que a sua gerência não sabe o que está fazendo. Eles sabem exatamente o que estão fazendo, estão mantendo Brasília feliz, e isto não mudou. Se você me perguntar qual é a missão da companhia, é uma missão muito mista: é ser uma grande companhia de petróleo, ser um símbolo brasileiro, deixar o governo feliz.

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A Petrobras tem muitos “mestres” diferentes para servir e eu não gostaria de estar nesta posição, simplesmente porque se você está comandando a companhia. Se você olhar para a companhia, ela tem missões muito variadas, ela é uma companhia pública de petróleo e ela tem os objetivos de qualquer companhia pública, que é ganhar dinheiro e maximizar o seu valor, mas ela, para o bem ou para o mal, também é uma empresa estatal.

O governo pode mudar, mas ainda é um governo, e você continua tomando decisões para fazer as pessoas felizes em Brasília em vez de focar em fazer o que é melhor para a Petrobras se tornar uma companhia de petróleo mais saudável. Porém, o que é necessário para tornar a companhia mais saudável pode estar em conflito com o que o governo precisa fazer. Eu acho que este será o grande desafio. Como você cria uma empresa independente, com uma gestão independente se a sua diretoria e seu conselho ainda está relacionado com o governo.

Eu acho que este não é um problema apenas do Brasil, apenas com a Petrobras, está em outros lugares, com grandes companhias.

IM – E onde você está investindo agora? Há algum país ou companhia específica que você acredite que seja um bom investimento agora?

AD – Eu voltei a comprar ações da Apple pela quarta vez na semana passada. Em geral é isso, eu vou para onde eu encontrar oportunidades, seja em ações indianas, indonésias, brasileiras, norte-americanas, basta que elas se mostrem boas oportunidades. As grandes tacas normalmente estão onde as pessoas não estão olhando.

IM – Agora sobre as bolsas dos EUA: como você acha que a alta de juros do Federal Reserve e as eleições vão impactar o mercado?

AD – Eu parei de me preocupar com o Federal Reserve e acho que este é o fenômeno mais “supervalorizado” da história. O Fed não ajustou as taxas para baixo, elas estão baixas porque o crescimento econômico está mais lento e a inflação está baixa. E por alguma razão as pessoas acham que o Fed tem poderes para mover as coisas, mover as taxas de juros ou o mercado de ações. Meu palpite é que isto já está precificado nas ações porque a inflação já está melhorando e o crescimento econômico está melhorando. Isso que irá guiar as taxas, não o Fed.

A eleição é interessante, porque historicamente ela traz volatilidade aos mercados emergentes, mas nos desenvolvidos isto não é um “game over”. Começando pelos Estados Unidos, onde historicamente o efeito das eleições no mercado de ações é mínimo, e isso ajuda. Você não quer que as eleições guiem muito o mercado, porque este efeito significa que o governo tem muito efeito nos negócios, o que pode ter um efeito tanto positivo quanto negativo, como vocês estão vendo no Brasil. É um enorme problema para os mercados esta volatilidade causada pelas trocas de governo.

Seguindo a história, eu não acho que nós devemos ver um grande impacto das eleições nas ações americanas, eu acho que as pessoas estão preocupadas agora com o que Donald Trump ou Hillary Clinton irão fazer, mas a verdade é que a margem de efeito no mercado é relativamente pequena. Eu não espero um grande movimento, tanto para cima quanto para baixo, não importa quem ganhar.

IM – Sobre China, investidores estão preocupados com o menor crescimento do país. Como você vê este risco para os mercados globais?

AD – Eu acho que há um risco real vindo da China e isso porque nos últimos 10 anos, no mundo todo, a China foi usada como pretexto para investirmos sem olhar para os fundamentos. Mas a China é uma economia muito nebulosa, no sentido em que você não sabe nada do que está acontecendo lá dentro. O governo não é transparente, as companhias não são transparentes, uma economia que você realmente não sabe o que está acontecendo porque todas as estatísticas do governo são “cegas”.

Isso pra mim é o grande problema da China, pois quando a verdade vir à tona podemos presenciar uma grande crise. E o pior de tudo: só saberemos o que realmente acontece lá quando a crise estourar. Eu estou preocupado com a China e acho que todos deveríamos estar preocupados porque, por décadas, nós usamos a China como um mecanismo para guiar o crescimento global. Mas se você tirar a China da equação, você está olhando para um crescimento bem mais lento da economia global, e isto irá machucar a todos.

IM – E como você está avaliando o impacto da Europa? A economia segue fraca na região e agora temos o risco da saída do Reino Unido da União Europeia.

AD – Eu acho que a Europa, mais que os EUA, é uma economia em queda. Se você olhar para ela, é uma economia envelhecida. Não é um período que ela irá crescer rápido, mas também não terá um crescimento negativo. Eu acho que a Europa tem uma combinação de problemas e um deles é que você não verá uma recuperação dos bonds como antes na Europa porque é um conjunto de economias velhas. Em segundo lugar, estamos vendo uma série de problemas políticos na Europa porque governantes estão saindo dos cargos e você vê as pessoas oferecendo soluções que não são verdadeiras soluções, mas que apenas parecem boas.

Eu acho que a Europa será um grande peso para a economia global no curto prazo porque as expectativas das pessoas precisam ser reformuladas. É por isso que não haverá crescimento real na Europa, este é um conjunto de economias em queda e as pessoas precisam se acostumar com isso.

IM – Outro tema que tem sido destaque é o preço do petróleo. Você acredita que há uma chance dos preços voltarem a cair ou subir, ou devemos ver a commodity se mantendo em US$ 50?

AD – Eu não ficaria focado nos preços do petróleo, eles são o que são. Os fundamentos podem ajudar a prever se ele deveria valer mais ou menos, mas a verdade é que para um horizonte de anos essas projeções de nada valem. Ou seja, se sua empresa depende do petróleo, precisa saber que isto não estará sob seu controle. Se você for uma companhia aérea (que possui boa parte do custo operacional em combustível), você precisa saber que focar no preço do petróleo é perda de dinheiro e tempo. Se você fizer isso, estará jogando dinheiro fora.

Em relação ao atual patamar de US$ 50, meu sentimento é que no longo prazo a commodity estará em US$ 60, mas no curto prazo pode voltar para US$ 25 ou disparar para US$ 95, já que sempre há uma crise no Oriente Médio para fazer o petróleo disparar. Ou seja: ela continuará a ser uma das coisas completamente fora do nosso controle.

IM – Recentemente, você falou da necessidade de diferenciar “traders” de investidores. No Brasil ainda temos um mercado muito imaturo e as pessoas estão sempre buscando retornos rápidos. Você acha que esta é uma lição importante para os brasileiros aprenderem?

AD – Isto é uma verdade em todo o mundo, não apenas no Brasil. As pessoas em todos os lugares precisam aprender isso. No Brasil é verdade, na Índia é verdade, nos Estados Unidos, China, Rússia, Reino Unido e Alemanha. Isto sempre acontece.

A maioria das pessoas faz “trades”, elas não investem. Isto sempre foi assim nos mercados. O que você quer fazer é criar um bom trade para ganhar dinheiro rápido, mas você comete um erro e perde dinheiro. Se você fizer um trade tentando adivinhar o que as pessoas estão fazendo e seguir ordens, cedo ou tarde haverá uma correção, e quando isso acontecer você perderá muito dinheiro. E isso significa que você vai reduzir seus “trades”.

Quando você tem muitos “trades” e você é um investidor, você provavelmente terá de vender a descoberto. Isto porque as pessoas vão começar a pegar o humor do momento para empurrar os preços para baixo e assim você terá que vender a descoberto, porque você deseja obter vantagem disso, e na maior parte do mundo, incluindo nos Estados Unidos, quem vende a descoberto é visto como uma má pessoa, como um especulador, como pessoas que ganham dinheiro de forma errada.

Enquanto nós dividirmos o mercado entre pessoas que fazem dinheiro de forma saudável e pessoas que ganham dinheiro de maneira ruim, nós iremos ver isto que eu falei, ou seja, nós teremos muito mais “trades” do que investidores.

IM – Para encerrar, qual lição você acha que é a mais importante para o investidor brasileiro neste momento em que a política tem sido mais destaque que os fundamentos no mercado?

AD – Primeiro é preciso aprender que os riscos políticos nunca têm as melhores soluções, as mais sensatas. Os problemas políticos são resolvidos, mas normalmente resolvidos de formas ruins. Os riscos políticos são piores que os outros porque eles demoram muito tempo para irem embora.

Em segundo lugar, as coisas nunca estão tão ruins quanto você imagina e também nunca estão tão bem quanto se acredita. Um dos grandes problemas nos mercados emergentes é que temos muitas variações de humor. Neste momento, os investidores brasileiros estão convencidos de que o fim do mundo está chegando e que iremos voltar para 1991, que a inflação vai chegar a 5.000%. Minha visão é que o Brasil está passando por um momento ruim, mas não está tão ruim quanto as pessoas estão achando que as coisas estão. Haverá uma recuperação.

Se você for um investidor, o que você precisar ter, mais do que qualquer outra coisa, é paciência. É preciso disciplina, porque todo dia você abre o jornal e olha os preços das ações, ou outros ativos, e fica maluco. Se você achar uma boa companhia, com uma boa gestão, um bom modelo de negócios e bons produtos, meu conselho é: compre esta ação hoje, coloque em seu portfólio e pare de ler o jornal por uns dois anos. O que eu quero dizer é pra não ficar olhando os preços das ações e as notícias financeiras, porque isso te leva a fazer coisas estúpidas.

Enfim, eu acho que estes são tempos difíceis para ser um investidor, ainda mais se você for um cidadão brasileiro, porque eu acho que o que você vê a sua volta é caos. Eu acredito que o Brasil é inteligente, as pessoas irão achar uma forma de se reerguer. Eu me mantenho otimista com o País e com as companhias brasileiras.

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Rodrigo Tolotti

Repórter de mercados do InfoMoney, escreve matérias sobre ações, câmbio, empresas, economia e política. Responsável pelo programa “Bloco Cripto” e outros assuntos relacionados à criptomoedas.