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Na última quarta-feira (22), o dólar encerrou uma sessão abaixo dos R$ 6 pela primeira vez desde 11 de dezembro, após fechar o dia em baixa de 1,41%, cotado a R$ 5,9463 no mercado à vista, também no menor nível desde novembro de 2024.
Mas a baixa se seguirá ou foi apenas um respiro momentâneo? Especialistas alertam que a sustentação da moeda americana abaixo de R$ 6 dependerá da manutenção de uma política econômica clara, do fortalecimento do arcabouço fiscal nos próximos meses, da política monetária americana e da moderação nas políticas comerciais e tarifárias do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, que até o momento tem adotado uma abordagem mais cautelosa em relação a medidas protecionistas prometidas durante sua campanha. Essa cautela, por sinal, tem sido apontada como um fator importante para a redução da pressão sobre o real, com o mercado diminuindo os prêmios de risco das cotações.
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Já segundo o diretor de câmbio da Ourominas, Elson Gusmão, o recuo do dólar foi impulsionado por uma combinação de fatores externos e internos, incluindo o fluxo de capital estrangeiro que tem entrado no início do ano, algo já esperado pelo mercado. Ele lembra que, no Brasil, embora ainda se aguarde sinalizações e medidas efetivas relacionadas ao arcabouço fiscal, esse movimento de capital tem ajudado a reduzir o dólar, refletindo maior confiança dos investidores no mercado interno. No cenário externo, Gusmão diz que a redução das tensões comerciais globais e maior estabilidade nos mercados internacionais também fortalecem o real.
A moeda brasileira, por sinal, seguiu a tendência de valorização observada em outras moedas emergentes, como o peso mexicano e o peso colombiano, beneficiadas pelo ambiente global mais otimista. Internamente, o mercado viu com bons olhos a apresentação de prioridades econômicas pelo governo brasileiro, incluindo propostas fiscais e tributárias, o que reduziu a incerteza. “A postura de Trump reduz as tensões globais e diminui a busca por ativos de proteção, como o dólar. Isso tende a beneficiar moedas emergentes, como o real, que podem se valorizar devido à melhora do apetite por risco”, diz Gusmão.
A tática de Trump
As políticas comerciais do recém-empossado Donald Trump, pautadas por medidas protecionistas como o Projeto 2025, têm o potencial de impactar diretamente o dólar no cenário global, explica o professor da Fia Business School, Marcos Piellusch. A proposta inicial dos Estados Unidos para a China, no contexto das tensões comerciais, envolvia medidas agressivas, como a imposição de tarifas universais de 10% sobre todas as importações e tarifas específicas, como 25% sobre produtos do Canadá e México, além de até 60% sobre bens chineses.
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O objetivo dessas tarifas, segundo o professor era fortalecer a indústria americana e reduzir déficits comerciais, incentivando a produção interna e buscando um equilíbrio maior nas relações comerciais com esses países. Ontem, porém, Trump adotou um discurso mais moderado, com a redução das tarifas sobre a China de 60% para 10%.
Essa mudança de postura, aliada à possibilidade de adiamento de outras políticas agressivas para fevereiro, contribuiu para amenizar a pressão sobre o dólar, segundo Thiago Avallone, especialista em câmbio da Manchester Investimentos. “Ele geralmente começa com medidas agressivas, para então abrir espaço para negociações tanto com seu time de governo quanto com outros países. Essa tática visa, de forma indireta, pressionar os parceiros comerciais a aceitar condições mais favoráveis aos interesses dos EUA, mas sem prolongar a tensão comercial por um período excessivamente longo”, afirma.
Embora o tarifaço possa beneficiar setores domésticos, Piellusch afirma que elas também elevam tensões comerciais e aumentam a incerteza global, o que historicamente pressiona a valorização do dólar como ativo de refúgio. “Essas políticas refletem uma abordagem mais agressiva em relação ao comércio internacional, com o intuito de proteger empregos e indústrias americanas, mesmo que isso implique em tensões com parceiros comerciais e possíveis retaliações”, pontua o professor.
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O problema é que, segundo ele, o fortalecimento do dólar pode gerar consequências indesejadas para os Estados Unidos e para seus parceiros comerciais. A conta não é complicada: uma moeda americana mais valorizada tende a encarecer os produtos exportados pelo país, reduzindo a competitividade das empresas americanas no exterior. Ao mesmo tempo, parceiros comerciais como Brasil, México e China poderiam retaliar com tarifas equivalentes ou buscar alternativas comerciais, o que afetaria os fluxos globais de capital e intensificaria a volatilidade nos mercados financeiros, com impacto direto na cotação do dólar.
Piellusch também sinaliza que a postura do Congresso, majoritariamente republicano, facilita a aplicação da agenda protecionista de Trump, mas a confiança dos investidores será um fator-chave. Caso as políticas ampliem tensões e diminuam a previsibilidade econômica global, o dólar pode se valorizar no curto prazo, mas com riscos de efeitos colaterais para a economia dos EUA e para o sistema comercial internacional.
Políticas fiscais do Brasil
O diretor de câmbio da Ourominas, Elson Gusmão, afirma que as políticas fiscais do Brasil têm grande impacto sobre o câmbio, especialmente em relação ao valor do real. Medidas que sinalizam responsabilidade fiscal, como o corte de gastos públicos ou aumento da arrecadação, diz ele, podem melhorar a percepção de risco do país e reduzir a pressão sobre o dólar.
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“Um cenário fiscal sólido aumenta o interesse de investidores estrangeiros em ativos brasileiros, como renda fixa e variável, promovendo a entrada de dólares no país e reduzindo a cotação da moeda americana”, explica Gusmão. Contudo, ele destaca que o mercado ainda aguarda medidas mais efetivas por parte do governo para garantir um controle fiscal expressivo.
Na mesma linha, Piellusch aponta que a implementação de uma política fiscal mais rígida tende a reduzir a pressão sobre o câmbio, uma vez que o mercado reage positivamente a ações que visam o controle do déficit público e o equilíbrio fiscal. Mas ele alerta que a incerteza quanto a aprovação dessas reformas fiscais no Congresso pode gerar volatilidade no câmbio. Se houver atrasos ou dificuldades na implementação das medidas, o mercado pode reagir negativamente, elevando a percepção de risco do Brasil e pressionando a cotação do dólar.
O que vai acontecer com o dólar?
O dólar pode seguir tendência de uma leve queda nas próximas semanas, com grandes eventos aguardados no cenário econômico global. É o que acredita José Faria Júnior, CEO da Wagner Investimentos. Na próxima quarta-feira, o mercado acompanhará atentamente as reuniões do Federal Reserve (Fed, o banco central americano) e do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central do Brasil, seguidas pelo Payroll (relatório de emprego dos EUA) de janeiro, em 7 de fevereiro, e o CPI (inflação ao consumidor dos EUA) de janeiro, no dia 12.
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Esses eventos, segundo ele, têm o potencial de movimentar a taxa de câmbio e impactar a percepção dos investidores. No entanto, José Faria considera difícil que o dólar caia abaixo de R$ 5,80 no curto prazo. “Para quem busca comprar dólares, especialmente para viagens ou ajustes no portfólio, este pode ser um momento interessante, com a cotação se aproximando de patamares mais favoráveis. Entretanto, é importante ficar atento aos próximos desdobramentos econômicos e às decisões das autoridades monetárias, que poderão influenciar a direção do câmbio nos próximos dias”, avisa.
Para Alison Correia, analista de investimentos e sócio-fundador da Dom Investimentos, para a a moeda permanecer abaixo dos R$ 6,00, o fator doméstico também contará, com o Congresso dando uma sinalização positiva sobre a agenda de contenção dos gastos públicos. O Congresso Nacional retoma os trabalhos no próximo dia 1º de fevereiro com as eleições para a presidência e a mesa diretora da Câmara e do Senado.