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2024 foi marcado pela valorização recorde do dólar ante o real. A moeda americana chegou a seu maior valor nominal da história por diversas vezes em dezembro e no fechamento do ano valorizou 27% perante a moeda nacional, fazendo com a que divisa doméstica encerrasse 2024 como a pior moeda do ano entre as 20 principais divisas do mundo (veja quadro abaixo).
Além disso, foi maior aumento da divisa desde 2020, quando houve o choque da pandemia de covid-19. Em 1º de janeiro, o dólar valia R$ 4,917 e, no apagar das luzes de 2024, fechou a R$ 6,179.
Ao longo do ano, inúmeros momentos e fatores motivaram o avanço da divisa. Se lá fora a trajetória de juros preocupou pela desaceleração nos cortes, por aqui, a espera pelo pacote fiscal mexeu com a divisa em diversas sessões.
Tensões geopolíticas também contribuíram para os fortes ganhos do dólar, com notícias vindas da guerra na Ucrânia e dos conflitos entre Israel e os grupos militantes Hamas e Hezbollah no Oriente Médio gerando temores de confrontos militares mais amplos.
Veja o desempenho das principais moedas do mundo no ano (fonte Austin Ratings):
Confira os principais pontos que impactaram a moeda em 2024:
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1- Eleição de Trump
A vitória de Donald Trump na presidência dos EUA já influenciava a moeda antes mesmo de se concretizar. Ainda em outubro, quando apostas sobre um novo termo republicano aumentavam, o dólar já reagia ao que se chamava “Trump trade”. Investidores precificavam a implementação de medidas consideradas inflacionárias por parte de analistas.
“O cenário externo teve sua grande participação pela desvalorização do real, a começar com o fortalecimento global do mercado do dólar, diante da eleição do presidente Donald Trump e sua estratégia de tarifar países cujo há relacionamento comercial com os Estados Unidos”, comenta Marcio Riauba, head da Mesa de Operações da StoneX Banco de Câmbio.
Relembre:
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As promessas do republicano tanto impactaram o mercado local, que seguia forte e já vinha resistindo às medidas de contenção do Federal Reserve, quanto a própria política monetária do Fed. O combate à inflação voltou a ser foco do banco e a trajetória de juros no país segue incerta, com menos cortes à vista.
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2- Sinais de juros do Federal Reserve
O dólar passou de R$ 5,00 ainda em fevereiro, quando houve a redução de chances de cortes nos juros em março. De lá para cá, ainda que o Fed tenha realizado três cortes consecutivos, a sinalização de manutenção da taxa no patamar atual já influencia as apostas.
De acordo com a ferramenta FedWatch, do CME Group, há 88,8% de chances de que nenhum corte seja realizado na próxima reunião, em 29 de janeiro. A expectativa é de que haja um corte de 25 pontos base na segunda reunião do ano, apenas em 19 de março. Ainda assim, não há muita convicção, com 48,4% de probabilidade, ante 46,2% de chances de manutenção.
Com a permanência de juros em patamar mais elevado por lá, a expectativa é que o câmbio siga impactado.
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3- Medidas fiscais no Brasil
Nos últimos meses, investidores têm se mostrado cada vez mais receosos com o compromisso do governo em equilibrar as contas públicas, particularmente depois do anúncio duplo pelo Executivo no fim de novembro de um pacote de contenção de gastos e de um projeto de reforma do Imposto de Renda.
Apesar de os três projetos que compõem o pacote terem sido aprovados pelo Congresso neste mês e de o debate sobre mudanças no IR ter sido adiado para 2025, agentes financeiros ainda questionam a efetividade das medidas na contenção das despesas e duvidam da determinação do governo em reduzir a dívida pública.
“A moeda brasileira vem se desvalorizando até o presente momento e grande parte é oriundo da volatilidade vista no segundo semestre do ano, causada pela grande incerteza fiscal e política que o Brasil vem atravessando, além da ampliação das expectativas inflacionárias”, disse Marcio Riauba, head da Mesa de Operações da StoneX Banco de Câmbio.
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Na esteira do pessimismo do mercado, o dólar ultrapassou o valor nominal de R$ 6,00 pela primeira vez na história em novembro e atingiu a cotação máxima histórica de R$ 6,2679 neste mês.
O Banco Central realizou uma série de intervenções no câmbio nas últimas semanas a fim de reduzir a deterioração do real, vendendo mais de US$ 30 bilhões em reservas, mas as operações tiveram apenas efeitos pontuais nas cotações.
4- Movimentos especulativos?
Outro tema que povoou as discussões sobre o câmbio no Brasil foram os chamados, pelo Ministro Fernando Haddad, “movimentos mais especulativos” .O ministro afirmou, em entrevista realizada em dezembro, que a flutuação do câmbio levava à atuação do Banco Central e que o ministério seguiria “acompanhando até estabilizar”.
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Ainda de acordo com o chefe da equipe econômica, “a Fazenda trabalha com fundamentos” e “esses movimentos mais especulativos são coibidos com intervenção do Tesouro e do BC”.
Outras vozes do governo falaram em ataques especulativos, como o Ministro das Comunicações, Paulo Pimenta. Segundo ele, o capital especulativo “sempre aposta no caos e contra o governo”. Pimenta reforçou que os grandes números da economia estão excelentes e elogiou o trabalho do ministro da Fazenda, Fernando Haddad. O próprio presidente Lula chegou a fazer menção à existência atual de especulação de derivativos e pediu que houvesse investigação do BC, no fim de junho.
Para Gabriel Galípolo, novo mandatário do BC em fala recente juntamente a seu antecessor, Roberto Campos Neto, a ideia de “ataque especulativo”, como algo coordenado, não representaria bem a situação atual.
E o que esperar para 2025?
A expectativa é de seguida pressão no câmbio para 2025, conforme aponta o último relatório Focus do ano, com previsões dos economistas para os principais indicadores da economia. A divisa americana, antes prevista na casa dos R$ 5,90, agora é estimada em R$ 5,96 no fim de 2025.
Os efeitos da depreciação do real, no entanto, ainda devem se manter no curto prazo e os prêmios de risco seguirão elevados, segundo Rodolfo Margato, economista da XP. Em sua visão, há possibilidade de estabilização nominal no próximo ano e em 2026, ainda que haja ampliação de riscos. “Continuamos a ver espaço para alguma apreciação do real no ano que vem, como reflexo, principalmente, da reação mais tempestiva do Banco Central”, considera.
A casa projeta a taxa de câmbio com dólar a R$ 5,85 no fim de 2025. Ainda assim, a equipe econômica da XP faz ressalvas sobre a possibilidade de ambiente macroeconômico doméstico ainda trazer alta volatilidade à taxa de câmbio.
O Itaú considera possível que a taxa de câmbio recue para R$ 5,70 por dólar em 2025 e 2026.
“A apreciação da moeda é limitada por um dólar forte globalmente; um prêmio de risco doméstico mais alto que reflete incertezas fiscais e a deterioração das contas externas –déficit em conta corrente de -3,3% do PIB. na margem”, considera o banco.
Para Roberto Padovani, do Banco BV, o câmbio se apresenta inserido num contexto mais amplo de perda de referências. Para a instituição, a trajetória do câmbio ainda é para cima e a projeção é de R$ 6,30 para estre ano e R$ 6,50 para 2026. Parte do motivo
“No entanto, acreditamos que essas influências favoráveis à moeda brasileira sejam apenas temporárias. Embora os fatores internos tenham dominado a dinâmica cambial nos últimos meses, os desdobramentos no cenário externo também devem desempenhar um papel crucial ao longo de 2025”, afirma o economista.
Ainda assim, grande parte do mercado já considera que a moeda ficará em R$ 6,25 em 2025. De acordo com Luiz Felipe Bazzo, a visão reflete crescentes preocupações com a sustentabilidade da dívida pública e a condução da política econômica brasileira nos próximos trimestres Ele argumenta que, embora o fortalecimento global do dólar tenha influenciado a alta recente, fatores internos são os principais responsáveis pela desvalorização do real.
A desvalorização do real pode ser acelerada, ainda, por medidas que prejudiquem a credibilidade fiscal, aumentem gastos parafiscais ou envolvam intervenções no mercado cambial. Nessas hipóteses, o dólar pode ultrapassar os R$ 7.
“O ano que vem será decisivo para alinhar as expectativas do mercado e evitar que a crise cambial se agrave”, argumenta.