Por que o Ibovespa tem o pior desempenho entre as Bolsas mundiais?

Juros altos nos Estados Unidos explicam parte da queda, mas fatores internos fazem Ibovespa ficar aquém até mesmo de pares emergentes

Vitor Azevedo

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Além do real ter a pior performance entre moedas emergentes, a Bolsa brasileira também figura entre as últimas colocadas nas comparações com outras bolsas mundo afora, tanto de países emergentes como de desenvolvidos.

O Ibovespa recua, em dólar e considerando os rendimentos totais, 20,3% no ano, o que o caracteriza como o pior índice do mundo.

A pedido do InfoMoney, a XP preparou um levantamento com alguns países e regiões selecionadas que mostram o quanto o desempenho da Bolsa brasileira é negativo no ano.

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País/regiãoPerformance (%)
1. Taiwan25.6
2. Argentina25.2
3. S&P 50015.5
4. Peru15.5
5. Índia15.0
6. Mercados Desenvolvidos11.9
7. China7.3
8. Europa6.3
9. Mercados emergentes6.3
10. Colômbia5.4
11. Japão3.8
12. África do Sul0.3
13. Coreia -2.6
14. Chile-2.9
15. América Latina-17.0
16. México-17.5
17. Ibovespa-20.3
Fonte: XP. Comparação em dólares; com dados acumulados em 2024 até 17/6

Por que o Ibovespa lidera a queda das Bolsas mundiais?

O fraco desempenho da Bolsa brasileira, em relação às demais ao redor do mundo, tem como explicação fatores internos e externos, como veremos a seguir:

Juros altos nos EUA valorizam dólar e retiram dinheiro de bolsas. Sede do Federal Reserve em Washington (Foto: Kevin Lamarque/Reuters)

Juros altos nos EUA

Em grande parte, os motivos que levam o principal índice da Bolsa brasileira a cair são os mesmos que explicam o recuo da moeda brasileira.

Os juros altos nos Estados Unidos mantêm o dinheiro longe dos ativos de risco e dos países emergentes, enquanto os problemas internos brasileiros, principalmente os políticos e fiscais, pioram a situação. 

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“A política monetária restritiva persistente nos Estados Unidos vem mantendo a atratividade dos títulos de renda fixa americanos e têm influenciado o fluxo de capital global”, explica Hayson Silva, analista da Nova Futura.

Incerteza sobre Fed

Além disso, nos Estados Unidos, 2024 vem sendo marcado pela dúvida em relação a quando o Federal Reserve poderá iniciar seu ciclo de queda dos juros.

No fim de 2023, dados sugerirem uma desaceleração da economia do país, fortalecendo a crença de que o ano seguinte seria marcado por, ao menos, quatro cortes da fed funds.

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Nos últimos meses de 2024, contudo, uma série de números acima do esperado (apesar de, recentemente, alguns terem voltado a desacelerar) mudaram o humor do mercado.

Hoje, a visão é de que serão apenas dois cortes por parte do Fed – no melhor dos cenários.

Com os juros mais altos por lá, investidores acabam preferindo manter o dinheiro na renda fixa norte-americana.

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Isso porque os títulos do tesouro dos EUA são considerados “isentos de risco” e quando pagam taxas maiores diminuem a atratividade de outros investimentos (caso da Bolsa brasileira).

Fraca economia chinesa

Fora isso, ainda de olho no exterior, o Ibovespa também vem sendo impactado, como lembra Silva, da Nova Futura, pela fraca economia chinesa.

O gigante asiático, maior consumidor de commodities do mundo, vem trazendo dados econômicos fracos, o que diminui o otimismo com o Brasil, que exporta muitas commodities.

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O minério de ferro, por exemplo, no dia 20 de maio negociava a cerca de US$122,5 e hoje está mais próximo dos US$ 105

Bolsas de países desenvolvidos

Especialistas também destacam que as performances das Bolsas de países desenvolvidos, principalmente nos Estados Unidos, também vêm diminuindo os investimentos no Brasil.

Com os ativos de risco performando bem por lá, surfando por exemplo no hype da inteligência artificial, a Bolsa brasileira perde sua atratividade.

Até o começo de junho, investidores estrangeiros já tinham tirado R$ 34,6 bilhões da Bolsa brasileira

Governo vem tendo dificuldade em acenar com corte de gastos, o que eleva a percepção de risco fiscal. Palácio do Planalto (Foto: Anderson Riedel/PR)

Problemas políticos e fiscais

Mas o Ibovespa sofre também por questões internas, o que explica o fato de o índice brasileiro estar ruim na comparação mesmo com os seus pares emergentes. Esses países usualmente sofrem quando os juros nos Estados Unidos estão mais altos, por conta da relação entre risco e retorno. 

“A performance da bolsa brasileira atual está também intimamente ligada a fatores internos. Acho que fica muito claro que o mercado já esgotou o benefício da dúvida que tinha dado para o planejamento da nova equipe econômica”, comenta Felipe Moura, analista da Finacap.

Ele menciona, por exemplo, o fato de as metas fiscais do Governo Federal terem mudado menos de um ano após a aprovação do novo arcabouço, o que minimizou a credibilidade do governo em relação à manutenção das contas públicas. 

“O governo vem tendo gastos acima do esperado, o que deve fazer as taxas de juros pararem de cair. Isso gera aversão ao risco e provoca queda da bolsa, com uma migração para a renda fixa”, diz Fernando Bresciani, analista de investimentos do Andbank.

A dificuldade do governo em compor a sua receita, encontrando certa resistência à MP das compensações e à “PEC das blusinhas”, por exemplo, também aumenta o risco fiscal e, consequentemente, os juros. 

Por fim, essas iniciativas do executivo ainda criam insegurança jurídica, o que também afasta os aportes. A MP das Compensações, por exemplo, foi criticada por ter saído “do nada” e ter colocado em xeque os resultados das companhias.

“Adicionalmente, eu citaria que a incerteza gerada por discursos de pessoas ligadas ao governo, inclusive o Presidente, geram muito ruído e assimetria informacional, o que faz com que o risco do investimento em bolsa aumente significativamente. Foram vários os ruídos criados com relação a Petrobras, a Vale, a Eletrobras”, debate Felipe Pontes, diretor de gestão de patrimônio da Avantgarde Asset Management.

Saída de investidores

Tudo isso leva ao fato de que, além do investidor estrangeiro, o institucional brasileiro também vem recorrentemente diminuindo sua exposição à B3.

Os juros locais avançam, acompanhando os americanos e também tentando compensar o maior risco no cenário interno, e isso torna a renda fixa brasileira também mais atrativa, enfraquecendo o fluxo para a Bolsa. Fora que os maiores riscos locais também chegam no investidor estrangeiro. 

Os índices de outros emergentes, que contam com menores burburinhos internos, com tudo isso conseguem ir melhor do que o Brasil em 2024.

Nas últimas semanas, um recuo das taxas de juros norte-americanas, após dados mais fracos, chegou a gerar fluxo para esses países. O Brasil, porém, não se beneficiou.

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