IPCA de julho deve ter primeira deflação em 26 meses e maior contração desde o plano Real

Índice deve recuar com queda de preços administrados; efeito promete ser temporário, mas pode impactar dinâmica inflacionária no futuro

Mitchel Diniz

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O Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) referente ao mês de julho vai ser divulgado na manhã desta terça-feira (9) e deve apresentar sua primeira deflação em mais de dois anos. A última vez em que o índice registrou variação mensal negativa foi em maio de 2020, no auge das restrições e regras de distanciamento por conta da pandemia da Covid-19.

As projeções dos agentes do mercado consultados pela Refinitiv variam entre deflação de 0,3% e 0,8%. A média das previsões aponta para IPCA negativo de 0,65% em julho na comparação com maio. Caso se confirme, o índice terá a maior deflação da série histórica iniciada com o plano Real, em 1994.

Uma deflação de 0,65% também implica na desaceleração do IPCA em 12 meses, de 11,89% para 10,10%. “A deflação é importante, mas tem caráter artificial”, lembra Marcela Kawauti, economista-chefe da Prada Assessoria.

O motivo para a retração do IPCA não é mistério para ninguém. A limitação de cobrança do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), via Proposta de Emenda à Constituição (PEC), sancionada no último mês de junho, contribuiu com a queda no preço de itens de peso do índice: combustíveis e energia.

Um levantamento da Ticket Log aponta que o preço médio da gasolina sofreu uma queda de 14,01% no mês passado. O etanol, por sua vez, ficou 8,34% mais barato. Os estados também reduziram o ICMS da energia elétrica, o que se soma à aplicação, pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), da bandeira verde sobre as tarifas.

“Observa-se que esse recuo nos preços tem sido gerado ‘a fórceps’ por meio de decisões do nosso executivo e legislativo, e não de alívio nos preços internacionais, principal fato gerador da nossa atual inflação”, ressalva Simone Pasianotto, economista-chefe da Reag Investimentos. A casa prevê deflação um pouco acima do consenso, de 0,77% em julho, e uma variação negativa também para agosto, de 0,18%.

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“A deflação de julho e agosto é uma excelente bandeira eleitoral, mas não representa que a pressão sobre o nível de preços foi de fato – e na prática – reduzida de forma sustentável”, afirma Simone.

Luis Otavio de Souza Leal, economista-chefe do Banco Alfa, diz que a deflação diminui, no curto prazo, a inércia da inflação. “Em condições normais, todo mundo esperava que a inflação [de 12 meses] viesse abaixo de dois dígitos somente em setembro. Isso deve ser antecipado para agosto”, explica.

Leal admite que a contração do IPCA de julho deve coincidir com a queda dos preços administrados, enquanto os preços livres tendem a continuar subindo, com uma elevação forte em alimentação. Mas diz que a deflação não pode ser subestimada, pois impacta a dinâmica inflacionária no futuro. “As negociações salariais que ocorrerem a partir de agora vão ter uma base menor”, diz o economista.

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De olha na inflação dos serviços

Para Marcela Kawauti, um dos pontos de atenção do IPCA é o segmento de serviços, que vem avançando desde o último mês de março e acumulava alta de 8,73% em 12 meses até junho. É um segmento em que os preços demoram mais para subir, porém também levam mais tempo para recuar.

“Você tem um choque de oferta que gera inflação em um grupo específico e que começa a se espalhar pela economia. Mesmo que aquele grupo volte a cair de preço, a inflação está mais resistente onde se espalhou”, explica Marcela.

Como a queda do preço da gasolina não é recorrente, espera-se que o efeito da desoneração sobre combustíveis dure só até o IPCA de agosto. No relatório Focus desta segunda-feira (8), os economistas consultados pelo Banco Central preveem uma deflação residual de 0,15% para o índice em agosto. Em setembro, o mercado prevê o IPCA novamente positivo, avançando 0,5%.

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“Você tem vetores em direções opostas se compensando e, no líquido, fica negativo. Mas quando você tira o efeito da gasolina, permanece aquela inflação que não se dissipou. Por isso, devemos voltar a ver dado positivo de inflação em setembro”, diz a economista-chefe da Prada. “A não ser que o preço internacional do petróleo caia muito ou o governo tire algum outro imposto. Mas esses são efeitos que não conseguimos antecipar”.

Deflação vai segurar juros?

“O BC certamente usará a deflação artificialmente gerada para ponderar sua matriz de riscos, mas isso não lhe permite ainda afrouxar o ciclo de aperto monetário”, explica a economista-chefe da Reag.

Para Luis Otávio Souza Leal, mais importante que a deflação são os núcleos do IPCA e os preços industriais. “É isso o que o Banco Central vai estar olhando”, diz o economista. O Banco Alfa prevê uma retração na média dos núcleos do IPCA, de 0,89% para 0,6%, menor nível em um ano. Para os preços industriais, a expectativa é de desaceleração, de 0,58% para 0,15%.

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Felipe Simões, economista e diretor da WIT Asset, acredita que a deflação é pontual e não afeta a atuação do Banco Central. “O BC vai olhar muito mais o que acontecer no pós-eleições e os acontecimentos no mundo”, afirma.

Marcela Kawauti, por sua vez, diz que o BC olha 12 meses a frente e sabe que a deflação de julho tem efeitos não recorrentes. “Tem inflação menor este ano, mas não muda no longo prazo”, afirma. A economista lembra que a política fiscal está caminhando no sentido oposto da política monetária, que sobe juros para tentar controlar a demanda. “A política fiscal, de auxílios joga contra essa lógica”, conclui.

Errata: Ao contrário do que dizia o título da matéria anteriormente, a deflação de julho será a primeira em 26 meses, e não em 24 meses. O texto já foi corrigido. 

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Mitchel Diniz

Repórter de Mercados