O dilema da Bolsa brasileira e do câmbio com a queda da popularidade do governo

Enquanto mercados reagem bem a pesquisas eleitorais mostrando queda de popularidade de Lula, por outro medidas do governo para estancar baixa aumentam risco fiscal e afetam ativos

Lara Rizério Felipe Moreira Agências de notícias

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Além da turbulência internacional com as tarifas de Donald Trump e as tensões geopolíticas, os ativos brasileiros se deparam com suas próprias questões, principalmente relativos à política doméstica.

Por sinal, as indicações recentes do governo e pesquisas mais de um ano e meio antes da eleição acabaram tendo impactos em sentidos diferentes para os ativos brasileiros nas últimas semanas, causando um “dilema no mercado”.

Em meados de fevereiro, os ativos brasileiros – caso de Ibovespa, dólar e juros – reagiram positivamente a pesquisas que mostraram perda de popularidade do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), trazendo maiores probabilidades de uma renovação política nas próximas eleições e indicando que 2026 já está no radar dos investidores.

O pregão de 14 de fevereiro foi emblemático para mostrar que o pleito está realmente já repercutindo no mercado: entre outros fatores, naquela sessão, o Ibovespa saltou 2,70%, enquanto o dólar caiu mais de 1%, após o Datafolha mostrar que a aprovação de Lula caiu para 24%, em seu pior patamar de todos os seus mandatos.

Em relatório semanal chamado “Canário da Mina” do dia 21 de fevereiro, o economista-chefe da G5 Partners, Luís Otávio Souza Leal, destacou que a baixa repentina e brusca da popularidade de Lula, associada à provável condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), antecipou as apostas para as eleições de 2026 e traz uma boa e uma má notícia para os investidores.

A boa notícia, de acordo com Souza Leal, é que há uma luz no fim do túnel para os ativos brasileiros em 2025. “A cada pesquisa eleitoral desfavorável ao atual presidente, devemos ver uma valorização do mercado local, independentemente do cenário externo”, pontuou o economista da G5 Partners.

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A má notícia, continuou o economista, “é que esse vai e vem dos ativos provocará muita incerteza e mais volatilidade – como se já não bastasse a que vamos ter por causa de Donald Trump”.

Ainda, de acordo com Souza Leal, a tendência é que, nesse cenário de queda de popularidade, “Lula reaja com mais medidas populistas, o que seria ruim para os mercados, mas, por outro lado, aumentaria a chance de uma alternância de poder a partir de 2027, algo interessante para os ativos brasileiros”.

Esses desdobramentos que aumentaram o temor fiscal foram se dando ao longo das semanas seguintes, sendo um dos fatores para que o dólar subisse e a Bolsa caísse na última semana de fevereiro.

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Na segunda-feira da semana passada, Lula falou em rede nacional sobre dois programas federais — o Pé de Meia e o Farmácia Popular –, ressaltando sua abrangência. Mesmo sem novidades, o pronunciamento de Lula foi citado por profissionais como um motivo de cautela no mercado.


“Acho que isso sempre dá um certo medo, que é o medo que a gente vai ter daqui para frente, que é como este governo reage à queda de popularidade”, pontuou à Reuters Marcos Moreira, sócio da WMS Capital. “Se a reação for mais gasto, mais contabilidade criativa… Aí o mercado fica aqui mais cauteloso.”

Já no fim da semana passada, o Ibovespa perdeu a marca dos 123 mil pontos e o dólar ultrapassou os R$ 5,90 em meio à escolha do presidente Lula para que a presidente do PT, Gleisi Hoffmann, assuma o ministério de Relações Institucionais (SRI) no lugar de Alexandre Padilha, anunciado como próximo ministro da Saúde.

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A visão é de que as recentes mudanças no ministério feitas pelo presidente podem aumentar o isolamento do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, dentro de um governo em que disputas internas alimentam incertezas sobre a política econômica e temores de uma guinada populista para reavivar a popularidade em queda.

Na posição de ministra das Relações Institucionais, Gleisi será responsável pelas principais negociações do governo com o Congresso, inclusive na agenda econômica. Na sua posição de presidente do PT, a agora ministra não poupou críticas, por vezes públicas, às políticas da Fazenda. Chegou a chamar as propostas de Haddad de “austericídio” e criticou duramente o aperto monetário do Banco Central, mesmo com o ministro da Fazenda reconhecendo publicamente a necessidade de desacelerar a economia para evitar desequilíbrios.

Assim, apesar de o mercado repercutir positivamente o enfraquecimento da popularidade de Lula tendo em vista as eleições de 2026, a atuação do presidente para reverter este cenário pode trazer maior aversão ao risco, o que impacta diretamente os ativos nacionais.

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Muito cedo para dizer algo?

Apesar de 2026 já trazer impacto para os ativos, analistas ainda apontam ser muito cedo para definições maiores para o pleito eleitoral. Mas uma coisa é certa: até lá, haverá volatilidade no mercado brasileiro.

A equipe de estratégia da XP ressaltou em relatório o longo período até as eleições presidenciais do 4T26, com volatilidade que certamente acompanhará o cenário político.

Levando em conta também os riscos fiscais, como uma possível reforma tributária da renda (ampliação da faixa de isenção do imposto de renda, taxação sobre dividendos e juros sobre capital próprio, a XP favorece exposição a ações de exportadoras, setores defensivos e empresas de margens altas e baixa alavancagem financeira. A estimativa de valor justo para o Ibovespa segue em 145.000 pontos para o final de 2025.

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O JPMorgan ressalta ser cedo um posicionamento pensando nas eleições do ano que vem. Além disso, ressalta que as pesquisas eleitorais geraram recentemente um efeito FOMO (medo de ficar de fora), mas o banco considera arriscado se posicionar com base nas eleições.

Em relatório analisando as eleições nos mercados emergentes e, especificamente no Brasil, não houve nenhuma eleição em que o MSCI Brazil superou o MSCI EM nos seis meses anteriores ao pleito. A análise do banco mostrou um forte ganho no mês das eleições, mas seis meses depois o cenário era o mesmo.

De acordo com relatório, a única ocasião em que houve ganhos desproporcionais foi durante o impeachment em 2016. O JPMorgan explica que isso ocorreu porque foi a única situação em que o país passou de um governo populista para um não populista, o que pode ser um possível cenário para 2026.

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O chefe do Departamento Econômico da G5 Partners, por sua vez, aponta que “vale a pena salientar também que os níveis atuais da aprovação de Lula, apesar de baixos para os padrões históricos de seus governos, ainda não fazem com que a oposição seja favorita. Além das questões envolvendo as estratégias de Bolsonaro, devemos lembrar que uma aprovação ao redor de 46% – no critério aprova/desaprova – mensurada na pesquisa da AtlasIntel/Bloomberg o mantém como favorito para o pleito”.

Souza Leal lembra ainda que, segundo um estudo da consultoria Eurasia, juntamente com o instituto IPSOS, que englobou milhares de eleições no mundo, somente com uma aprovação abaixo de 40% o incumbente deixaria de ser favorito. “Então devemos tomar muito cuidado com prognósticos de derrota de Lula na eleição de 2026 e, principalmente, com estratégias montadas sobre esse cenário. O caminho até outubro do ano que vem será longo e acidentado, estilo off road”, reforçou o economista.

(com Reuters e Estadão Conteúdo)

Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.