Os motivos para BC e Cade suspenderem o uso do WhatsApp para pagamentos – e o que isso representa para a Cielo

Alta de 28% nas ações em 7 sessões foi interrompida e, ainda que decisão seja revertida, Cielo pode perder um período precioso para reduzir queda de margens

Lara Rizério

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SÃO PAULO – O alívio para as ações da Cielo (CIEL3) durou pouco. Depois de uma alta de 28% de suas ações entre os dias 15 e 23 de junho, os ativos caíram 12,96%, a R$ 4,70, na sessão desta quarta-feira (24). No ano, a baixa acumulada é de 43,85%.

Esse movimento ocorre após determinações do Banco Central e do Conselho Administrativos de Defesa Econômica (Cade) na noite da véspera que fizeram com que a companhia suspendesse os serviços relacionados a transações de pagamento por meio do aplicativo WhatsApp, do Facebook, que tanto animaram as ações nos últimos pregões.

Segundo o Banco Central, a motivação para a decisão de suspender o uso do WhatsApp foi preservar um adequado ambiente competitivo, que assegure o funcionamento de um sistema de pagamentos interoperável, rápido, seguro, transparente, aberto e barato.

De acordo com a autoridade monetária, o eventual início ou continuidade das operações sem a prévia análise poderia gerar danos irreparáveis ao Sistema de Pagamentos Brasileiro (SPB) em relação à competição, eficiência e privacidade de dados.

Já de acordo com o Cade, a medida cautelar para suspender a operação de parceria entre Facebook e Cielo foi imposta para “mitigar potenciais riscos à concorrência”.

“A despeito do estágio inicial de apuração dessa operação, há potencialmente consideráveis riscos à concorrência que merecem ser mitigados ou evitados via intervenção deste Conselho, considerando que os efeitos podem derivar da operação em questão e causar danos irreparáveis ou de difícil reversibilidade nos mercados afetados. Ainda que não se tenha uma certeza sobre os efeitos, pelo dever de cautela, cabe adoção de ações para resguardar a coletividade de possíveis efeitos negativos”, afirma o Conselho.

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Vale destacar que a preocupação foi endereçada uma vez que, no Brasil, o WhatsApp é uma plataforma gigante. Segundo dados do Similar Web, o aplicativo é o número um entre celulares Androids, com uma penetração de 90%, aproximadamente 70 milhões de usuários diários, distribuição demográfica diversa e aproximadamente 1h30 de uso diário. Enquanto isso, a Cielo, apesar de sofrer com a maior concorrência do mercado e ter perdido participação nos últimos anos, segue sendo a líder em seu setor.

Desta forma, a base dos aptos a usar o sistema seria muito maior do que de instituições financeiras tradicionais, o que gerou o movimento do BC e do Cade, ainda que a decisão de barrar o mecanismo de pagamento tenha sido vista como surpreendente por diversos analistas de mercado.

Ainda não se sabe se a decisão será revertida no curto prazo: vale ressaltar que, nesta quarta-feira, a agenda de Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central, conta com reunião com representantes do WhatsApp.

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De qualquer forma, a Cielo pode perder um tempo precioso. Logo depois do anúncio da parceria na semana passada, a expectativa era de que outras empresas concorrentes poderiam se juntar à Cielo no novo sistema testado pelo WhatsApp.

Porém, ela seria a primeira processadora de pagamentos B2C e B2B – até que outras adquirentes chegassem a um acordo com o Facebook -, possivelmente aumentando seus volumes a uma atraente taxa de 3,99% em transações entre empresas. “Acreditamos que a Cielo tinha melhores chances de ser a primeira a se beneficiar das transações iniciais; portanto, um adiamento é prejudicial para a incumbente”, destaca Marcel Campos, analista da XP Investimentos (veja mais clicando aqui).

Na mesma linha,o Credit Suisse destaca que a empresa foi o único processador/adquirente de pagamentos escolhido a participar do acordo até o momento, o que poderia gerar uma contribuição relevante para os resultados da Cielo, tendo em vista a rentabilidade atualmente deprimida da empresa.

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“Enquanto isso, as notícias devem ser marginalmente positivas para os outros adquirentes listados, especialmente o PagSeguro”, afirmam os analistas, citando a companhia listada na Nasdaq.

Os analistas do banco suíço apontam que, embora não esperem que o WhatsApp Pay seja algo disruptivo para os pagamentos tradicionais com cartão no curto prazo, devido à taxa cobrada sobre cada transação de cartão de crédito ou débito (MDR) ainda elevada, alguns micro comerciantes ainda poderiam se sentir atraídos pela solução do WhatsApp, já que seu limite de transferência de R$ 5 mil ao mês para P2P (pessoa física para pessoa física) pode permitir que alguns deles recebam como indivíduos e não paguem taxas de MDR.

Sem tanto ânimo

De qualquer forma, vale ressaltar, boa parte dos analistas de mercado já não se mostrava tão otimista com a ação da Cielo mesmo no dia do anúncio da parceria com o WhatsApp. O analista da XP seguia com recomendação neutra para os ativos, avaliando que a competição e a disrupção tecnológica são dois riscos no radar, o que foi mantido após o anúncio da véspera. De 19 casas de análise que cobrem o papel, segundo compilação da Bloomberg, 11 tem recomendação de manutenção e 4 de venda, sendo que 4 recomendam compra.

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Já a equipe de análise da Levante Ideias de Investimento vai além e avalia que, “definitivamente, os tempos de domínio da Cielo no mercado de pagamentos ficaram para trás, com forte aumento da concorrência em plataformas abertas e mudanças na regulamentação do setor”.

Cabe ressaltar que as potenciais implicações da instituição do sistema de pagamentos instantâneos PIX estão cada vez mais no radar. O sistema de pagamentos instantâneo foi lançado pelo Banco Central em fevereiro e os bancos têm até novembro para se adequarem às normas.

Conforme aponta o Bradesco BBI, o novo sistema deve aumentar a eficiência do setor, reduzindo os custos de transação, o que deve ser um fato para o setor mesmo com uma solução estruturada no mercado como a apresentada pelo WhatsApp.

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Nesta semana, o BC divulgou algumas novidades sobre o novo sistema, destacando que ele será gratuito para as pessoas físicas e permitirá serviços de saques em redes varejistas, como alternativa ao sistema bancário.

Os pagamentos instantâneos tratam-se transferências monetárias eletrônicas em que a transmissão da ordem de pagamento e a disponibilidade de fundos para o recebedor ocorre em tempo real. Uma vez em operação, o PIX não terá limite de horário ou dia para as transferências.

Conforme o BC, as transferências vão ocorrer diretamente da conta do pagador para o recebedor, sem a necessidade de intermediários, o que permite que os custos de transação sejam menores. Mais detalhes serão detalhados na próxima reunião do Fórum de Pagamentos Instantâneos, em agosto.

Na avaliação do Credit Suisse, o PIX é uma plataforma com boas chances de ganhar força nos próximos anos. Entretanto, os impactos iniciais devem vir principalmente como um substituto para transações em dinheiro e transferências eletrônicas entre indivíduos. Isso porque, na avaliação dos analistas, para as transações entre empresas, o método ainda relativamente melhor é o cartão, que deve melhorar ainda mais com o lançamento de cartões sem contato (NFC). A substituição das transações com cartões deve ser gradual e improvável que ocorra no curto prazo, reforçam. Contudo, o impacto em um prazo mais longo será acompanhado de perto pelos agentes de mercado.

Com tantos desafios no radar, a ação da Cielo sente o impacto da notícia negativa, ainda mais após a forte alta dos ativos. Antes da abertura do pregão, o Bradesco BBI havia destacado que uma queda expressiva dos ativos era esperada, apontando ainda que a forte valorização recente dos ativos era injustificada dado o número modesto de bancos emissores em parceria com o WhatsApp. Também eram parceiros nesse sistema Banco do Brasil, Nubank e Sicredi (cooperativa de crédito).

Desta forma, a suspensão deveria fazer com que as ações da Cielo voltassem a níveis mais razoáveis, avaliam. Já para os concorrentes diretos da Cielo, ainda que a notícia possa parecer a princípio positiva, as novas regulamentações também representar mudanças significativas para as companhias.

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Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.