SÃO PAULO – Seguindo a toada recente do mercado, o mês de julho foi novamente marcado pela redução da aversão ao risco, com os investidores privilegiando as bolsas em detrimento aos ativos mais seguros, como o dólar. A divisa americana caiu 4,4% no mês passado, mas ainda sobe quase 30% em 2020, reflexo da corrida por proteção do início do ano.
Já o Ibovespa subiu 8,3% no mês passado, acima dos ganhos das bolsas americanas, com destaque para a alta de 6,8% da Nasdaq, na qual se concentram as principais empresas de tecnologia dos EUA. No ano, contudo, o benchmark brasileiro ainda cai 11%, até julho, contra uma alta de quase 20% do índice americano.
Nesse cenário, os fundos de investimento com alocação no exterior, que ainda predominam entre as maiores rentabilidades no período dos últimos 12 meses, perderam espaço em julho para carteiras mais voltadas à atividade doméstica.
Entre os maiores retornos de fundos de ações do mês, se destaca o Alaska Black BDR Nível I, com alta de 17,4% – apesar do nome, o produto não investe em BDRs atualmente.
Em 2020, no entanto, o fundo da Alaska ainda perde 48,6%, em grande parte devido a uma aposta vendida (que prevê a queda) em dólar ao longo do primeiro semestre. Em março, quando o Ibovespa caiu 30%, a desvalorização do fundo foi o dobro do montante, o que mantém as perdas acentuadas no ano, mesmo com retornos na casa dos dois dígitos desde então.
No caso dos multimercados, embora disponham de maior liberdade para operar com ativos diversos, os que concentram a atenção nas ações foram os que mais se destacaram em julho, mesmo porque tem sido desafiador para os gestores tirar valor dos juros nas mínimas, ou da alta volatilidade do câmbio.
Com um olhar em um prazo maior, de 12 meses, dos dez fundos de ações com a maior rentabilidade, sete se apropriam da valorização do dólar e das bolsas americanas à frente dos pares globais – em um ano, até julho, o Nasdaq sobe 31,4%, ante alta de 1,1% do Ibovespa.
Entre os fundos que não se dedicam à alocação global, o maior destaque ficou por conta do Forpus Ações Fc FIA, com valorização de 62,7%, atrás apenas do fundo de BDRs da Western Asset, que avançou 63,4%.
Confira a seguir os fundos de ações de destaque dos últimos 12 meses, assim como seu desempenho em um período de 36 meses, no acumulado de 2020 e apenas em julho. Importante lembrar que retorno passado não é garantia de rentabilidade futura, mas é interessante analisar o desempenho histórico dos fundos para observar sua consistência.
Para a análise, que tem como base dados extraídos da Economatica, foram considerados fundos não exclusivos com patrimônio líquido médio superior a R$ 100 milhões em 12 meses e mais de 99 cotistas, em julho.
No caso dos fundos de ações, foram excluídos os setoriais, os indexados e os monoações. Entre os multimercados, não foram considerados os fundos de crédito privado.
No grupo dos multimercados, ao analisar as dez maiores rentabilidades no intervalo de um ano, encerrado em julho, oito partem de fundos que investem no exterior, e um em ouro. O único “intruso” é o “long biased” da Versa.
Duro na queda
Luiz Nunes, sócio da Forpus Capital, atribui o resultado positivo do fundo à filosofia da casa de sempre carregar alguma proteção no portfólio.
No momento, a gestora tem derivativos atrelados ao mercado de bonds americanos, com o objetivo de atuarem como um seguro contra uma pressão inflacionária, hipótese que não é o cenário-base, mas que o sócio da Forpus não descarta, dada a injeção de liquidez dos governos.
Posições vendidas (que apostam na queda) também ajudam na composição de um portfólio equilibrado, diz Nunes, que aponta entre os “shorts” da carteira nomes como Renner, Multiplan e Iguatemi, mais dependentes do varejo físico. Produtoras de commodities como Petrobras e Suzano também compõem a parcela vendida do Forpus Ações FIA.
Já no book comprado, estão as companhias que mais se beneficiam do processo de digitalização acelerado pela pandemia, como B2W, Locaweb, Magazine Luiza e Totvs.
“No setor imobiliário, temos em carteira JHSF e Trisul, que atuam na média e alta renda e estão com as ações em um preço atraente.”
Tática de curto prazo
Entre os fundos de ações que mais subiram em julho, além do Black BDR da Alaska, destaque para o Small Mid Caps, da AZ Quest, que avançou 14,1%, e 11,7% em 12 meses.
Segundo Welliam Wang, co-gestor de renda variável da AZ Quest, o retorno se deve à combinação de resultados positivos tanto da carteira estrutural, com teses de maior convicção, que seguem entre as principais apostas do fundo, como do portfólio tático, caracterizado pelo giro mais alto.
Estão no primeiro grupo nomes como Via Varejo, pela mesma tese da digitalização citada por Nunes, da Forpus, e BTG Pactual, devido ao aumento no interesse da população pelo tema dos investimentos, frente aos juros tão baixos.
Já no segundo grupo, fizeram parte da carteira do fundo, nas últimas semanas, Oi e Cogna. Em relação à educacional, a despeito da visão negativa para a companhia, Wang explica que conseguiu se apropriar do recente momento positivo para a ação, influenciado pelo fluxo de investidores atraídos indiretamente por conta do IPO da subsidiária Vasta.
Sobre a Oi, Wang afirma que tirou proveito das negociações em torno da compra da operação móvel da empresa de telecom, que ainda não se concretizou, mas já culminou em uma valorização expressiva da ação.
Real e ouro como “hedge”
Na Logos Capital, a ação da Oi é uma posição que está desde o inicio do ano na carteira do multimercado Total Return, um dos destaques da categoria em julho. Ações da América Móvil (Claro), da Tim e da Vivo, que formaram um consórcio para disputar os ativos da Oi, também estão no portfólio.
Dessa maneira, diz Ricardo Vieira, sócio da Logos, o fundo se protege contra qualquer conclusão da disputa em torno da Oi, embora, por outro lado, possa também ver o retorno diluído pela diversificação.
De todo modo, no preço atual, o risco de uma queda abrupta das ações da Tim e da Vivo é bastante limitado, acrescenta Vieira, que enxerga no marco do saneamento um potencial de valorização significativo para a Sabesp.
Apesar de se tratar de um multimercado, cerca de 90% do retorno histórico do Total Return é oriundo do mercado de ações. Além da alocação em renda variável, o fundo entrou em 2020 com uma posição comprada (aposta na alta) no real, desfeita após o carnaval.
Nas últimas semanas, a gestora retomou a alocação na divisa brasileira, mas apenas como um “hedge” para as ações de exportadoras, como da Vale e dos frigoríficos. Também como mecanismo de proteção, uma alocação residual em ouro tem sido carregada pelo Total Return.
Redução do risco
Na JGP, o analista-chefe de ações, Fábio Fonseca, também vê na Vale um potencial de retorno atraente, dado o atual nível do câmbio e do minério de ferro, vis-à-vis o preço da ação, o que torna a empresa uma das principais apostas do “long bias” JGP Equity.
Assim como no multimercado da Logos, as ações da Oi também estão na carteira do JGP Equity há cerca de dois anos, ressalta Fonseca. B3, Equatorial, Localiza e Natura também foram citadas pelo analista chefe como ações de alta qualidade no portfólio, tidas como as mais indicadas para o cenário incerto esperado à frente.
A JGP se valeu da flexibilidade do “long bias” para reduzir em julho o nível de risco do fundo, que estava 100% alocado, e foi reduzido em cerca de 15%.
A postura mais cautelosa se justifica por diversas incertezas no horizonte, diz Fonseca, apontando as dúvidas sobre a resposta da economia ao fim do auxilio emergencial, ou relacionadas à maneira como o governo vai lidar com o delicado quadro fiscal. “Nesses níveis, a Bolsa está cara em termos de fundamentos, embora sempre seja possível encontrar boas histórias.”
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