Oportunidade virou risco? A notícia sobre o FIES que abalou as ações de educação durante a temporada – e por que analistas seguem otimistas

Notícia sobre dinâmica dos repasses de capital para fundo garantidor ofuscaram temporada das educacionais, mas analistas esperam reversão

Lara Rizério

(Getty Images)
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A temporada de resultados do segundo trimestre de 2023 (2T23) para as empresas do setor de educação, que têm ganhado destaque na Bolsa brasileira no ano pelo forte desempenho, foi vista como positiva no geral.

A maioria das empresas teve melhorias operacionais com aumento de tíquetes, melhor controle de custos e lucro líquido e redução da dívida.

Contudo, durante a temporada, algumas novidades com potencial de impactar negativamente o setor ofuscaram em parte os números divulgados pelas companhias. As notícias eram principalmente sobre “um risco FIES” (programa de financiamento estudantil), que tem sido visto como uma oportunidade e tem guiado as altas do setor na Bolsa.

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O movimento foi notório na sessão de 14 de agosto após a divulgação dos resultados da Ânima (ANIM3), que contou com uma queda de 19% das ações. No mesmo pregão, as ações do setor como um todo caíram forte, caso de Yduqs (YDUQ3), com derrocada de cerca de 15%, entre outras.

Ao longo dos dias, chamou a atenção do mercado as notícias sobre a dinâmica dos repasses para o FG-FIES, fundo garantidor para o qual empresas do setor contribuem para cobrir a inadimplência do programa, o que pressionou os ativos.

Na teleconferência de resultados, a Ânima ressaltou que a comunicação do governo sobre o tema não era clara, não dando visibilidade sobre a inadimplência com o programa.

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Os repasses tiveram início de 2015, com alteração nas regras do FIES para endereçar o alto nível de inadimplência. A partir de então, as empresas que captam alunos usando financiamento do FIES teriam que ajudar a compor o fundo, que teria que ter R$ 1 para cada R$ 10 de financiamento dado. O valor seria fixo até o fim de 2022 sendo que, a partir de 2023, o valor de contribuição seria definido com base nos contratos de cada empresa.

Com isso, neste ano, o limite foi levantado e, ao mesmo tempo, a inadimplência também aumentou substancialmente, provavelmente por conta dos novos alunos que começaram a se formar por meio do novo FIES.

Embora essa questão se aplique a todos os cursos, os de medicina são os mais expostos. Além disso, as empresas que divulgaram o 2T23 confirmaram impactos tangíveis apenas na medicina.

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Com esse cenário desenhado, analistas destacaram quais os possíveis impactos para as empresas do setor de educação e se esses cursos da área da saúde, vistos como pontos positivos para as companhias mais expostas, e até mesmo o FIES podem se tornar um ponto fraco para as empresas.

O Morgan Stanley vê um impacto possível entre 0% e 10% no preço-alvo das empresas de educação cobertas pelos analistas do banco. Porém, aponta, a expectativa é que esse impacto seja revertido conforme a regulamentação mude.

Para eles, houve uma reação exagerada ao risco de inadimplência do FIES. No release do 2T23, Yduqs e Anima relataram uma desaceleração nos preços médios do segmento de medicina, atribuída ao aumento das contribuições ao fundo garantidor.

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O risco de fato aumentou para as empresas, avalia, de antes 25% de limite de retenção até o ano passado para 100% este ano, um risco que as empresas não controlam e nem têm visibilidade no cálculo, reforça.

“Embora o impacto tenha sido uma surpresa para o mercado, nossa análise quantitativa sugere que a queda no preço das ações foi uma reação exagerada em um setor que, para começar, não descontava uma potencial recuperação do FIES nos próximos meses”, avaliam os analistas.

A retenção do FG-FIES é aplicada para cada instituição (não para cada curso), então também é difícil saber de qual curso vem a inadimplência, avalia ainda o Morgan.

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“Acreditamos que as empresas destinam as deduções proporcionalmente à receita do FIES, o que acaba impactando mais o negócio de medicina. Mas, na verdade, os alunos do curso de Medicina deveriam ter uma taxa de inadimplência menor, a nosso ver. Além disso, a primeira turma de alunos a seguir as novas regras de inadimplência (criadas em 2018) irá se formar no final de 2023, sendo que ainda nem começaram a pagar a dívida”, avaliam os analistas.

Efeitos não devem perdurar

O banco aponta que há dois efeitos para as empresas: (i) baixa retroativa dos recebíveis do FIES, e (ii) risco de maiores deduções da receita daqui para frente. O primeiro já está ajustado ao novo nível de retenção e é relativamente limitado, uma vez que representa “apenas” 3-6 meses de receitas, mas o segundo implica uma desvantagem em relação às previsões do banco.

O banco aponta que o impacto potencial em seus preços-alvo seriam de: -1% para Vitru/Afya, negociadas na Nasdaq, -3% para Cruzeiro ([ativo=CSDE3]), -5% para Yduqs, -6% para Cogna (COGN3)/Ser (SEER3), -9% para Ânima.

“Não incorporamos este efeito nos nossos preços-alvo e assumimos que o governo provavelmente restabelecerá um limite de retenção. Essa tendência continuará impactando os resultados no curto prazo, mas, em nossa opinião, os reguladores deveriam propor uma mudança no modelo atual, pois desencoraja as instituições a oferecerem o FIES”, avalia o Morgan.

Se o governo quiser expandir o programa, deve garantir que o setor tenha incentivos para oferecê-lo, ou seja, admitindo estudantes, mas compartilhando apenas uma parte limitada do risco de inadimplência, cita o banco. Além disso, o Congresso propôs projetos de lei que já colocam o limite de retenção a 25% e permitem aporte público de R$ 500 milhões ao FG-FIES.

Assim, para o banco, esse fator continuará afetando os resultados das empresas nos próximos trimestres, mas não é razoável assumir esse impacto de forma perpétua.

Na mesma linha, o JPMorgan destaca que o Ministério da Educação emitiu a portaria 390/23 determinando a criação de um grupo de trabalho para realizar estudos técnicos sobre o FIES sendo que, em conversa com participantes do setor, foi destacado que há sim a discussão de um limite de 25%.

O Morgan tem recomendação equivalente à compra (overweight) exposição acima da média do mercado para Cruzeiro do Sul, Ânima e Vitru, com preços-alvo respectivos de R$ 5,50 (upside de 25%), R$ 5 (upside de 52%) e US$ 24,50 (upside de 32%). Já para Afya, Cogna e Yduqs, a recomendação é equivalente à neutra (equalweight), com preços-alvos de US$ 16,50 (upside de 13%), R$ 3,50 (upside de 13%) e R$ 23 (upside de 8%), respectivamente. A Ser é a única com recomendação equivalente à venda (underweight), com preço-alvo de R$ 5,50 (queda de 13%).

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Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.