Dólar, juro e ações: analistas recalibram estratégia para Brasil pós eleição de Trump

Com a vitória do republicano, real se desvaloriza, mercado prevê inflação elevada, e Ibovespa (IBOV) encontra resistência. Setores como varejo e construção civil enfrentam desafios

Murilo Melo

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A vitória de Donald Trump na eleição presidencial dos Estados Unidos, na última terça-feira (5), deve trazer mudanças para as economias emergentes, incluindo o Brasil. Segundo relatório do JPMorgan e da Ágora Investimentos, o Brasil enfrenta agora um cenário de inflação pressionada, um dólar mais forte e um ambiente de incerteza global, o que exige uma resposta cuidadosa do Banco Central do Brasil (BC) e o mercado financeiro nacional.

Ambos os relatórios apontam que as políticas do novo governo dos EUA indicam mudanças em áreas de maior demanda como comércio, imigração e regulamentação, que devem influenciar o Brasil tanto no câmbio quanto no mercado de ações. O fortalecimento do dólar em relação ao real é uma das maiores preocupações para o Brasil nesse novo contexto.

A Ágora acredita que os investidores podem buscar refúgio em ativos mais seguros e em dólares, no conhecido “fly to quality”, movimento de investidores em direção a ativos considerados mais seguros em períodos de alta incerteza. A força do dólar, diz a corretora, tende a pressionar outras moedas, incluindo o real, o que encarece importações e amplia custos para empresas brasileiras endividadas em moeda estrangeira.

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Por outro lado, o JPMorgan sugere que o fortalecimento da moeda americana deve continuar a pressionar os preços devido ao encarecimento de insumos importados e aumento dos custos para empresas com dívidas em dólar. Setores como o de construção civil e o varejo, que dependem de insumos e produtos dolarizados, podem ser particularmente afetados.

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No caso das empresas de construção como Cyrela (CYRE3), MRV (MRVE3) e Eztec (EZTC3), dizem os analistas, espera-se uma alta nos custos de materiais importados, enquanto varejistas como Lojas Renner (LREN3) e Magazine Luiza (MGLU3) já veem uma redução na demanda interna com a perda de poder de compra dos consumidores.

Os estrategistas do JPMorgan pontuam que a expectativa é de que o real continue pressionado no curto prazo, com pouca possibilidade de valorização, especialmente considerando as incertezas sobre políticas fiscais brasileiras. No entanto, um possível ajuste fiscal — caso seja implementado — pode aliviar um pouco essa pressão cambial. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, propôs medidas para controlar os gastos públicos, mas, de acordo com os analistas, a efetividade dessas políticas ainda é incerta.

E é justamente por causa dessa incerteza que os analistas da Ágora afirmam que, sem o pacote, qualquer avanço na bolsa pode ser contido, dependendo apenas de um eventual rally técnico de fim de ano, que, tradicionalmente, impulsiona o Ibovespa.

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Os analistas da Ágora, por sua vez, recomendam cautela quanto ao uso do câmbio como alocação especulativa. A corretora sugere o dólar como uma ferramenta de proteção no portfólio, graças à sua correlação negativa com a bolsa brasileira e sua função defensiva, em especial num cenário de volatilidade global e incertezas locais.

Inflação e taxa de juros

Outro ponto que deve estar no radar são as projeções de inflação para o Brasil, que foram revisadas para cima devido ao câmbio desfavorável e aos preços pressionados de alimentos e serviços. O JP Morgan agora projeta uma inflação de 4,2% para 2025, acima da meta de 3% do BC. Isso indica que a autoridade monetária deve manter a política monetária restritiva por mais tempo, com aumentos de juros previstos até março e encerramento do ciclo com uma taxa de 13% em maio.

Essa alta na Selic tem como objetivo principal conter a inflação, mas também representa um entrave ao crescimento econômico, explicam os analistas do banco. Embora as previsões de crescimento para 2025 tenham sido revisadas para baixo, o JP Morgan destaca que a economia brasileira tem mostrado resiliência e, por ora, espera-se um crescimento de 1,9% no ano, impulsionado pelo bom desempenho no final de 2024.

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Por outro lado, a Ágora diz que é provável que o ciclo de aumento de juros se prolongue, e a possibilidade de afrouxamento monetário em 2025 se torne cada vez mais incerta, sobretudo se a pressão inflacionária não for controlada.

Perspectiva para ações e investidores

Para investidores, a recomendação do banco é priorizar ações de empresas de maior qualidade e resiliência, que têm maior capacidade de absorver os impactos das incertezas cambiais e do aumento das taxas de juros. Empresas exportadoras e aquelas com baixa dependência de crédito podem ser escolhas mais seguras, enquanto setores como o varejo e construção civil exigem cautela devido à vulnerabilidade a variações cambiais e aumentos nos custos de financiamento.

Para investidores em ações, o relatório da Ágora Investimentos sugere foco em empresas brasileiras de qualidade, com boa saúde operacional e baixo nível de endividamento. A Ágora aponta que o Ibovespa está negociando entre 7 e 8 vezes o múltiplo de preço/lucro (P/L) projetado, abaixo de sua média histórica de 11 a 12 vezes. Empresas com bons dividendos e em níveis de preço atrativos representam, assim, boas oportunidades de investimento.

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Fundos Imobiliários (FIIs) também são uma alternativa de diversificação, segundo a corretora. Atualmente, os FIIs negociam entre 0,7 e 0,8 vezes o valor patrimonial (P/VPA), e oferecem um prêmio de 4 a 5 pontos percentuais acima do título do Tesouro com vencimento em 2035 (NTN-B), que proporciona Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) + 7%.

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