Itaú lucra R$ 18,5 bilhões em 2020, mas números não empolgam e ações caem 2%: o que não animou o mercado?

Números não foram exatamente ruins, mas alguns dados abaixo do esperado e projeções conservadoras fazem papéis registrarem queda

Lara Rizério

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SÃO PAULO – A união entre números considerados “mornos” e projeções também pouco inspiradoras fizeram com que o Itaú Unibanco (ITUB4) inaugurasse a temporada de balanços para os grandes bancos com queda das ações (de até 3,7%) – e gerando uma decepção para aqueles que esperavam melhores números para o setor em meio à recuperação econômica no final do ano de 2020.

Vale ressaltar ainda que, além dos números pouco inspiradores, o rumor de que o novo presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), colocaria na pauta de votações um aumento na tributação de bancos, desmentido posteriormente pelo próprio, ajudou a impactar as ações do setor na sessão desta terça-feira durante a tarde. Com os números já pouco animadores divulgados pelo Itaú, o resultado foi um dia de queda para os ativos, com os papéis ITUB4 fechando em queda de 2,13%, a R$ 28,46. O desempenho foi pior do que os seus pares, uma vez que Banco do Brasil (BBAS3, R$ 34,06, -0,67%), Bradesco (BBDC3, R$ 22,04, -0,21%;BBDC4, R$ 25,13, -0,41%) e Santander Brasil (SANB11, R$ 41,00, +0,49%) fecharam perto da estabilidade.

Os números não foram exatamente ruins. O Itaú registrou lucro líquido ajustado de R$ 5,388 bilhões no quarto trimestre do ano passado, queda de 26% na base anual, ficando 1% abaixo do consenso de mercado, mas aumento de 7,1% na base de comparação com o terceiro trimestre de 2020. Portanto, a melhora em relação ao trimestre anterior indica tendência de recuperação, conforme apontam os analistas do Safra, após um primeiro semestre de 2020 com forte provisão de perdas para fazer frente ao impacto econômico com a pandemia.

O Retorno sobre patrimônio médio (ou ROAE, na sigla em inglês) ficou em 16,1% no trimestre, aumento de 50 pontos-base no trimestre, mas queda de 650 pontos-base no comparativo anual. Vale ressaltar que o ROAE foi diluído pelo resultado fraco das operações na América Latina (devido ao maior custo do crédito no Corpbanca), conforme o ROAE da operação brasileira atingiu 17,8%. Para o ano de 2020, o lucro líquido ajustado atingiu R$ 18,5 bilhões (ROAE de 14,5%), queda de 34,6% na base anual.

Conforme destaca a XP Investimentos, no geral, o resultado foi ajudado por uma carteira de crédito maior do que o esperado e margens mais altas (spread cresceu 5 pontos-base no trimestre). No entanto, a deterioração da linha de seguros e os custos acima do esperado impactaram o trimestre.

A carteira de crédito total do Itaú alcançou R$ 869,5 bilhões ao fim de dezembro, alta de 2,7% em relação ao trimestre anterior e de 20,3% em comparação a igual período de 2019. Para pessoa física, foram R$ 255,6 bilhões, aumento de 7,5% em relação aos três meses anteriores e de 6,6% em comparação a igual trimestre de 2019.

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Os números da margem financeira da companhia foram destacados como um ponto positivo, ainda que com cautela. Na avaliação do JPMorgan, a receita líquida de juros (NII) tem apresentado recuperação, mas a pressão permanece. Para os analistas do banco, a alta de 4% da NII no quarto trimestre (na base trimestral) só ocorreu porque o resultado do terceiro trimestre foi “muito fraco”.

De acordo com os analistas do banco americano, a queda de 19% na base anual nas receitas de tarifas da área de gestão de ativos era até esperada pela base de comparação, que era incomumente elevada. Contudo, destacaram, as receitas de tarifas de conta corrente encolheram pela primeira vez na história, em uma baixa de 5% na base anual.

Por sinal, a preocupação com as receitas de tarifas de conta corrente não vem de hoje, ainda mais no contexto de maior competição nesse segmento. Eles veem obstáculos não apenas para o Itaú, mas para o setor bancário como um todo, apontando que esses são os primeiros sinais de que a competição com as fintechs está tendo nas receitas de tarifas.

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Projeções não animaram

Nesse sentido, o guidance a ser apresentado pelo Itaú, trazendo as projeções do banco para 2021, também era bastante esperado pelos analistas de mercado e pelos investidores, além da teleconferência com jornalistas e analistas durante a manhã da terça-feira, detalhando as projeções com o mercado.

As projeções foram divulgadas durante a manhã desta terça, trazendo a previsão que a carteira de crédito do grupo deve crescer entre 5,5% e 9,5%. Já a margem financeira com clientes deve ter expansão de 2,5% a 6,5%. A margem com o mercado deve ficar entre R$ 4,9 bilhões e R$ 6,4 bilhões, enquanto a receita de tarifas deve crescer de 2,5% a 6,5%.

Porém, dois pontos chamaram a atenção dos investidores: as projeções de que o custo do crédito (formado por despesas administrativas, impostos, margem financeira e inadimplência) deva ficar entre R$ 21,3 bilhões e R$ 24,3 bilhões, uma queda de 30% na base anual: em 2020, o custo totalizou R$ 30,2 bilhões. Já as despesas devem ficar entre uma queda de 2% e uma expansão de 2%.

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De acordo com o Bradesco BBI, o guidance tão esperado foi conservador, reduzindo as chances de revisões para cima das projeções. Segundo os analistas do banco, os números estão bem alinhados às estimativas ao levar em consideração o ponto médio do guidance.

“Levando em conta as diferentes projeções de cada uma das principais linhas do balanço do banco, chegamos a um lucro líquido recorrente esperado entre R$ 24,4 bilhões e R$ 24,8 bilhões para 2021. Esses números se comparam às nossas projeções de R$ 25,3 bilhões para o ano, implicando uma leve queda de 2% a 4% [frente às projeções do banco]”, avaliam os analistas.

Para o BBI, as expectativas para a carteira de crédito e NII com clientes são bastante razoáveis ​​e factíveis, sendo que as principais fontes de otimismo podem ser receitas de taxas e resultados de seguros, que devem crescer entre 2,5% e 6,5%. Mas o principal destaque negativo, que deve reduzir as expectativas, é a expectativa para o custo do risco.

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“Embora reconheçamos que o mercado tenda a pagar mais pelo crescimento da receita do que por uma redução do custo do risco, notamos que a projeção atual deixa pouco espaço para o mercado se tornar muito mais construtivo: (i) NII está se recuperando e as expectativas já estão apontando nessa direção; e (ii) as tarifas podem crescer mais rapidamente, mas existem riscos importantes no longo prazo. Assim, consideramos a projeção como razoável e alcançável, mas não como
um catalisador positivo para as ações”, avaliam os analistas do banco.

Marcel Campos, analista da XP Investimentos, aponta que a linha de despesas pode não ter agradado, uma vez que a projeção é de uma alta de até 2% em 2021. A perspectiva, aponta, é ruim na atual conjuntura do sistema bancário, em meio ao cenário ainda incerto para a recuperação econômica e de maior concorrência.

Sobre o tema, durante a teleconferência, Milton Maluhy, novo presidente-executivo, apontou, por sua vez, que uma eventual queda (de até 2%) vêm de um projeto de longo prazo. Contudo, não existe bala de prata e nenhuma agência deve ser fechada este ano. “Continuamos acreditando no canal físico. Nosso público é muito heterogêneo, os clientes valorizam a rede de agências”.

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Ele ainda destacou que a expectativa é de que a taxa de inadimplência de 90 dias deva aumentar em 2021, atingindo o pico nos últimos três meses do ano, mas ainda abaixo de níveis recordes passado; ainda afirmou que o Itaú não deva fechar agência bancárias em 2021.

Maluhy ainda ressaltou que existe uma incerteza muito grande no cenário econômico, em função da pandemia do novo coronavírus, o que também se reflete nas suas projeções. Isso explica por que a faixa na previsão para as receitas foi ampliada de três para quatro pontos porcentuais. “Este ano teremos crescimento de receita de serviços em linha com recuperação da economia”, apontou.

O novo presidente do banco também comentou sobre o Pix, sistema de pagamento instantâneo capitaneado pelo Banco Central, afirmando que ele deve ter um impacto na receita do grupo em 2021, o que já está contemplado no guidance.

Nesse cenário, com maiores incertezas e sem tanto ânimo com os números do banco, a XP Investimentos possui recomendação neutra para os ativos, com preço-alvo de de R$ 29, acreditando que a ação est[a sendo negociada a um preço justo se considerar o setor bancário, que está com menores barreiras de entrada e vários novos competidores.

O Bradesco BBI também possui recomendação neutra para os ativos, que inclusive foi alterada na última semana: anteriormente, a recomendação era de compra. O preço-alvo é de R$ 33.

“Desde o início da pandemia, temos chamando a atenção para os múltiplos com desconto de ambos os bancos de grande capitalização (em mínimas históricas na ocasião) e sua capacidade potencial de se recuperar rapidamente das condições difíceis impostas pela crise. Em primeiro lugar, a expectativa era de um processo de recuperação gradual, mas consistente que poderia permitir aos bancos fornecer resultados pré-pandemia em cerca de dois anos. Mais recentemente, no entanto, ficamos cada vez mais otimistas sobre as tendências de ganhos, esperando que a lucratividade já se recupere em 2021 e não apenas em 2022. Agora isso é exatamente o que o mercado parece esperar, com pouco espaço para ganhos adicionais de
alta revisões, em nossa opinião”, avaliam os analistas, destacando os motivos para a revisão.

Por outro lado, o Credit Suisse segue com recomendação equivalente à compra para os ativos, com preço-alvo de R$ 39, afirmando que um ciclo de vários anos de crescimento nas receitas está próximo do setor e apontando que o valuation segue descontado.

De acordo com compilação feita pela Refinitiv, de 15 casas que cobrem o papel, 9 possuem recomendação equivalente à compra, enquanto 6 possuem recomendação neutra. Já o preço-alvo médio é de R$ 34,72, o que configura um potencial de alta de 19,4% em relação ao último fechamento.

Com uma maior divisão entre os que estão otimistas e os que recomendam cautela com os ativos, os analistas de mercado também aguardam pelos primeiros atos do novo CEO da companhia, que deve focar no processo de transformação digital do Itaú.

“Enquanto outros players, como o Bradesco (BBDC4), tentam criar um banco digital separadamente, o Itaú investe em se tornar mais ágil e operar de maneira mais parecida com as fintechs”, aponta a Levante Ideias de Investimentos. O plano para lidar com a maior competição será acompanhado de perto como um tema de médio prazo, enquanto o cenário de recuperação para a economia será observado de perto como um tema para os próximos meses.

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Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.