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O processo de recuperação judicial da Oi (OIBR3;OIBR4) é uma novela que se arrasta por mais de seis anos. No último mês de dezembro, parecia que ela havia chegado ao fim, com o decreto do juiz Fernando Viana, da 7ª Vara Empresarial do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. “Chega ao fim o mais impactante e relevante processo de recuperação judicial do judiciário brasileiro, e um dos casos mais complexos do mundo jurídico contemporâneo”, afirmou em sua decisão.
Contudo, menos de três meses após o decreto, a Oi entrou com um segundo pedido de recuperação judicial, em caráter de urgência. A medida já era esperada, já que a companhia estava com dificuldades para honrar sua dívida bilionária e havia conseguido proteção contra os credores na Justiça.
A Oi disse que vai continuar mantendo regularmente suas atividades, buscando a conquista de novos clientes, a operação e manutenção de suas redes e serviços, o atendimento de sua base de usuários, a contínua busca de eficiência e otimização de suas operações, sempre buscando evitar quaisquer prejuízos, descontinuidade ou intercorrência na prestação de seus serviços.
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Em 2022, a empresa voltou com tudo ao noticiário por conta do julgamento da venda de sua unidade móvel aos seus três principais concorrentes: TIM (TIMS3), Vivo (VIVT3) e Claro, por R$ 16 bilhões.
As três operadoras – até então rivais – dividiram os 40 milhões de clientes da Oi espalhados por todo o País. Dessa forma, quem tem um chip da Oi de celular viu sua linha migrar para TIM, Vivo ou Claro.
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Por mexer diretamente com milhões de clientes e por conta dos riscos de que o mercado fique mais concentrado na mão de menos empresas é que o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) – órgão de defesa concorrencial – precisou dar o seu aval à venda.
A saída da recuperação judicial, no entanto, ocorreu somente dez meses depois da aprovação da operação. Nesse intervalo, a Oi precisou se desfazer de outros ativos, na tentativa de equilibrar suas contas. A empresa deixou a RJ com mais de R$ 20 bilhões em dívidas e o desafio de crescer no negócio em que resolveu apostar: a fibra óptica.
O que houve com a Oi (OIBR3)?
De gigante das telecomunicações à protagonista da maior recuperação judicial do Brasil, o que aconteceu com a Oi nos últimos anos? Como a empresa conseguiu acumular uma dívida gigantesca e cometer tantos erros no negócio?
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Entenda a seguir a origem da empresa, como surgiram seus problemas e os atuais desafios da empresa.
Qual a origem da Oi?
A Oi foi criada em 1998 a partir da privatização do Sistema Telebrás, operando em 64% do Brasil. Na ocasião, a cisão da Telebras deu origem à holding Tele Norte Leste Participações, que passou a se chamar Telemar.
Por meio de um consórcio, foram investidos R$ 3,4 bilhões na constituição dessa holding, que abrigava 16 empresas. Os recursos que financiaram o consórcio vieram de fundos de pensão e do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDES). Basicamente, era como se o BNDES e os fundos de pensão fossem, ao mesmo tempo, acionistas e credores da nova companhia.
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Como foi a expansão das atividades?
O consórcio passou a adquirir outras empresas do setor, a fim de ampliar a participação da operadora no mercado. Com a ascensão da telefonia móvel, a empresa passou a investir nesse setor em 2002, com a marca Oi.
Em 2007, foi finalmente extinta a marca Telemar, e todos os negócios da companhia passaram a funcionar sob a marca Oi.
Para que se tornasse gigante, a Oi recebeu uma série de investimentos, entre os quais um considerável volume de recursos do Estado. Nesse sentido, o BNDES, o Banco do Brasil e a Caixa Econômica realizaram aportes nas ações do grupo em 2008.
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Com o objetivo de continuar crescendo, o consórcio seguiu comprando outras empresas. Porém, muitas delas só tinham dívidas e fracos resultados.
Um dos exemplos é a Pegasus, provedora de serviços de dados que tinha em seu quadro societário três empresas que adquiriram a Telemar na época da privatização: Andrade Gutierrez, La Fonte e GP. Na ocasião, a Telemar comprou a Pegasus por R$ 335,8 milhões e ainda assumiu uma dívida de R$ 339,1 milhões. Segundo a holding, o objetivo da compra era transformar a operadora de telefonia fixa em uma prestadora de serviços de voz para clientes empresariais.
Em 2009, mais uma negociação, dessa vez gigante, contribuiu para a expansão da Oi: a operadora comprou a Brasil Telecom por R$ 5,8 bilhões. Na ocasião, o valor foi considerado acima do mercado, mas foi dessa forma que a companhia passou a atuar em todo o Brasil.
Em 2013, foi anunciada a fusão com a Portugal Telecom, com o objetivo de criar uma empresa multinacional de telecomunicações. No entanto, os efeitos dessa negociação foram desastrosos para a saúde financeira da Oi, conforme veremos a seguir.
Quando começaram os seus problemas?
Muitas das aquisições realizadas pela Oi não foram um bom negócio para a operação como um todo. Ao contrário, entre os investimentos havia empresas com elevadas dívidas e resultados inconstantes, e isso contribuiu para a atual dívida bilionária da companhia.
A própria Brasil Telecom já estava endividada quando a Oi a comprou. Inclusive, na época da negociação, o mercado especulava que ambas poderiam ser adquiridas por grupos estrangeiros, pois a Oi era forte no Norte, Nordeste e Sudeste, e a Brasil Telecom, no Sul e Centro-Oeste.
No entanto, os problemas da Oi se agravaram mesmo quando ela não recebeu os R$ 3,2 bilhões previstos na fusão com a Portugal Telecom. Isso porque os recursos estavam aplicados em títulos podres em uma subsidiária do banco português Espírito Santo, que quebrou pouco tempo depois da fusão entre as duas empresas. Ou seja, o dinheiro da negociação nunca entrou no caixa da Oi, e ambas as empresas tiveram problemas.
Segundo Fabiano Vaz, analista da Nord Research, na época dessa negociação, nem a Oi nem a Portugal Telecom estavam em boas condições financeiras. “A Portugal Telecom era uma empresa muito grande e com um histórico bem ruim de resultados. Dessa forma, a Oi acabou adquirindo uma empresa com os mesmos problemas dela, o que só aumentou o tamanho do próprio problema”, avalia Vaz.
Outro erro da companhia foi ter investido também em empresas com foco em negócios que não faziam sentido para a operação. Nesse caso, Vaz destaca a participação da Oi na subsidiária Africatel, que foi vendida para uma petroleira angolana por US$ 1 bilhão.
“A Oi ficou do tamanho que é hoje por causa dessas aquisições, e nem todas foram bons negócios. Hoje a companhia ainda está pagando o preço desses investimentos ruins”, conclui o analista da Nord.
Por que a empresa entrou em recuperação judicial?
Com incentivos públicos e dinheiro em caixa, a companhia realizou diversas aquisições que criaram uma “super tele”, mas comprometeram a sua saúde financeira. Segundo analistas, a ideia da super tele era promissora, pois a Oi dominava uma grande área no país. O problema foram as dívidas, que cresceram de forma exorbitante por conta das aquisições e sangraram o caixa da companhia.
Outro motivo que contribuiu para a atual situação da Oi é o fato de muitos clientes terem deixado de utilizar a telefonia fixa. Isso fez com que a empresa, que era a maior operadora de telefone fixo do Brasil, perdesse boa parte de sua receita.
Por fim, a companhia tem dívidas também junto a Anatel, devido a multas por reclamações de clientes e má prestação de serviços.
Em setembro de 2016, com uma dívida de R$ 65 bilhões, a Oi teve aprovado o seu plano de recuperação judicial, o maior já visto no Brasil até hoje. Na assembleia, ficou definido que a companhia seria dividida em quatro partes: torres, ativos móveis, data center e fibra ótica.
O objetivo da recuperação judicial é permitir que a empresa continue a prestar serviços enquanto renegocia as suas dívidas. Dessa forma, o negócio se mantém ativo e os clientes não sofrem prejuízos.
Por que demorou tanto?
O fim da recuperação judicial da Oi estava previsto para outubro de 2021, mas foi adiado diversas vezes pela justiça.
Aos poucos, a empresa foi fazendo odever de casa. Em 2019, conseguiu aumentar o capital social em R$ 4 bilhões, conforme previsto no plano de recuperação judicial.
Em dezembro de 2020, vendeu a sua operação de telefonia móvel, medida que estava contemplada no plano de recuperação judicial, ao consórcio formado pela Claro, TIM e Telefônica.
O Ministério Público Federal se manifestou contrário ao aval do Cade à operação por “violações à concorrência”. O representante do MPF no Cade, Waldir Alves, também quer que o conselho apure se houve “conduta concertada entre as concorrentes e eventuais práticas exclusionárias”, o que poderia levar à anulação da operação.
Em entrevista ao portal UOL, Waldir Alves afirmou que TIM, Vivo e Claro deveriam ter avisado o Cade em julho de 2020, quando firmaram um contrato. Porém, a notificação ao órgão só veio em 8 de fevereiro de 2021, já para analisar a compra dos ativos da Oi pelas três empresas.
As operadoras negam que tenham constituído um consórcio.
Em agosto de 2022, a saída da RJ foi condicionada à venda de mais um ativo da companhia: mil sites de infraestrutura da operação fixa. Com um lance de R$ 1,697 bilhão, a NK 108 Empreendimentos, afiliada da Highline Brasil, arrematou as torres.
Caixa Econômica Federal, Banco do Brasil (BBAS3) e Itaú Unibanco (ITUB4) pediram a prorrogação do processo de recuperação da companhia e o bloqueio do dinheiro proveniente da venda de ativos para garantir o pagamento de dívidas, que totalizam R$ 6,9 bilhões.
Os bancos contestavam a falta de visibilidade sobre o valor apurado pela Oi com o conjunto de vendas de ativos, entre elas a sua rede móvel e o braço de fibra ótica.
“A alegação é infundada, visto que as vendas de ativos realizadas pelas recuperandas têm previsão constituída no plano e no aditivo homologados e vêm sendo realizadas como solução de mercado e parte estratégica do seu plano de reestruturação”, afirmou o juiz Fernando Viana, ao negar a prorrogação.
Sendo assim, na noite do dia 14 de dezembro de 2022, a saída da Oi da recuperação judicial foi finalmente decretada. No entanto, em 1º de março de 2023, um novo pedido de RJ foi feito à Justiça.