Como novo lockdown na China deve impactar a economia brasileira e gerar mais inflação

Falta de semicondutores, essencial a vários setores, já fez indústria auto interromper produção; novo problema não está descartado

Augusto Diniz

Getty Images
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Com mais de 20 importantes cidades e 200 milhões de habitantes em lockdown ou parcialmente isolados por conta da nova onda de contaminações pela Covid-19 na China, aumentam as preocupações que essa nova paralisação causará, sobretudo, à inflação, por conta da quebra da cadeia global de fornecimento.

“O risco maior é a inflação no mundo, que já está passando por graves processos inflacionários há dois anos”, destaca Sérgio Vale, economista-chefe da MB Associados. “É agravante de uma crise que já vem há algum tempo”, completou.

O lockdown na China atinge principalmente os produtos manufaturados importados pelo Brasil, como os semicondutores, que já sofrem escassez de oferta desde meados de 2020 devido à dificuldade de produção com a pandemia.

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Indústria automotiva pode parar de novo

A falta do dispositivo eletrônico, essencial em vários setores, foi tão aguda no final do ano passado que fez a indústria automotiva interromper a produção – e o mesmo problema pode ocorrer novamente.

“Não sei se a indústria automotiva vai parar. Isso vai depender do prazo em que vai ficar em lockdown. Há indicações de flexibilização na China”, diz o economista Roberto Dumas, especialista em economia chinesa.

“Mas mesmo que flexibilize hoje, os semicondutores que estão lá aguardando embarque, vão levar de seis a nove semanas para chegar aqui. A indústria automotiva tem estoque para três meses”, pontua. “É choque de oferta e inevitável aumento do preço”, acrescentou.

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Para Vale, dada a importância da China em exportação de produtos industrializados, não é só a cadeia de automóveis que deve ser impactada.

Dificuldade de reposição

Na Sondagem Conjuntural do Setor Elétrico e Eletrônico de março, da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee), 58% das empresas do setor relataram dificuldades de aquisição de componentes e matéria-prima por falta dos mesmos no mercado.

A maior dificuldade vem de itens provenientes da Ásia e o documento já apontava preocupação da indústria nacional com lockdown em algumas regiões da China. O documento não indicava paralisação de produção por conta de escassez de insumos.

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No caso do Brasil, além dos semicondutores, é esperado impacto em artefatos de borracha, eletrodomésticos, produtos eletroeletrônicos e têxteis, entre outros itens.

Contêineres são o grande gargalo

O grande gargalo na China tem sido o congestionamento de contêineres, que são os recipientes que transportam todos os manufaturados que saem de lá. Como cidades portuárias estão em lockdown, caminhões do interior não conseguem acessar os portos, além dos motoristas precisarem ser testados contra o coronavírus durante a viagem.

“É um movimento lento. Os navios estão esperando esses contêineres e os que estão nos portos não conseguem descarregar”, diz Dumas.

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Para José Augusto de Castro, presidente-executivo da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), o lockdown ampliado na China faz com que o problema se espalhe pelo mundo.

“Estamos falando da China ao mesmo tempo em que se tem a guerra da Rússia-Ucrânia, que irradia outros problemas, mas que atinge a economia mundial. E tem-se a pandemia ainda não controlada no mundo”, destaca o presidente da AEB.

Na última Sondagem da Abinee, o fato da Rússia e da Ucrânia serem dois grandes produtores de insumos para chips semicondutores, 31% das empresas já mostravam preocupação com o possível impacto na produção mundial de componentes eletrônicos com o conflito – na sondagem anterior, apenas 6% da indústria tinha essa preocupação.

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Roberto Dumas, por outro lado, aponta que como o lockdown provocará queda no crescimento chinês, a demanda por petróleo tende a ser menor, assim como o minério de ferro, este importante item da pauta de exportação brasileira para China.

Na média das instituições financeiras, a previsão de crescimento do PIB chinês em 2022 caiu de 5% para 4% por conta do último isolamento social determinado no país.

Commodities agrícolas não devem ser tão afetadas

As commodities do agronegócio brasileiro exportadas para a China, entretanto, devem sofrer impacto menor. “As pessoas estão em lockdown, mas vão continuar se alimentando”, afirma Sérgio Vale. Segundo o economista, há um esforço grande do governo chinês em evitar inflação de alimentos, o que favorece as commodities agrícolas.

Xangai é o maior porto do mundo, inclusive na movimentação de contêineres, e é um hub global de navios. No entanto, é uma das cidades chinesas a onde o lockdown foi implantado com maior rigor.

Já o porto de Shenzhen, também um dos maiores do mundo, localizado na região de mesmo nome, é o hub de semicondutores (tech hub) e tem sofrido com o lockdown.

O governo tenta ainda controlar a pandemia, com política de tolerância zero, com a população ainda a ser vacina e novas cepas surgindo, avalia Dumas, que já trabalhou por vários anos na China. “É um lockdown severo. Não é o que a gente vê no ocidente”, comenta Sérgio Vale.

Outro item importante de impacto é o frete, segundo José Augusto de Castro. “Já estava muito caro e vai ficar um pouco mais, com os contêineres ‘hibernando’”, diz. Quanto mais tempo o contêiner demora para o embarque e o desembarque, mais custos gera à cadeia logística.

Dólar deve subir

O economista-chefe da MB Associados explica que tanto China como Estados Unidos são importantes para se definir o câmbio no Brasil. No caso chinês, está relacionado ao crescimento econômico; no caso americano, dos juros.

“E as duas estão francamente negativas nesse sentido”, diz Sérgio Vale. O economista diz que já considerava o dólar abaixo de R$ 5, como “insustentável”.

Segundo ele, “nunca foi nosso cenário (dólar abaixo de R$ 5) por conta desses riscos que temos, além da questão na China e Estados Unidos”. No caso da China, ele considera o problema menor e acredita numa retomada econômica naquele país em breve, mas a alta dos juros nos Estados Unidos “só está começando”.

A guerra Rússia-Ucrânia e a turbulência política numa eleição disputada são outros dois fatores de pressão no câmbio, segundo o economista-chefe, e devem elevar o preço do dólar acima de R$ 5, depois de alguns meses flutuando na casa dos R$ 4.

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