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SÃO PAULO – A Facebook Inc., controladora de Facebook, Instagram, WhatsApp e outras empresas, pegou muitos de surpresa ao anunciar, na quinta-feira (28), que estaria mudando seu nome para Meta. Mas, quem estava olhando um pouco mais de perto não ficou tão impressionado assim.
Além de um rumor sobre a repaginação da marca que começou a circular dias antes, o conceito de metaverso ao qual o novo nome faz referência não é novidade. O interesse da empresa de Mark Zuckerberg por este tema não é segredo há algum tempo, especialmente desde que ela adquiriu a Oculus, criadora do headset de realidade virtual Oculus Rift, atual Oculus Quest, em 2014.
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Em agosto deste ano, o Facebook anunciou um serviço que oferece uma sala de reuniões online para empresas que substitui a chamada de vídeo convencional por personagens virtuais (avatares) dentro de um mundo virtual compartilhado entre os participantes. Já era o primeiro passo público para o lançamento oficial do projeto de metaverso.
“Hoje somos vistos como uma empresa de mídia social, mas em nosso DNA somos uma empresa que constrói tecnologia para conectar pessoas, e o metaverso é a próxima fronteira, assim como a rede social foi quando começamos”, disse Zuckerberg em apresentação no evento Facebook Connect nesta semana.
O que Zuckerberg e a Meta se propõem a fazer, no entanto, vai muito além de conferências e lives divertidas em que não é preciso se preocupar com o cenário do home office. A ideia é criar um mundo novo em que as pessoas possam interagir entre si e com marcas, empresas e propriedades virtuais – uma espécie de Nova Era da Internet.
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O que é metaverso?
Metaverso é uma utopia futurista que envolve a combinação do mundo real com o virtual, levando a Internet e uma série de inovações tecnológicas que vão dos hologramas aos óculos de realidade virtual para o centro das conexões humanas.
O conceito não é novo. Desde a década de 1990, inspirados por filmes de ficção científica, pesquisadores e engenheiros do Vale do Silício sonham com um mundo em que computadores seriam tão presentes no dia a dia a ponto de os usuários ignorarem sua presença.
As primeiras tentativas de criar algo do tipo inevitavelmente optaram pela virtualização sem interação direta com o real. Um dos casos mais famosos é o do jogo Second Life, que surgiu em 2003, um ano antes de Zuckerberg criar o então “The Facebook” no seu dormitório em Harvard, e trouxe a proposta de emular o mundo real com a ajuda de avatares.
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O game atraiu entusiastas e cresceu a ponto de ter imóveis virtuais, jogos dentro do jogo, um marketplace e até uma moeda própria, a Linden Dollar. “O Second Life dava 50 Linden Dollars por semana apenas por logar”, relembra Adam Cochran, professor de ciência de negócios e fundador da Cinneamhain Ventures.
A moeda também podia ser obtida por meio de trabalhos dentro do jogo, que funcionavam como um emprego virtual em troca de um pagamento também que só valia dentro desse mundo artificial.
Um verdadeiro metaverso, no entanto, vai além da proposta do Second Life, pois envolve algo capaz de permear toda a sociedade.
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“A ideia é ter um mundo virtual se comunicando real, o que a gente chama de realidade mista, mas de uma forma que seja do cotidiano, não uma experiência isolada, como um jogo ou uma sala de reunião”, explica Guilherme “Moika” Menezes, consultor em engenharia de software do centro de inovação Cesar.
No metaverso, em vez de usar um login para acessar um site na web, o usuário irá de fato entrar no ambiente virtual usando um avatar. Se hoje para comprar uma roupa online é preciso navegar por um catálogo no computador, em breve o consumidor poderá visitar uma loja em 3D usando um óculos especial e poderá experimentar as roupas, comprar e receber os produtos reais em casa.
Na visão da Meta, os próprios avatares desse universo online serão como itens em um guarda-roupa: o usuário poderá escolher qual personagem vestir a depender da ocasião, como uma reunião de trabalho ou um momento de descontração com os amigos. Já o guarda-roupa estará dentro de um espaço pessoal, uma casa dentro do metaverso.
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“Você poderá desenhá-la do jeito que quiser, convidar amigos para jogar e curtir, e de onde você pode se teletransportar para qualquer lugar que quiser dentro do metaverso”, explicou Zuckerberg ao apresentar a novidade ainda em desenvolvimento.
O que isso tem a ver com cripto e blockchain
A implementação dessa utopia está diretamente ligada ao avanço tecnológico atual e a aposta de que o Facebook assume a dianteira desta corrida após ter rompido limites de hardware e software e estar quase pronto para demonstrar algo concreto.
“O Facebook possivelmente identificou que estava em um bom momento da tecnologia, que seria possível quebrar algumas barreiras de latência e de qualidade gráfica para dar uma melhor experiência para o usuário e evitar tonturas, que era algo que acontecia bastante”, explica o engenheiro de software do Cesar.
No entanto, em vez de MySpace e Orkut, o Facebook terá dessa vez um concorrente incomum e que opera segundo uma lógica diferente. Entusiastas de blockchain e criptoativos apostam que a descentralização é a saída para obter o poder computacional e a mão-de-obra de programação necessários para esta revolução.
“Na nossa visão, vamos entrar no metaverso por meio de jogos. O Star Atlas pode ser um deles”, aponta Alexandre Vasarhelyi, sócio e gestor da BLP Asset, em referência a um novo jogo em blockchain em desenvolvimento na Solana (SOL), uma plataforma rival do principal sistema operacional para apps descentralizados, o Ethereum (ETH).
Embora o jogo ainda não tenha sido lançado, um único trailer e a promessa de entregar gráficos de ponta foi capaz de atrair US$ 24 milhões nos primeiros dias de captação de investimentos e fazer dois de seus ativos digitais emitidos na blockchain dispararem 5.000% apenas na data de abertura do mercado secundário.
Para o especialista, o trunfo de soluções do tipo é distribuir o esforço entre muitas pessoas e máquinas para criar um mundo que requer capacidade computacional monumental e sempre online – o conceito de metaverso, afinal, prevê que ele estará disponível a todo momento.
Em vez de servidores e código proprietário do Facebook, os apps que rodam na blockchain são open source e, portanto, podem ser melhorados pela coletividade. Além disso, funcionam segundo um sistema de incentivos similar à rede do Bitcoin, que remunera com um token quem ajuda a manter a rede em pé 24 horas por dia. Nesta modalidade de metaverso, quem tiver interesse poderá ser pago para rodar uma parte do software na sua própria máquina.
“Até hoje ninguém conseguiu fazer, agora o Facebook vai tentar. Nossa aposta é que vai haver algumas blockchains operando em conjunto no futuro, mas ainda é cedo para afirmar quem será o ganhador”, afirma Vasarhelyi.
Apesar disso, investidores parecem querer escolher o cavalo vencedor desde já e apostam nos projetos em blockchain que podem surfar na onda de popularização do metaverso liderada pela Meta. Um dia após o anúncio da mudança de nome, os preços de vários criptoativos ligados a projetos de mundos virtuais passaram por crescimento expressivo.
O principal deles foi o Decentraland (MANA), ativo digital que disparou quase 70% em cerca de 24 horas. Ele abastece um mundo virtual criado de maneira colaborativa e que, recentemente, recebeu investimento de US$ 100 milhões da Binance Smart Chain, outra rival do Ethereum, que é patrocinada pela exchange Binance.
Os tokens Axie Infinity (AXS) e Yield Guild Games (YGG) também subiram entre 13% e 20% na expectativa de que a nova tendência levará mais usuários para jogos em blockchain que não são necessariamente potenciais metaversos, mas que bebem da mesma fonte.
O dilema da privacidade
Apesar do otimismo em relação à tecnologia e da crença de que já existem dois modelos em curso, um centralizado e um descentralizado, o conceito de metaverso esbarra inevitavelmente na discussão sobre privacidade – cujo centro é comumente ocupado pela empresa de Zuckerberg.
“A privacidade possui um valor social e político, sempre, […] conecta-se às estruturas sociais de uma sociedade e aos valores constitucionais”, explicou Rafael Zanatta, diretor da Associação Data Privacy Brasil de Pesquisa, em entrevista recente.
O especialista ressalta que seria absurdo limitar “a grandeza dessas discussões” ao campo jurídico, e que o debate para criação de um metaverso que vá além de um simples espaço para captura de dados deverá ser permeado por discussões entre engenheiros, filósofos e estudiosos de temas que cortam a psicologia, a sociologia e a antropologia.
“As questões são muito mais importantes e grandiosas do que meras tecnicidades de regulação econômica e direitos digitais”, afirmou.
Ainda assim, a palavra privacidade não é citada uma única vez no texto oficial de anúncio da Meta, o suficiente para reacender críticas à rede social envolvida em escândalos que vão do caso Cambridge Analytica na eleição de Donald Trump em 2016, ao recente “Facebook Papers”, o vazamento de documentos internos que apontam o envolvimento da empresa em episódios de violência pelo mundo, como a invasão ao Capitólio nos EUA.
Para Alexandre Vasarhelyi, da BLP, a reputação da companhia, assim como sua ligação com os EUA, pode jogar a favor de soluções descentralizadas e anônimas. “Posso estar errado, mas acho que outros países não vão querer estar dentro do metaverso do Facebook”.
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