Nova postura durará? As questões do mercado após Galípolo ser indicado à chefia do BC

Analistas apontaram que indicação já era amplamente esperada e destacam recente postura preocupada com inflação de Galípolo, mas que resta saber se ela será mantida

Lara Rizério

O secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Gabriel Galípolo, durante reunião (Foto: Washington Costa/Ascom/MF)
O secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Gabriel Galípolo, durante reunião (Foto: Washington Costa/Ascom/MF)

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Uma indicação já esperada, mas que trouxe repercussões para o mercado nesta quarta-feira (28). O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, anunciou nesta quarta-feira que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva indicará Gabriel Galípolo para substituir Roberto Campos Neto na presidência do Banco Central a partir de 2025.

Galípolo afirmou que é “uma honra, um prazer e uma responsabilidade imensa” receber a indicação, ressaltando estar muito contente. Ex-número dois de Haddad na Fazenda, Galípolo atua desde julho de 2023 como diretor de Política Monetária do BC. Com bom trânsito na equipe econômica e no Congresso, além de contar com a confiança de Lula, ele já era visto no mercado e no governo como um nome consolidado para assumir a presidência da autarquia.

Mestre em Economia Política, Galípolo foi sócio-diretor de consultoria especializada em estruturar concessões e Parcerias Público-Privadas, conselheiro da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) e presidente do Banco Fator. Ele também é autor de livros em parceria com o economista desenvolvimentista Luiz Gonzaga Belluzzo.

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Apesar das críticas feitas por Lula ao nível dos juros no país desde o início do governo, as falas públicas recentes de Galípolo têm sido lidas por analistas de mercado como alinhadas a uma visão mais dura para a condução da política monetária. Ele também tem enfatizado que o presidente da República sempre deu liberdade e autonomia aos diretores da autarquia.

Desde a última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), no final de julho, quando a diretoria do BC foi unânime em manter a taxa básica de juros em 10,50% ao ano e incluir em seu cenário uma possível alta da Selic se necessário, Galípolo tem liderado a comunicação do colegiado, reafirmando que a diretoria não hesitará em subir juros se preciso.

Evandro Buccini, sócio e diretor de gestão de crédito e multimercado da Rio Bravo Investimentos, ressalta que o principal ponto a destacar é que sua nomeação já era amplamente esperada.

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“Portanto, as reações do mercado não têm grande relevância aqui, apesar de ter havido um leve movimento [adicional] de desvalorização no câmbio”, aponta, com o dólar comercial fechando em alta de 0,99%, na casa de R$ 5,55, enquanto os juros futuros subiram.

Buccini ressalta o perfil mais político de Galípolo comparado aos recentes ocupantes do cargo, mas também é economista e tem experiência bancária, o que o mantém conectado ao mercado financeiro. Ele também lembra que o indicado já foi secretário-executivo e teve um papel ativo na campanha de Lula, o que adiciona uma dimensão política ao seu perfil.

Por outro lado, aponta Buccini, sua atuação breve como diretor do Banco Central é marcada por dois períodos distintos: inicialmente, um período mais dovish (brando, preferindo cortar juros), no qual ele foi um voto vencido ao defender cortes maiores, e mais recentemente, um período mais hawkish (preocupado com inflação, preferindo aumentar juros), onde ele foi possivelmente o membro mais hawkish do colegiado. 

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Carla Argenta, economista-chefe da CM Capital, também avalia que desde meados do ano passado, seu nome já estava vinculado ao Copom, e as preocupações iniciais sobre uma possível influência política petista foram sendo gradualmente dissipadas.

Em primeiro lugar, avalia a economista, Galípolo demonstrou uma postura consistente com o mandato da instituição, adotando uma abordagem firme na condução da política monetária, especialmente quando as expectativas de mercado se desestabilizaram.

Em segundo lugar, seus discursos e atitudes têm sido muito semelhantes aos dos outros membros do Copom, incluindo aqueles indicados pelo governo anterior, o que evidencia a prevalência do critério técnico nas decisões de política monetária entre os indicados pelo novo governo. Em terceiro lugar, o Banco Central está agora protegido por normas e regras que evitam ingerências políticas e pressões do Executivo.

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“Nesse contexto, o período em que Galípolo integrou o Comitê de Política Monetária ajudou a consolidar sua credibilidade no mercado, reduzindo significativamente as preocupações que antes cercavam seu nome. Portanto, quando Gabriel Galípolo assumir a presidência do Banco Central, a instituição deverá continuar a focar com responsabilidade nas suas metas primárias, especialmente no controle da inflação”, avalia a economista.

Curto e longo prazos

Até antes mesmo de assumir o cargo, Buccini ressalta ser provável que, para ganhar credibilidade, Galípolo vote a favor de um aumento na taxa de juros na próxima reunião, de 18 de setembro, alinhando-se com seu discurso.

No entanto, pondera que resta saber se essa postura será mantida, já que ele não segue os mesmos modelos que a maioria no Banco Central, mas se adaptou rapidamente à instituição e passou a falar a mesma linguagem dos demais membros. 

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“No curto prazo, não se esperam grandes volatilidades ou surpresas. No entanto, a verdadeira avaliação de sua atuação e seu alinhamento com o novo governo será mais clara após um período, especialmente considerando que o governo ainda precisa nomear três diretores, incluindo a substituição de Galípolo”, avalia.

Assim, o especialista acredita que só no final do próximo ano, ou cerca de seis meses após a nomeação, pode-se realmente entender seu impacto e suas decisões.

Rodrigo Cohen, analista de investimentos e co-fundador da Escola de Investimentos, acredita que Galípolo seja um “heterodoxo moderado”, com um perfil desenvolvimentista e mais parecido com a política de gestão do PT, colocando o estado como maior, com mais responsabilidade.
“Mas, ao mesmo tempo, ele acredita que em alguns casos deve existir privatização sim, já comentou diversas vezes sobre parcerias público-privadas, ou seja, não é um esquerda radical, um desenvolvimentista radical, é moderado. (…) Está dentro do que o mercado espera”, avalia Cohen, ressaltando que a princípio ele deve seguir a cartilha do que vem falando e que pode fazer uma boa presidência no Banco Central.

Para Cohen, Galípolo também pode servir como interlocutor entre o mercado e o governo. “Isso é uma coisa muito positiva, se de fato ele conseguir agir assim, contribuindo para manutenção da política fiscal de uma forma mais responsável”, avalia o especialista.

Gustavo Cruz, estrategista-chefe da RB Investimentos, avalia que também resta entender como Galípolo abordará questões como a interferência no câmbio. O ministro Haddad e sua equipe política criticaram Campos Neto por permitir uma valorização excessiva do câmbio sem suavizar o movimento. Para o estrategista, será importante observar como Galípolo lidará com futuros ajustes nas metas de inflação e como conduzirá o ciclo de corte de juros.

“Acredito que, por ter sido diretor, Galípolo não provocará tanta volatilidade quanto teria sido o caso se o Banco Central não fosse independente e ele fosse indicado logo no início do mandato de Lula”, ressalta.

(com Reuters)

Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.